2001 foi o ano hype.
Não acredite.
Por Alexandre Petillo

Uma das maiores premissas em ser independente, creio eu, é sempre desenvolver opiniões autônomas. Em 2001 o mundo pop foi um verdadeiro cordeirinho, engolindo tudo que lhe foi empurrado pela mídia. No Brasil, enquanto os bem-aventurados que possuem acesso a uma cultura mais elevada, desprezam o produto nacional, posam de rebeldes, e compram com orgulho tudo aquilo que prega o New Musical Express. Questão de geografia.

O exemplo óbvio é o Strokes, grande papa-tudo do "Top Seven S&Y 2001". A banda é bacana, tudo bem, eles fazem umas musiquinhas pop de fácil digestão, como, por exemplo, o Kid Abelha no começo. Mas daí a chamá-los de salvação de alguma coisa é ultrapassar em muito a linha do exagero. Quem acha o primeiro disco deles a bolachinha mais saborosa do pacote, definitivamente não ouviu o primeiro dos Rolling Stones, ou algum do Stooges. O primeiro do Clash, então, nem pensar. Longe vão os tempos do "Nevermind".

Rock’n’Roll não pode ser apresentado como bula de remédio, com prescrição médica. E não é um mero pool de "sabedores" da cultura pop que fazem com que um disco seja histórico. Você sente o Rock. Você sente um frio na barriga quando ouve o já citado "Nevermind". Sente um frio na barriga com os primeiros discos do Elvis. Agora, com o Strokes, você ouve como se estivesse cumprindo um dever intelectual, porque "quem não está ouvindo é mané ou está por fora".

O público comprador de discos acreditou no que disseram, e correram as lojas. O mais engraçado foi alguns críticos, que, por exemplo, odeiam Ramones e todo o punk 77 ("porque é muito simples, pobre musicalmente") e amam Strokes (esse sim é rico musicalmente). Atitude como essa, ao meu ver, é o mesmo que odiar Hitler e ser líder de uma banda neonazista. 

Bem, o Strokes deveria agradar muito mais as revistas de moda do que as de música. Outra coisa: há algo de muito errado no mundo quando uma banda "rock", independente, aparece logo de cara nas páginas da "Face". Pior ainda é que tem gente que acha isso bonito. Eu prefiro os Rutles, que eram reconhecidamente uma armação e também usavam gravatinhas.

Francamente, existem muitas bandas aqui ao meu alcance que fazem muito mais barulho e músicas bem melhores. O Walverdes é um desses, gosto muito mais. Tem aí o Thee Butchers Orchestra que faz muito mais barulho com três caras do que o Strokes com cinco. Questão de geografia.

Dessas bandas "salvação do mundo", só o White Stripes diz a que veio. Com um pé no blues, no folk e em coisas porcas como os Kinks, que é sensacional. E o mais legal disso tudo, é que, já que é a dica do NME, todo mundo amou. E amou uma coisa que é puro Jimi Hendrix e Led Zeppelin. O vocalista até canta como o Robert Plant no começo. E Lez Zeppelin e Hendrix são coisas que os indies e jornalistas indies costumam odiar. Esquisito. 

Por falar em jornalismo, com o fim da Bizz, definitivamente não sobrou muitos lugares decentes para ler sobre cultura pop. Foi vergonhoso, por exemplo, a cobertura da morte de George Harrison. Todo mundo só falou que ele era o beatle quieto, espiritualizado... E, pelo que pareceu, ele só compôs "Something". Parece que será difícil para eles escrever alguma coisa quando o Ringo morrer.

Quase todo mundo se pautou pelo NME (teve até quem copiasse o formato da retrospectiva do ano do tablóide). Todos os discos comentados nos veículos especializados, coincidentemente foram os mesmos que o tablóide destacou. Não tiveram tempo para ouvir discos bons, que realmente mereceram a atenção em 2001, como o "Gold", do Ryan Adams (vai sair no Brasil via FNM) e o "Twilight", do The Handsome Family. O mestre Bob Dylan também lançou um clássico, o ótimo "Love And Theft", mas ninguém falou nada. Pena. Deveriam, ao menos, ler também a Uncut.

Felizmente, aqui no Scream & Yell, seguramos a bola. Com cada vez um número maior de bons e regulares colaboradores, o site tem conseguido apresentar ótimas matérias sobre música, cinema, literatura e cultura pop em geral. De música, falamos com muita gente, de Marisa Monte a Ian McCulloch. De cinema, você leu aqui sobre quase todas as estréias. Isso, sem qualquer apoio financeiro, apenas a vontade de escrever e a paixão por cultura. Isso é rock, é como você leva a vida. Se você procura pelos novos e talentosos nomes que escrevem sobre música atualmente, é só passear pelo site. Vai encontrar gente apaixonada pelo que faz. A secão de links também é uma boa pedida. 

2001, em uma palavra, foi o ano do "hype". E como era previsto, nada aconteceu. Barulho mesmo, só o dos atentados de 11 de setembro. Esperamos que esse seja um ano melhor, bem melhor. Feliz 2002 a todos e, aqui no S&Y, todo mundo vai continuar rock.