Finda 
de Marcelo Silva Costa 
 
Esqueci completamente o teu rosto. 
É estranho. 
O gosto do teu beijo ainda. 
Finda mais uma história. 
Nas luzes da minha razão não existem horas. 
Eu sei porque você chora. 
Esqueci completamente o amor.
O que ? 
Nada restou. 
Viremos a página. 
Façamos como Jonathan Danashue: do deserto para a disneylândia. 
Tudo é sonho, caro poeta. 
Os bêbados valsam na rua deserta. 
Foi-se a infância sem ao menos deixar a adolescência. 
Voou pela janela do sétimo andar, 
pousou na calçada de uma rua qualquer 
para ser atropelada pelo cinismo 
que bradava "love is beautiful" enquanto cuspia corações partidos. 
Eu vi tudo e foi divertido. 
Me imagine sorrindo.
Você lembra do meu sorriso ? 
O que você fez com seu cabelo ? 
O que aconteceu com nossos filhos ? 
Nem nasceram. 
Esqueci completamente o cheiro do incenso, 
como termina "O conto de inverno" 
e como se começa um amor perfeito. 
Há venenos, Shakespeare ? 
Há desejo, Rimbaud ? 
A dor que cavalgava meu peito se foi deixando coisas que não sei decifrar. 
Fotos parisienses. 
Amanhecer na lagoa. 
John Coltrane. 
Miles Davis. 
A sorte dizendo aloha. 
Cartas de tarot. 
Win Wenders. 
Eu sei que você não entende. 
Você lembra dos meus olhos verdes ?
Eu me lembro de você dormindo.
Me lembro de estrelas caindo. 
Havia estrelas no céu naquele tempo.
O gosto do teu beijo finda. 
Ainda mais uma história. 
Tento disfarçar ouvindo a chuva.
Alguém no quarto ao lado ouve Nirvana.
É a mesma coisa.
Acaba sempre da mesma forma. 
Ambos molhados. 
Retorna. 
Meu coração já decorou o caminho. 
Aprender a sangrar sorrindo sem manchar as manchas de vinho. 
Do que eu estava falando mesmo ?
Um corte no peito me fez esquecer você. 
Respiro fundo. 
Doí tudo. 
Tento rabiscar o teu nome. 
Desaprendo o meu. 
Descanso meus pulsos. 
É tudo tudo. 
O tempo passa sem me levar. 
É estranho. 
O gosto do teu beijo é o gosto da nossa história. 
Finda. 
Ainda? 
 
21.09.01
São Paulo

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