Três CDs: Capital Inicial, Kiko Zambianchi e Nei Lisboa

por Marcelo Costa

“Rosas e Vinho Tinto”, Capital Inicial (Abril)
“220 volts” abre o disco com guitarras chupadas de “O Eleito”, música de Lobão. Na sequência, “A Sua Maneira” é uma versão de uma versão de uma música que os Paralamas do Sucesso haviam gravado no excelente “Nove Luas” (1996), original da banda argentina Soda Stereo. A suavização da canção não honra nem Paralamas nem Soda Stereo. Passado o desconforto inicial causado por estas duas canções, o Capital Inicial preenche o resto do álbum com aquilo que sabe fazer melhor: baladas rock. Apesar da introdução com guitarra distorcida, a levada de “Como Devia Estar” é leve, como praticamente todo o resto do álbum, exceções de “Quatro Vezes Você”, tentativa pueril de retratar o cotidiano classe média alta, e a bacana faixa título em levada punk rock inspirada. Pinta como um acústico volume 2 e não há problema nenhum nisso. Alvin L (o melhor letrista do rock brasileiro anos 90) assina onze canções, o que eleva a qualidade do álbum. Como um todo, “Rosas e Vinho Tinto” é um álbum nota 7 e está um passo a frente do álbum anterior de estúdio, o ótimo “Atrás dos Olhos”, e surge como um dos melhores álbuns da banda, mas ainda é inferior ao pior trabalho da Legião Urbana (pra ficar numa comparação brasiliense) e não fica entre os cinco melhores do Ira! (em comparação nacional). É mais um disco que exemplifica o capitulo “bandas medianas lançam discos medianos”. Se continuar melhorando disco a disco, daqui há uns quatro ou cinco discos eles alcançam a perfeição pop. Por hora é ok, enquanto Pato Fu, Paralamas, Mundo Livre, Ira! e Los Hermanos (pra ficar só em cinco bandas melhores) não lançam nada novo.

Nota: 7

“Disco Novo”, Kiko Zambianchi (Abril Music)
Já no titulo do álbum, Kiko Zambianchi parece deixar a mostra a veia de seu mais novo trabalho: mais do mesmo. A própria capa, com aceno de ter sido feita as pressas, indica isso. Muitos dos jornalistas apegados a releases compraram a ideia e esqueceram/preferiram nem ouvir o álbum. No entanto, “Disco Novo” surge como um dos trabalhos mais inspirados da carreira do músico. Kiko deixou de lado sua fixação por funks, que datou/descaracterizou seus primeiros trabalhos, e centrou força em canções de apelo folk, ótimas para serem tocadas ao violão ou com guitarras sem distorção. Um clima jovem guarda paira sobre o álbum. A abertura com “Tudo é Possível”, a levada alegre de “Norte e Sul”, o resgate de Arnaldo Baptista em “Desculpe” (do clássico dos amores perdidos, “Loki”, de 1972) e o belo arranjo de “Logo de Cara” (uma das duas parcerias de Kiko com o escritor Marcelo Rubens Paiva presentes no álbum, está já gravada pelo Ira!) destacam-se em um disco cheio de canções leves para se tocar no rádio e em fins de tarde ensolarados.

Nota: 7,5

“Cena Beatnik”, Nei Lisboa (Antidoto)
Nei Lisboa é idolatrado no sul do país. Lá seus álbuns vendem bem e a pirataria que copiava em CDR os dois álbuns de Nei lançados em vinil pela EMI nos anos 80 (“Carecas da Jamaica” e “Hein?”) obrigou a major a fazer uma edição em CD dos discos. “Cena Beatnik” é o sétimo álbum da carreira do bardo e quebra um silêncio de nove anos sem material original, já que o último álbum, “Hi Fi”, buscava inspiração em 14 covers que iam de Rolling Stones (“Ruby Tuesday”) e Beatles (“Norwegian Wood”) até Elton John (“Bennie & The Jets”) e Paul Simon (“Fifty Ways To Leave Your Lover”). Na canção que abre “Cena Beatnik” e dá título ao trabalho, Nei tenta justificar sua música cantando: “Já no ‘passa nada’ / já nem peço por favor / eu tô abrindo a estrada / que chega aonde eu for / eu tô na madrugada / tô na chuva pelo calor / eu tô na luta armada / disfarçado de cantor”. As letras continuam sendo o diferencial carregando nas aliterações que Humberto Gessinger emprestou dele e não devolveu mais (assim como o guitarrista Augusto Licks, que era da banda de Nei nos primeiros álbuns do bardo e saiu para ser um Engenheiro a partir de “A Revolta dos Dandis”). Dessa forma, ainda em “Cena Beatnik”, a música, Nei canta: “E o acaso me deixou na porta da tua casa / faz silêncio e faz de conta que já me esperava” ou “O mundo é do vivos / o mundo é dos bancos / e os bancos dos mendigos”, da ótima “Produção Urgente”. As melodias alternam rocks suaves com baladas sutis. O repertório não chega a tocar o brilho de “Carecas da Jamaica” nem a força trágica de “Hein?”, mas une canções que são um belo atestado de sobrevivência / independência de um artista que – com vinte anos de carreira nas costas, mesmo longe demais das capitais – ainda usa seu inspirado cinismo poético para escrever mais um – belo – capítulo da música popular brasileira.

Nota: 7

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