O
CEL & o Limite
Não Me Toc
por
Carlos Eduardo Lima
23/04/05
Eu
sou fã de Roberto Carlos. Sempre fui, desde muito pequeno. Há cenas
maravilhosas nas minhas memórias emocionais que contam com trilha sonora do
velho Rei, e, o contrário, há músicas do capixaba mais ilustre do Brasil, que
me lembram de coisas que não me são claras, mas que habitam meu arquivo de
filmes pensantes.
Há pouco tempo me dei conta que Roberto Carlos Braga era uma pessoa de carne e
osso, quando chorou em público a morte de sua terceira esposa, Maria Rita.
Passei a admirá-lo ainda mais, talvez pelo fato de saber que sua humanidade
era realmente palpável, numa hora em que a dor nivela todos no mesmo nicho.
Folclórico é o mínimo que se pode falar de Roberto. O sujeito só usa roupas
com certos tons de cor, não pronuncia palavras negativas ou ofensivas, não
fala com quem está vestindo marrom, se incomoda com quem esteja vestindo
preto, enfim, o cara tem um leque de manias muito loucas e, aparentemente, sem
sentido algum, mas que se tornaram um traço marcante de sua personalidade
reclusa num apartamento do elegante bairro carioca da Urca.
Num Fantástico desses da vida, o editor geral do programa, Geneton Moraes
Neto
conduziu uma entrevista supostamente reveladora sobre “as manias de Roberto
Carlos” na qual os dois conversaram sobre as implicâncias do Rei com algumas
coisas da vida. O cantor e compositor mais popular do Brasil em quatro décadas
foi exposto ao ridículo de responder à pergunta “você ainda fala com
plantas?”. Tentando se explicar e bastante constrangido, Roberto Carlos disse
que apenas as cumprimentava, algo que pode ser metafórico ou até mesmo
mentiroso, dependendo do que se entende. Mas Geneton não deixou pedra sobre
pedra, com um terrível “como assim?”. Roberto ainda precisou buscar mais e
mais dentro de sua caixa preta mental para responder: “na verdade eu apenas as
cumprimento. Na verdade, muitas pessoas falam com plantas”. Chegou-se à
conclusão que RC sofre de TOC – Transtorno Obsessivo Compulsivo. Algo parecido
com o que o ator Tony Shalloub faz ao encarnar o detetive Adrian Monk, na
série homônima transmitida pelo canal Universal/Net.
A pergunta que fica é: quem, neste mundo maluco, não tem TOC? Todos nós somos
plenos de obsessões e compulsões, nem que seja pela perseguição à graça de não
tê-las mais. Eu sou um obsessivo-compulsivo disfarçado. Sou cínico com isso.
Na verdade eu sou quase louco. Presto atenção em coisas que acho que sou a
única pessoa a ver, como, por exemplo: acredito piamente que o sabor da coca-
cola em vidro é extremamente diferente da que vem nas garrafas plásticas
atuais.
Aliás, há muito plástico no mundo. Era melhor quando as coisas eram
feitas de metal. Muito acrílico e muito plástico me irritam. Reciclagem também
me irrita um pouco, não pelo propósito, mas como ela acaba associada a
miseráveis desempregados que catam latinhas de refrigerante e cerveja nos
lixões para trocar por míseros centavos. Eu tenho TOC com o Greenpeace, com o
Lula. Com o Bush. Com o Michael Moore. Com a Natalie Portman. Com Angelina
Jolie, Juntas, já pensou?
Eu costumava ter TOC com a crítica musical brasileira. Achava que deveria
haver ética, prestação de serviços e boas intenções. Qual o quê. Nada disso.
Crítica musical no Brasil – e não adianta dizer que no mundo é assim, porque
não é – é um desfile de top models de 1,60m. Somos todos anões e nos achamos
gigantes. Pensamos que temos as melhores e mais bem sacadas opiniões, mas elas
todas, sem exceção, estão num livro do Gay Talese ou do John Fante ou do
Hunter Thompson. E todos ainda endeusam o Lester Bangs nunca tendo lido nada
dele ou lendo apenas por ler. Ninguém é capaz de criar um estilo, mínimo que
seja, ou, na essência, se ater ao princípio de informar e não desfilar na tal
passarela daí de cima.
Eu tenho TOC com crítica musical. Já tive com música, mas me acalmei com o
tempo. Não entendia como tantas coisas ruins podiam ser consumidas por tanta
gente e descobri que é assim mesmo. Leis de mercado. Marketing. Ouça. Não
questione. Descobri que eu posso ouvir o que quiser, sendo assim, uso o meu
gosto musical, do qual gosto muito e que foi forjado ao longo de quase 25, dos
meus 34 anos de idade. Sendo assim, não dou mais a mínima importância para o
que as pessoas ouvem. Querem ouvir CPM22, Ivete Sangalo, Serginho e Lacraia?
Ótimo. Apenas se divirta, não há nada melhor que rir e pular e beber.
A alienante farsa da risada bêbada como cura para os problemas. Isso é um TOC
que eu não tenho. Gosto de rir quando é para rir. E não bebo. É uma opção,
talvez seja até outro TOC.
Uma vez minha avó deu um conselho à minha mãe, que chorava por um namoradinho
perdido nas curvas da vida: “minha filha, guarde suas lágrimas para algo que
valha a pena”. O mesmo digo do riso. Guardemos para algo que valha a pena. Rir
nunca é demais, apenas acho que é tão importante quanto água, ar, dinheiro. E
não devemos desperdiçar o que é tão valioso.
Seria isso mais um TOC? Pode ser. Mas, quer saber, não estou nem aí.
Carlos
Eduardo Lima tem 34 anos, é caucasiano, apolítico, incolor,
inodoro e insípido.
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