Yo La Tengo
entrevista
por Dagoberto Donato
30/06/2003
Formado em Hoboken, Nova Jersey, em
1984, o Yo La Tengo acaba de lançar seu 10º disco, "Summer
Sun". Depois de uma boa passagem pelo Brasil em 2001, a banda retorna a
ordem do dia com seu novo disco, mais leve e mais jazz ainda que o antecessor,
"And Then Nothing Turned Itself Inside-Out" (200). A árdua tarefa
de tentar descrever "Summer Sun", de comentar sobre as comparações
com Velvet Underground e outros detalhes sombrios ficou a cargo do baixista
James McNew, o gordinho alto de óculos na foto ai de cima, direto
de Minneapolis, local onde a banda iria tocar no mesmo dia.
Como você descreveria o
som do Yo La Tengo para alguém que nunca ouviu?
Normalmente, eu não tenho paciência
para isto. Então, eu provavelmente inventaria algo para não
ter que responder a pergunta. Acho que esta é minha resposta honesta
(risos). Eu não penso muito em descrever nossa música. Não
penso em termos de relaciona-la com a música de outras bandas porque
me parece meio limitante. Acho que a música que fazemos é
mais misteriosa do que só dizer que parece com alguma banda.
Mas ainda hoje, depois de todo
esse tempo de estrada, você ainda encontra gente que compara o som
de vocês com o do Velvet Underground. O que você acha disso?
Eu não ligo se for algo que
alguém realmente pensou. Isso não tem acontecido tanto nos
últimos tempos, então acho que eu já não ligo
tanto quanto no tempo em que isso acontecia diariamente. Eu amo o Velvet
Underground. Eu posso pensar em muitas coisas piores para se dizer de alguém.
E há comparações lógicas, mas acho que na maioria
das vezes em que nos compararam com eles foi por pura preguiça,
o que é uma pena. Mas se você pensar bem, uma comparação
com o Velvet Underground é um elogio.
Como você encaixa o Summer
Sun em comparação com os outros discos?
Acho que ele faz sentido, como um
próximo passo. Nós nunca fazemos planos para os futuros álbuns.
Não sabemos como eles vão ser ou soar. Não pensamos
se queremos que seja alto ou baixo, rápido ou lento. Nós
nos juntamos e deixamos as idéias chegarem enquanto trabalhamos.
Então o disco parece algo natural para nós. Não tenho
muita certeza de que outra maneira posso descrevê-lo. Há coisas
nele que podem ser relacionadas a discos anteriores, mas ainda assim ele
é completamente diferente.
A música latina e o krautrock
parecem ter sido algumas das influências para este disco. Você
concorda?
É possível. Nós
amamos discos, amamos música. Amamos o krautrock e amamos a música
brasielira, assim como amamos hip-hop, Velvet Underground, Kinks e um milhão
de outras bandas. Tudo entra no nosso cérebro de alguma maneira
e, de alguma maneira, tem que sair de lá. Eu gosto quando não
sai obviamente. Não gostaria de gravar uma canção
que soasse completamente igual a Kraftwerk. Gosto de colocar nossa personalidade,
mas estou certo de que há um número incontável de
sentimentos e até referências, caso você sente e fique
procurando. Mas não sei exatamente de onde elas vêm, só
sei que é de algum lugar das nossas coleções de discos.
Há algo de samba em "Season
of the Shark"...
Infelizmente, a mais avançada
qualidade de samba desta música é o botão do teclado
Casio que tem essa batida programada (risos).
Falando nisso, vocês usaram
bastante as batidas de teclados Casio nesse disco, não?
Sim. Usamos bastante o Casio. Gostamos
bastante dele. Ele é basicamente um brinquedo, mas soa muito legal.
Usamos algumas baterias eletrônicas mais antigas também, coisas
dos anos 60 que estavam até meio quebradas, mas o som ficou legal.
Vocês estão ficando
cada vez mais minimalistas?
Pode ser. Achei legal você ter
dito isto, porque não parece muito minimalista quando fazemos os
discos. Prestamos muita atenção a pequenos detalhes. Mas
gosto da idéia de dar a impressão de ser minimalista, apesar
do processo de construção ser complicado.
Talvez soe minimalista pelo fato
de vocês terem deixado o feedback de lado...
É difícil de dizer.
É engraçado porque ainda usamos muito feedback nos shows.
E há algumas canções que gravamos durante as sessões
de Summer Sun e acabaram não sendo incluídas no disco, e
devem ser lançadas em alguns meses, que são bastante altas
e têm muito feedback. É complicado (risos).
Como funciona o processo de composição
para vocês?
Quase tudo vem dos ensaios. Nós
tocamos juntos o tempo todo, quase sempre só por diversão.
Tocamos covers, músicas nossas mais antigas que não temos
tocado muito, e acabamos nos distraindo e tocando coisas com mais liberdade,
trocando instrumentos, tocando com afinações que nunca tínhamos
usado antes. Quando estamos tocando e esbarramos em uma melodia que nos
agrada, um ritmo que gostamos ou uns acordes legais, tentamos gravar o
mais rápido possível para depois ver que idéias conseguimos
tirar de lá. Muitas de nossas músicas nascem de jams instrumentais
de 30 minutas, que de algum modo viram canções de 5 ou 6
minutos com letra e tudo mais. Ou, às vezes, ficam como jams instrumentais
de 30 minutos.
Você prefere tocar ao vivo
ou gravar?
Eu não sei. Acho que no nosso
caso, os dois são bem diferentes. Gosto muito dos dois.
Há quanto tempo vocês
estão em turnê?
Há alguns meses.
E vão excursionar por mais
quanto tempo?
Por um bom tempo.
Há planos de passar pelo
Brasil?
Ainda não temos plano, mas
todos queremos muito voltar. Ainda conversamos sobre a primeira vez que
estivemos aí.
O que vocês acharam da sua
primeira visita ao país? Do que você se lembra?
Eu lembro de tudo. Foi uma das turnês
mais empolgantes que eu já fiz. Foi fantástico. Me fez ficar
tão entusiasmado com a música, minha vida, o mundo, e tudo
mais. Foi muito bom mesmo. O Brasil é um país sobre o qual
eu sempre imaginei umas coisas por causa da música, da comida e
de alguns poucos brasileiros que eu havia conhecido, e poder ir para aí
e vivenciar tudo isto foi muito especial para mim.
Vocês gostam de excursionar?
Sim, nós gostamos bastante.
Antes do novo álbum sair, ficamos um bom tempo se fazer uma excursão.
Mas ainda nos empolgamos bastante com isso. Às vezes cansa, mas
acho que o entusiasmo acaba vencendo a exaustão.
O que você tem escutado ultimamente?
Tenho ouvido bastante coisa da gravadora
Definitive Jux. Gosto muito dos discos do El-P, Aesop Rock e RJD2. Além
disso, estou escutando bastante um disco do Lô Borges. Eu só
o descobri por causa do disco Clube da Esquina, em que ele participou com
o Milton Nascimento. Também gosto muito de uma banda de São
Francisco chamada Deerhoof. Ouço discos o tempo todo, então
fica difícil lembrar todos.
Entrevista cedida pelo site Trama.com
"Summer Sun" - Yo La Tengo
por
Marcelo Costa
30/06/2003
Se um fã de rock independente
que amasse o Yo La Tengo de início de carreira, circa 1986/1989,
tivesse sido seqüestrado por ETs e devolvido ao mundo nesse ensolarado
inverno de 2003, iria se assustar com "Summer Sun", décimo álbum
do trio norte americano que quebra um silêncio de três anos
da banda. E não iria ser o tom sombrio das letras do álbum
que causaria tal catarse e sim a música. O Yo La Tengo que começou
na linha "I'm Waiting for the Man" em 1986, hoje em dia cantarola "Sunday
Morning" (impossível não usar uma metáfora velvetiana)
trocando a aspereza pela sutileza, o barulho pelo silêncio. São
dezessete anos separando "Ride The Tiger" de "Summer Sun" e a diferença,
meu amigo, é gritante. Nem parece a mesma banda. Enquanto a molecada
do tal novo rock prega o barulho, a família Yo La Tengo brinca com
teclados Casio e troca o som das guitarras por flautas, trumpetes e sax.
A rigor, a banda alcançou seu
clímax musical em seus dois últimos álbuns de estúdio,
os sensacionais "I Can Hear the Heart Beating as One" (1997) - mais rock,
e "And Then Nothing Turned Itself Inside-Out"
- mais baladeiro. "Summer Sun" é irmão direto deste último,
e fica escondido sobre a sombra do brilho dele. Lá, a banda promovia
um cruzamento de Velvet Underground com Cocteau Twins alcançando
um resultado apaixonante e arrebatador. Aqui, tudo soa preguiçoso
demais, seja pelo (ab)uso de bateria eletrônica, seja pela aproximação
do jazz, seja pela descaracterização do som Yo La Tengo (e
uma foto desfocada na capa não poderia ser mais perfeita) que agora
é calminho, calminho, calminho. E calminho.
Uma microfonia, distante, soa logo
na introdução da primeira música. O clima suave vai
invadindo o ambiente e cá estamos nós de novo no mundo do
Yo La Tengo. "Beach Party Tonight", a faixa um, traz apenas vocalizações
sob uma base suave que incluí trumpete, sax e flauta. Parece que
o trio está batendo cartão de ponto e não gravando
um novo disco, e jams-sessions transformadas em canções como
"Georgia Vs. Yo La Tengo" e "Moonrock Mambo" surgem para comprovar a falta
de criatividade que abateu o grupo. Porém, nem tudo está
perdido. A dobradinha "Little Eyes" / "Seasons of The Shark" coloca a guitarra
(calminha) em primeiro plano soando do tipo "bonitinha, mas ordinária",
o que em se tratando de Yo La Tengo é muuuuito pouco, mas mesmo
assim arranca sorrisos. Não dá para acusar o grupo de repetição
de fórmulas nem de acomodação no estilo. O trio se
aproxima velozmente do jazz e se distancia cada vez mais do rock. E nem
a cover de "Take Care" do Big Star
que fecha o CD consegue ensolarar um álbum que serve, apenas, para
abrir a porta do mundo Yo La Tengo para neófitos. Quem conhece algum
dos três álbuns citados nesta resenha, provavelmente vai se
decepcionar com "Summer Sun" e esperar, de dedos cruzados, que a próxima
estação do ano seja cheia de tempestades, trovoadas e ameaça
de fim do mundo. Tudo pelo rock and roll, claro.
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