"Icky Thump", White Stripes
por
Marcelo Costa Email
28/06/2007
Eu já tinha esquecido a existência do White Stripes quando "Icky Thump", sexto álbum do duo, caiu na Internet. Na verdade, um pouco antes, quando começou a circular o clipe da faixa título, nem liguei e nem fui atrás. Ou seja, não bastava ter esquecido, eu não acreditava mais no White Stripes. Talvez a culpa seja do show morno que eles protagonizaram no Tim Festival 2004, talvez seja porque "Get Behind Me Satan" não tenha me causado tanto impacto (não gostei de "Blue Orchid" e quando a ficha "My Doorbell" caiu já era tarde), ou então porque o Raconteurs tenha pegado minha cabeça nas mãos e sacudido para todos os lados.
O caso Raconteurs bateu forte. Nas vésperas do lançamento oficial de "Broken Boy Soldiers" (extra-oficialmente o disco já estava na internet meses antes), esperando uma via de contato ou com Jack White ou com Brendan Benson para um papo, sacudi meus pensamentos em uma reunião de pauta de uma revista pedindo espaço para a banda na capa. E eles mereciam, mas assumo hoje: naquela época talvez fosse exagero. Eu achava (e ainda acho) que o Raconteurs era (é) a banda perfeita para o público médio americano, aquele que fez do Led Zeppelin uma das bandas que mais vendeu discos em toda a história da música pop. E a estréia de "Broken Boy Soldiers" em sétimo na lista dos mais vendidos da Billboard com 61 mil cópias em uma semana corrobora essa opinião. Mesmo assim, eu esperava bem mais.
Depois disso, o Raconteurs saiu por ai fazendo shows, boatos correram para cá e para lá de que o White Stripes tinha aposentado a chuteira, e ninguém sabia dizer qual seria o futuro de Meg White, uma das dez piores bateristas que já seguraram uma baqueta. E então, do nada, Meg e Jack surgem vestidos como cowboys em uma das capas de discos mais bonitas do ano. Não liguei. Ouvi "Icky Thump", a faixa título e primeiro single, duas vezes desligadamente, e não me abalei. E então, numa noite qualquer, ainda no meu velho apartamento, coloquei o disco inteiro em alta qualidade para rodar no Windows Media Player, e o bumbo batendo forte nas duas caixas de som logo na abertura esmurrou minha descrença, pedindo atenção. Recuperei-me, me ergui, mas já estava no placar: Jack White 1 x 0 Marcelo Costa.
Ser surpreendido por um grande disco que você não tinha a mínima idéia de que seria um grande disco, no entanto, não é uma derrota, como muitos pensam. É aquilo: você perde pela aposta, mas ganha por ser uma amante da música pop. Se todas as bandas ruins que existem no mundo, e que nós execramos, lançassem discos bons como este, o mundo seria um lugar muito melhor (e nós provavelmente não iriamos ter do que reclamar, mas qualquer coisa a gente fala do governo, da seleção brasileira de futebol, do Caetano Veloso e do Galvão Bueno, e tudo voltaria ao normal). Ou seja, seria algo do tipo: mesmo quando a gente perde, a gente ganha. E é mais ou menos isso que acontecesse com "Icky Thump", sexto disco do White Stripes: eu não tinha a mínima expectativa de que os irmãos White pudessem lançar um grande disco, mas eles lançaram.
"Icky Thump" abre com a faixa título exibindo um poderoso riff de guitarra zeppeliniano, bumbo na cara, teclados e uma letra que critica o muro que os Estados Unidos querem fazer para separar o país do México. "You Don't Know What Love Is (You Just Do As You're Told)", a segunda, é deliciosa. É pop, mas é rock. É romântica, mas não é piegas. Tem um riff matador, teclados fazendo a cama, e um jeitão 1960. Na seqüência, "300 M.P.H. Torrential Outpour Blues", começa como um country que vai sendo desconstruído e se transformando em blues de boteco de beira de estrada. Até aqui, tudo normal. É o White Stripes que você aprendeu a amar (ou odiar, cada um que carregue a sua cruz). A grande piração do álbum acontece na faixa 4, a poderosíssima "Conquest", com toques mariachis, solos de trompete e uma deliciosa história de um conquistador que, enfim, é conquistado ("O amor para ele era um gracejo, até ele olhar nos olhos dela"). É difícil demais traduzir a grandeza de uma canção. "Conquest" tem suor latino, guitarras sujas, bateria marcante e um gingado conduzido por trompetes que dá vontade de chorar de tão lindo. É o tipo de música que vale um disco.
Eu passei as duas primeiras semanas chegando até a faixa quatro, e parando em "Conquest". Depois descobri a batida country com toques celtas dos violões e gaita da ótima "Prickly Thorn, But Sweetly Worn" e sua coda psicodélica "St. Andrew (This Battle Is In The Air)" (em que Meg pergunta: "Onde estão os anjos?"), a porrada "Rag & Bone", a quebrada "I'm Slowly Turning Into You" (que começa com os teclados mandando na melodia, mas que depois cede espaço para o domínio dos riffs de guitarra), o bluezaço "A Martyr For My Love For You" e "Effect & Cause", um country leve, brincalhão e desencanado. É uma sucessão de boas canções que mantém em alta o clima do disco, após seu começo matador, e coloca "Icky Thump" na lista de grandes discos do ano (e entre os melhores do White Stripes). Você pode até não gostar de Led Zeppelin (heresia, mas tudo bem), influência vital da banda; pode achar que Meg White não sabe nem segurar as baquetas (e não sabe mesmo, mas ela é tãooo charmosinha); pode até dizer que o som do duo é retro demais, mas mesmo assim eles são um dos grupos mais interessantes da música pop nos anos 00. É com prazer que perco uma aposta para o Jack White. Que venham outras.
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do White Stripes, por Jonas Lopes
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