Everything in its right place
O álbum começa da forma
mais estranha possível. Um sampler de voz sobre base de piano repetida
ao infinito - everythiiiiing. Climas sobrepostos, vocais repetidos
aliados à guitarras distorcidas cheias de efeitos de computador.
Sons indo e vindo confundem a mente
do ouvinte, num efeito similar à um contato com extraterrestres.
No meio disso tudo, Thom Yorke canta:
Yesterday I woke up sucking a lemon.
Quem já viu alguma foto dele
sabe que isso deve ser prática diária. Viagem total. Tão
linda quanto difícil.
Kid A
A faixa título é outra
viagem. A esquisitice se intensifica. Começa com um piano que remete
a sons infantis.
É lenta, eletrônica.
Efeitos na voz a deixam meio enjoadinha. Batidas sufocantes acompanham
um Thom Yorke robotizado. Dificílima, mas melhora do meio para o
final. Thom fez as bases em computador e o resto da banda trabalhou em
estúdio com teclados e efeitos. Talvez a faixa mais estranha do
disco.
The National Anthen
A primeira a parecer música
música mesmo e uma das melhores do disco. Voz com efeitos, baixo
a frente, introdução longa. Viagem em clima rock com uma
letra que gira em torno de si mesma perguntando What's going on?.
Nessa música o Radiohead conseguiu juntar o groove do jazz ao usual
rock potente e melancólico da banda. Um pedal fuzz transforma o
som do baixo, contrastando com a delicadeza do theremin. Foi gravada logo
depois do fim da tour de Ok Computer e, a princípio, era
para ser um b-side, mas a banda gostou tanto do resultado que ela acabou
ficando para Kid A. Não a toa lembra bastante o último
disco.
How To Disappear Completely
A primeira com violão. Balada
com crescendo matador. Thom Yorke consegue com perfeição
- mais uma vez - destilar toda a melancolia do mundo nas seis cordas. No
meio um teclado lindo. Poderosa, para entrar no rol das melhores baladas
da banda. Yorke canta de maneira transcendental. Começou a ser escrita
em Toronto, junho de 97. Balada viajante de letra triste que diz The
moment's already passed/Yeah, it's gone. Explorando o falsete - sua
marca registrada - Yorke afunda-se: I float down the Liffey/ I’m not
here/ This isn’t happening.
Treefingers
Instrumental lento, viajante, ambient,
praticamente conduzido apenas por teclados. Lembra David Bowie na fase
Lows. Caberia perfeitamente como b-side de algum single.
Optimistic
Cadenciada, lembra a faixa Kid
A, mas sem a voz enjoadinha. Guitarra envenenada dá o tom da
canção. O primeiro rock‘n‘roll de verdade do disco. Chega
arrombando como um Tiranossauro. Guitarra no talo e cozinha potente acompanham
Yorke declamando sobre o fim do mundo, sobre peixes maiores comendo os
menores. Parece com o R.E.M da fase “Monster”. Ed O’Brein disse que a letra
lembra PJ Harvey: Amo essa letra, principalmente o trecho "this one
just crawled out the swamp".
In Limbo
Outro ponto alto do disco. Cadenciada,
mas melódica/melancólica. Parece como alguma canção
do The Bends versão Ok Computer. A banda trabalhou
muito nessa e só nove meses depois que conseguiram chegar a um resultado
satisfatório. Yorke chora sobre arpejos límpidos de cordas:
I’m Lost at sea. Destaque para o final crescente.
Idioteque
Esta música é o exemplo
perfeito de como será o rock no ano 2000. Programação
eletrônica à frente à la Aphex Twin, são sobrepostas
pelo vocal potente de Thom Yorke. Ambígua, a melodia tradicional
confronta-se com o emaranhado de ruídos e efeitos. Thom Yorke canta
muito e deixa a guitarra em segundo plano. A letra pega pesado:
Let me tell you that you're the
first - I'll laugh till my head comes off - I'll swallow till I burst.
Morning Bell
Eletrônica à frente novamente,
mas dessa vez com levada lenta e baterias eletrônicas conduzidas
por Thom e pelo produtor Nigel Godrich. A respiração de Thom
Yorke pode ser ouvida sob a chuva, num dia cinzento. O vocal sai soluçado.
Uma guitarra nervosa entra no meio da música e aumenta a tempestade.
Mesmo assim soa meio chatinha até o meio quando entra uma guitarra
nervosa. A letra é um tormento.
Motion Picture Soundtrack
A favorita de Thom Yorke. Bela. Alias,
a mais bela. Teclado triste que faz a canção acabar como
uma coda. A letra - talvez a mais direta que Thom Yorke já escreveu
- e os efeitos de teclado no meio remetem diretamente a Atmosphere
do Joy Division. Um piano eletrônico mistura-se com uma harpa alucinada.
Yorke berra: I think you‘re crazy. Deveria ter entrado em Ok
Computer, mas acabou saindo na última hora. Um verdadeiro gran
finalle, como um grande disco merece. Na última estrofe, o vocalista
afirma o tom dramático do álbum:
I will see you in the next life.
Depois de ouvir Kid A é difícil
não ir com ele.