O
CEL & o Limite
Pequeno
Comentário A Respeito Dos Indies
por
Carlos Eduardo Lima
14/08/02
Um dia eu aprendi na aula de Geografia que a divisão de rendas nos países do Terceiro Mundo era injusta. O professor Fernando, do saudoso Colégio Santo Agostinho disse um dia as palavras poderosas: "nos países pobres, os ricos são muito mais ricos que nos países ricos". E são essas frases, acumuladas e arquivadas no nosso inconsciente, que nos norteiam pela vida afora. Outro
dia pude perceber que ela pode ser adaptada da seguinte forma: "nos países pobres de cultura, os cultos são mais cultos que nos países ricos culturalmente". Verdade. Quem tem acesso à cultura por aqui é mais "culto" que a média de um país como os Estados Unidos, por exemplo.
Adaptando isso à cultura pop e, mais precisamente à música, temos o surgimento de uma raça dura de engolir: os indies. Claro, os indies existem em todo mundo, basta você ser contrário a uma maioria e, no caso específico da música, gravar um disco independentemente, que você vai ser indie, ou independente, que é o termo completo e correto. Aqui no Brasil, o indie é um sujeito
interessante. É uma pessoa culta sim, de classe média alta quase sempre, com acesso aos
canais condutores de "cultura", ou seja, Internet, TV a cabo, publicações internacionais, o que significa esclarecimento sobre as coisas que rolam no mundo. Só que o indie é um cara sempre muito chato. Chato e pretensioso. Pretensioso e contraditório.
Neste ofício jornalístico que mantenho na Rock Press em
seus seis anos de existência gloriosa, pude analisar algumas
pérolas do ideário indie.
E, por não ser indie, posso compreendê-los de uma maneira isenta a ponto de fazer algumas análises. Veja, leitor, nada contra os indies, mas uma contradição chave me faz pensar: se você é
indie e gosta de uma banda indie boa como Thee Butchers Orchestra, por exemplo, nada errado com você nem com a banda. Certo. Se amanhã os Butchers recebem uma proposta de contrato com a Sony para gravar um disco e aceitam, a pulga vai para trás da orelha indie. "Os caras se
venderam", ou "agora o trabalho deles vai se diluir". Ninguém pensa no fato de que para a banda, assinar com uma gravadora major significa, finalmente, $$$$$$$$ depois de um bom tempo de batalha no underground e, conseqüentemente, maior capacidade de atingir novos ouvintes no
Brasil. E este é exatamente o segundo ponto chave nisso tudo. Os indies só gostam das bandas enquanto elas não fazem sucesso para uma galera maior.
Veja o caso do Belle & Sebastian. Quando eles surgiram entre
os indies, através do segundo disco If You're Feeling Sinister,
eram a maior banda surgida desde a Última Ceia. Bastou a Trama
lançar toda a discografia deles por aqui incluindo seus singles,
que o B&S virou motivo de piada entre os indies brazucas. Coisa
mais injusta. O sucesso dos caras lá fora só faz aumentar e
eles cada vez se consolidam mais nos Estados Unidos.
Outro exemplo: Radiohead. A coisa mais próxima da perfeição surgida em termos de conceito, dignidade e potencial artístico nos últimos tempos. Já ouvi indie dizendo que o Radiohead, "em sua intenção de não manter um conceito era uma banda de rock às avessas, pois seu conceito era rock de tão diferente dos padrões do rock". Dá pra entender? E a música? Fica fora da discussão
de tão complexa que ela se torna.
É uma gente que ignora o preceito maior de que o "acessório acompanha o principal", ou seja, em termos rock, "as bandas indies acompanham as bandas matrizes". Exemplifico: o Beachwood Sparks acompanha o Byrds, o Apples In Stereo acompanha os Beatles, o Teenage Fanclub
acompanha o Big Star e por aí vai. Assim como o Thee Butchers Orchestra acompanha o Jon Spencer Blues Explosion, sem crises, sem dores na consciência. Talvez falte um pouco de
humildade, talvez um pouco de originalidade. Talvez um pouco de vergonha. Ou talvez haja coisas em excesso "demais".
Carlos Eduardo Lima tem quase 32 anos, é carioca e acredita que o mundo acabou há uns dez anos mas ninguém notou.
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