The Cure, The Cure (Universal)
Lançamento Nacional
27/11/2004


Já faz uns quinze anos, desde a obra-prima Disintegration, que o Cure não lança algo que realmente faça jus ao passado da banda. A coletânea de remixes Mixed Up não passa de uma forma de pegar carona na então emergente dance music. Wish, sucesso absurdo de vendas (é o mais vendido da carreira do grupo), apesar dos ótimos momentos, carece de coesão. Wild Mood Swings beira o ridículo: um disco sem identidade, sem rumo definido e sem qualquer música que preste. Bloodflowers, lançado há quatro anos, tenta regurgitar os tempos de Disintegration e Pornography, e teoricamente fecharia uma trilogia depressiva iniciada com estes dois discos. Assim como em Wish, há boas canções, mas várias acabam se arrastando demais. O Cure virou sinônimo de banda que passou da hora de acabar, um dinossauro que perdeu o bonde da história.

Quando se pensou que Robert Smith ia parar de sujar o nome da banda em vão, ele anunciou que entraria em estúdio para gravar mais um disco, e que a produção seria de Ross Robinson, conhecido por trabalhar nas principais obras nu-metal e fã de longa data do Cure. Apreensão geral. Iria um dos maiores baluartes do pós-punk descambar para o estilo que consagrou Korn e Limp Bizkit? Mas os fãs podem se acalmar. O Cure não só não partiu para praias duvidosas como também conseguiu algo que há tempos parecia difícil: um trabalho inspirado e coerente. Ironia ou não, foi justamente nas guitarras, o instrumento-símbolo do rock, que Robert Smith encontrou a redenção que há tanto procurava. O trabalho de Robinson é exemplar, a sonoridade é clara e não deixa transparecer os vinte e poucos anos de carreira nas costas; The Cure parece gravado por uma banda iniciante e cheia de energia.

Algumas canções fazem alusões ao passado glorioso: (I Don't Know What's Going) On poderia estar em The Head On The Door; Anniversary (uma espécie de cold wave atualizada) em Faith, e Taking Off em Kiss Me Kiss Me Kiss Me - é até melhor que muita coisa daquele disco. Before Three também remete à priscas eras e nela a gente percebe porque o Interpol é acusado de chupar as bandas dos anos oitenta. As guitarras lembram as da banda nova iorquina, justamente por eles buscarem inspiração em discos daquela época. A ótima The End Of The World já entrou para a galeria das grandes canções pop do Cure, e Taking Off é outra que merece entrar. Já os momentos de peso puxam um pouco pra baixo o resultado de The Cure: Lost e Labyrinth são enfadonhas, enquanto The Promise se arrasta por intermináveis dez minutos, com um wah wah cansativo. Por outro lado, a mistura de guitarras distorcidas com a voz angustiada de Smith funciona bem em Us Or Them.

Ao contrário de Morrissey, outro ícone oitentista famoso pelas lamúrias e que está de volta após um tempo recluso, Robert Smith é monotemático e não foge de seus objetos líricos básicos (morte, separação, amores não correspondidos, etc). Não espere as pregações de cunho político de Moz, portanto. As letras continuam impregnadas de um romantismo extremo e fatalista, certas vezes até agressivo (em Us Or Them), bem ao gostinho dos fãs. Some isso ao fato de os admiradores do Cure não ouvirem um disco da banda tão bom quanto esse há anos e você verá muitas olheiras tristonhas se desfazendo por aí.

Por Jonas Lopes
Yer Blues