"Brincando de Seduzir"
por
Marcelo Costa
maccosta@hotmail.com
Para
mim, o cinema é um espelho.
Muitas vezes me enxergo em um filme, como enxergo o mundo, ou como deveria
ser, ou como será. É uma relação cúmplice
que me faz emocionar e apaixonar. E que me faz meio tolo, mas esse é
um outro lado da moeda que, sabemos, tem duas faces.
Cada pessoa tem seus filmes preferidos
e Brincando de Seduzir (Beautiful Girls) é um dos meus,
em posição de destaque na minha estante. Sim, eu tenho a
fita e você terá que ir a uma boa locadora para encontrar
essa comediazinha romântica dramática lançada em 1996.
Vá, por que vale a pena.
Brincando de Seduzir tem
um roteiro ultra-simples e batido. Conta a história de alguns amigos
que se encontram no aniversário de formatura da turma, coisa típica
de americano. A grande sacada é que o filme não trata da
festa e sim dos losers em que se tornaram esses personagens.
O inicio é de uma poesia cortante.
Willie, o personagem principal interpretado magistralmente por Timothy
Hutton, junta as gorjetas de sua noite como pianista. Despede-se do dono
do bar e caminha entre o gelo e a neve do inverno americano em direção
a rodoviária, em direção a sua casa e ao seu passado.
Ele está em dúvida,
repensando os passos, sua história. Apostou seus sonhos em algo
que não conseguiu realizar. A volta para casa é, também,
uma volta ao inicio de sua trajetória, uma analise de "onde eu errei?"
e "o que faço agora?".
Esse retorno a cidade tem um q de
traumático, afinal, só quem viveu numa cidade pequena sabe:
nada muda. Seus amigos, tão losers quanto ele, continuam os mesmos,
para o bem e para o mal. Tommy, o básico Matt Dillon, é um
limpador de gelo e continua dividido entre duas garotas (Sharon e Daryan
– respectivamente Mira Sorvino e Darian Smalls). Paul, numa excelente interpretação
de Michael Rapaport, continua um moleque com zilhões de pôsteres
de mulheres nuas nas paredes do quarto. E Mo, o ótimo Noah Emmerich,
está casado. Todos eles beirando os 30 anos. Todos eles losers de
carteirinha.
Mas o filme não é sobre
homens. É sobre garotas, belas garotas. E que belas garotas. E como
estas belas garotas influenciam a vida dos nossos pobres amigos losers.
Willie volta para casa com uma dúvida
cruel: casar ou não casar? Seis meses de namoro com uma advogada
e lá está ele, na encruzilhada, sem nem saber sobre si mesmo.
Tracey, Annabeth Gish, é uma bela garota.
Assim como Marty – Natalie Portman
perfeita perfeita como uma Lolita de Nabukov, ou uma Joey de Kevin Willianson,
sempre com a palavra certa na hora certa – é uma bela garota. Uma
bela garota de... 13 anos. Só os diálogos de Willie e Marty
já valem o filme. Gina, a genial Rosie O'Donnell, é outra
bela garota. Seu "solo" no supermercado explicando que homens sonham com
modelos (irreais), mas casam com as normais (reais), é outro grande
momento.
E Andera, Uma Thurmam indispensável,
bem, é publicitária e renova a improvável equação
"garota bonita e inteligente". Frases como "tudo que eu preciso é
de um cara que me chame de docinho na hora de dormir" ou "tudo que eu preciso
à noite é de um dry martini e Van Morrison" ficam ressoando
na cabeça durante dias, dias e dias.
A trilha sonora é excelente
e centrada basicamente em standars americanos. Coisas que a mãe
da gente lembra como Me and Mrs. Jones de Billy Paul, ou Sweet Carolinede Neil Diamond, que rende outro dos grandes momentos do filme.
Traz também belas canções
perdidas no tempo como Graduation Day do cavaleiro solitário Chris
Isaak, "I'll Miss You" do Ween e uma dobradinha sensacional dos americanos
dos Afghan Whigs (uma das bandas prediletas deste que vos escreve),
fazendo covers de duas canções (uma delas de Barry White),
com direito a ponta em um pub tocando a maravilhosa Be For Real, para
embalar a dança de Andera e Paul.
No geral, Brincando de Seduzir é
cinema sem pretensão, com o intuito único de mostrar as dificuldades
da passagem tardia para a vida adulta. Consegue bem isso. Consegue divertir
e fazer pensar.
Afinal, onde eu errei? O que faço
agora? Sedução é brincadeira? O que é real?
O que você imagina ou imaginava estar fazendo aos 30 anos? Isto é cinema. Seja bem-vindo.
Texto escrito originalmente para o site Vies
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