"How To Dismantle An Atomic Bomb", U2
por Jonas Lopes
Gymnopedies
23/11/2004

Nestes quase trinta anos de carreira, o U2 mudou de som mais do que o Bono mudou de penteado. Começaram com o rock energético e criativo de Boy (um discão que ainda não ganhou o reconhecimento merecido), despontaram para o grande público com o messianismo, engajamento e shows explosivos da fase War, experimentaram novas texturas e sonoridades ambient em The Unforgettable Fire, foram fundo no som americano em The Joshua Tree e Rattle And Hum.

No auge da popularidade, mandaram a inocência às favas, vestiram a máscara do cinismo, abusaram dos experimentos eletrônicos nos ótimos Achtung Baby, Zooropa e Pop e estabeleceram a era dos mega shows. Os detratores podem até falar mal, mas os irlandeses nunca se acomodaram em um patamar de sucesso. Sempre buscaram caminhos que pareciam arriscados e se saíram bem.

Veio o ano 2000, e outra mudança no direcionamento sonoro. All That You Can't Leave Behind deixou para trás a eletrônica - uma pena, a banda seguia num caminho interessante; Zooropa é, até hoje, seu grande trabalho. Voltam as guitarras e instrumentos orgânicos, os shows menos megalômanos. E, principalmente, volta o messianismo exacerbado, que esteve (relativamente, claro) adormecido durante a década de noventa. Até em projeto em prol do perdão da dívida externa dos países do Terceiro Mundo Bono se meteu. E o disco, parte mais importante do processo todo, saiu mediano. A despeito de algumas belas canções (Walk On, New York, In a Little While), All That You Can't Leave Behind é um álbum óbvio e nada inventivo. Nada contra o engajamento político da banda, pelo contrário. Desde que não afete o som.

Para todos os efeitos, How To Dismantle An Atomic Bomb é um All That You Can't Leave Behind parte 2 e expandido. Sofre do mesmo mal: soluções pouco criativas, falta de personalidade, nenhuma coragem de arriscar. Certas qualidades do U2 estão ali, como a inegável competência técnica dos quatro enquanto instrumentistas (The Edge continua tocando pra cacete, a voz de Bono ainda comove em alguns momentos, etc), algumas boas letras, produção impecável. E só. É um disco correto, certinho. Cada nota está em seu devido lugar. Inofensivo é um bom adjetivo para defini-lo. Inofensivo e fácil, ou alguém duvida que dali vão sair uns quatro ou cinco compactos de sucesso e umas dez milhões de cópias vendidas?

Vertigo, primeiro hit do disco, é um rock que se pretende jovem e de guitarras pesadinhas. Tudo bem, é melhor que Elevation, do disco anterior, mas está bem longe de ousar. O melhor momento da música é quando The Edge brinca com arpejos dignos das canções de Boy. Muito pouco, principalmente pra quem lembra de singles anticonvencionais como Numb e Discotèque.

Love And Peace Or Else é esquisitinha, também traz umas guitarras, e passa batida. É impossível não falar nas baladas carregadas daquilo que chamo de "emoção de supermercado". One Step Closer, sem brincadeira, dá sono. Sometimes You Can't Make It On Your Own e
Original Of The Species, com jeitão de hinos, poderiam estar numa coletânea do Bon Jovi. Não fosse o talento de The Edge, estas faixas todas beirariam o ridículo. Mas o guitarrista consegue tirá-las um pouco (bem pouquinho, vai) da lama total.

Edge brilha também nas minguadas canções inspiradas de How To Dismantle..., como a balada Miracle Drug, melhor faixa do disco, de belo e guitarreiro solo e climas instigantes. Outra balada de qualidade é City Of Blinding Lights, herdeira direta de Walk On, do disco anterior. Crumbs From Your Table muda o andamento convencional e o resultado é bacana. Um doce pra quem adivinhar o que tem de melhor nela. As guitarras, evidentemente. Pois se há algo que este disco frouxo nos trouxe é a certeza de que Edge é o motorzinho da banda. Pena que não é sempre que um craque consegue carregar um grupo nas costas. Ainda mais um escrete do porte do U2.

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