Entrevista - Seamus
por Leoardo Vinhas
Foto: Divulgação

lvinhas1@yahoo.com.br
23/12/2004

Os integrantes são alunos de Comunicação Social. Eles cantam em inglês, gravaram uma demo com capinha em preto-e-branco e seu som remete a dúzias de coisas anglofilias por aí. Matou a charada quem sacou que estamos falando de uma banda indie. Sim, o Seamus é indie e seus integrantes – Fernando Lalli (voz, guitarra e bateria), Luis Naressi (guitarra) e Pedro Junior (baixo) – não negam isso. O som de sua demo não traz nada de novo. E aí?

Aí que existe a famosa história: "estamos diante de uma banda promissora". Nas entrelinhas – leia-se ao vivo – o Seamus mostra tudo que sua mal-produzida demo sem nome escondeu. Melodias bem costuradas e a busca do refrão perfeito, que contrasta com sua vontade se soar progressivo. Peso em quilagem suficiente para não soar agressivo. O resultado ainda é aquém das aspirações de seus integrantes. Mas nada impede que eles cheguem à excelência de seus conterrâneos do The Vain, uma das melhores bandas dos palcos independentes do Brasil e que em breve ganhará uma matéria neste site.

Senso de putaria eles já tem. Brincando com sua condição estereotipada de "indies", o site da banda traz uma hilária "interpretação" para Lucifer Sam, do Pink Floyd, enquanto sua página com mp3s na loja gratuita Trama Virtual faz uma metalingüística tiração de sarro com as "influências", que vão dos búlgaros (!) do Subfine à "redentora" agremiação The International Baptist Days of Fire.
Quem tiver ouvidos (e senso de humor), ouça.

Nos palcos, os alto-falantes cospem riffs grunge que anseiam por cadências melódicas, e a influência de Sonic Youth é percebida tanto nas passagens melódicas quanto nas barulhentas. Há um clima meio deprê oriundo da obsessão de Lalli por Joy Division, e que é rebatido com o amor de Naressi e Junior por coisas menos lamurientas. E a faixa de abertura de sua demo, Blame, soa como Sugar fazendo uma cover do R.E.M.!! Convocamos a banda para explicar essa esquizofrenia e revelar os porquês da discrepância entre seu som e sua demo.


Como o Seamus começou?
Fernando: Comecei a dar o nome Seamus para a autoria das minhas músicas no fim de 1998. Nunca tive paciência para decorar tablaturas e tal, então sempre me dediquei a essas composições caseiras. Porém, nunca encontrava gente disposta a formar uma banda de verdade pra tocar esse repertório. A banda até então era formada por mim, meus alteregos e meu computador, que registrava tudo. Em 2003 fui convidado a fazer parte de uma banda chamada Polidreams, na qual conheci o Luis Naressi. Na faculdade, no mesmo ano, conheci o Danilo Nascimento (guitarrista que saiu há uns meses) e reencontrei um cara com quem havia tomado contato uns sete anos antes, o Pedro Jr. Chamei os três para fazer parte daquilo que viria a ser a primeira encarnação do Seamus, em junho de 2003. Nos primeiros ensaios, eu tocava bateria e cantava. Apenas em fevereiro deste ano fomos achar um baterista fixo - após a incrível marca de sete tentativas fracassadas em oito meses - que é o Nicholas Teixeira. Creio que contei a história inteira da banda, mas ainda estamos começando, não? (Nota: sim, tanto que a marca mudou para oito tentativas frustradas em dez meses – Nicholas foi expulso da banda em novembro. E agora há uma tecladista, Gabriela Munin, ensaiando com eles...).

Por que o nome Seamus?
Fernando: Seamus é o nome da faixa cinco do disco Meddle do Pink Floyd. Na época em que comprei meu primeiro computador, eu varria a internet atrás de sites sobre rock progressivo e encontrei num deles uma enquete que elegia essa música como a pior da discografia da banda. Realmente, é uma música fraca, mas acabei me identificando com a passividade do cachorro da letra, o "Seamus". Eu tinha outro nome pra banda, Miles Iz Dead, mas ia ficar indie demais... (risos)

Posso definir (superficialmente, é claro) a banda como uma mistura de Joy Division e grunge?
Fernando: Olha, sou um fã ferrenho de Joy Division, mas há pelo menos dois anos não componho mais nada pensando em fazer algo naquela linha. A última música do Seamus que atende essa definição é Blackbird II, que é a faixa-bônus na nossa fita-demo. Hoje, tenho as letras do Ian Curtis como inspiração bem mais do que o som. Há uma influência maior nas composições que são as melodias que eu ouvia quando criança, coisas como Queen, Eletric Light Orchestra, A-ha, Alan Parsons Project e outras breguices que meus pais tocavam no rádio - e que adoro até hoje e não escondo isso de ninguém. Essas coisas aparecem muito mais no resultado final do que os vanguardistas que tentei a vida inteira copiar e não consegui, como Sonic Youth, Guided By Voices, Echo & The Bunnymen, The Cure e The Jesus & Mary Chain. E o próprio Joy Division. E quando escrevo ao violão, tem uma coisa que é algo próximo de uma bigorna descendo na minha cabeça, que é Simon & Garfunkel. Quanto à parte do grunge, isso deve vir do fato que gostamos de rechear todas as nossas melodias com o máximo de barulho possível, exortando assim os nossos demônios interiores (risos). A nossa tendência é, no futuro, compormos as músicas todos juntos, e então finalmente nos livraremos de qualquer tentativa de cópia subliminar frustrada.

E a demo, que agora saiu em CD? O que houve com a gravação?
Fernando: Os gastos com estúdio para essa fita-demo esgotaram todas as minhas economias! E ela foi confeccionada em esquema totalmente caseiro, com quatro canções gravadas em estúdio, outras duas acústicas registradas em casa e uma faixa bônus.

Luis: Houve má-vontade do cara do estúdio, que só sabe gravar metal e não entendia nossas referências, mesmo levando os discos de bandas que gostamos para ele saber o que a gente queria. O cara parecia querer se livrar logo da gente, acabar logo com a gravação.

Fernando: Houve também inexperiência nossa, de não saber bem o que fazer em um estúdio. Mas temos planos de lançar mais CDs, o que falta é dinheiro. Chegamos a receber proposta de um amigo nosso que está montando um selo para 2005, mas no momento não sei a quantas anda o projeto.

Várias vezes vocês já confessaram sua admiração por bandas do Vale do Paraíba, como Blemish e Elegia. Você diria que eles são os destaques daqui? O que mais tem de bom?
Fernando: Blemish e Elegia com certeza são as bandas mais famosas daqui e, pra mim, estão entre as cinco melhores do Brasil. Mas nesse "top 5" eu também incluo o The Vain, que é uma banda de um talento anormal e que evoluiu muito nos últimos tempos. Na praia do punk/hardcore há o Submidian (Campos do Jordão), ótima banda ao vivo e com letras muito boas. Também me agrada bastante o trabalho do College e do Zumbis do Espaço (Pinda), do Yang (Taubaté) e do Distinctive Quality (São José dos Campos).

Pedro: Sobre o Blemish, sou apenas simpatizante, e o Elegia eu conheço faz pouco mais de seis meses. Uma das bandas que venho acompanhando já faz um bom tempo é os Cidadãos Brasileiros. Já fui grafiteiro dos caras por um ano, acredito que ainda faço parte daquela família. Quando participei, os caras estavam com a primeira formação, que era somente hip-hop (nota: agora os MCs são acompanhados por uma banda). Outra que já faz parte da cultura taubateana é o Mulé da Muleta, que faz um show a parte com as performances folclóricas nos cortejos organizados pela banda, e criaram recentemente a “maracongada”, uma bela mistura de maracatu e congada.

Existe uma "cena" mesmo aqui no Vale do Paraíba?
Fernando: "Cena" não existe. Talvez exista alguma coisa perto disso com as bandas de hardcore - que, infelizmente, andam atraindo mais público pelo rótulo que carregam do que pela qualidade do som que estão produzindo - mas não há "movimento" algum por aqui. O que existe são uns poucos gatos pingados que se reúnem de vez em quando pra ver uma banda ou outra, muitos deles se preocupando mais com a roupa que estão vestindo do que com o show no palco.

Pedro: Essa parada de cena é um rótulo sem força. O público quer ver diversidade. Nos eventos organizados, na minha opinião, deveria existir mais mistura de ritmos nos shows. É o mesmo que você ir a uma festa que tocam dez bandas do mesmo gênero, as bandas que estão começando perdem muito com isso. Isto serve pra variação de público também.

Das bandas daqui, vocês são a com menos estrada. Os que já estão mais ou menos estabelecidos mais cooperam ou mais prejudicam?
Fernando: Cooperam bastante, principalmente a The Vain, já que os caras que são nossos amigos há algum tempo. Uma banda é roadie da outra. Nós os ajudamos com equipamento e regulagem de som nos shows deles, e eles dão uma força nos nossos. Temos uma relação bem legal com quase todas as bandas da região. As poucas mancadas que outras pessoas deram com a gente não valem a pena serem citadas.

E sobre os palcos e espaços locais?
Fernando: Em Taubaté é uma frustração só. Só há o palco da faculdade de Comunicação Social, onde nós mesmos organizamos eventos, e o Open House, que tem aberto seu espaço para as bandas independentes, mas vende uma mísera latinha de cerveja a R$ 3,00... Fora isso, a prefeitura proibiu a entrada de menores de 18 anos em shows por causa da venda de bebidas alcoólicas e isso diminuiu sensivelmente o público que acompanha as bandas por aqui. O espaço tem sido melhor em São José dos Campos, onde o povo também tem comparecido aos shows num bom número.

Pedro: Deveriam existir mais locais em Taubaté, e com uma rotatividade maior de bandas. Infelizmente, o público taubateano está acostumado com bandas e músicos que tocam o repertório "Jovem Pan". Deus abençoe o (extinto) Bar do Índio!!! (nota: lendário – e tosquíssimo – bar de Taubaté que abrigava desde covers de heavy metal a modas de viola, às vezes no mesmo dia).

As verdadeiras "influências da banda", por favor.
Fernando: Bruce Springsteen, Sonic Youth, U2, Oasis, The Jesus & Mary Chain, The Cure fase Pornography, Guided By Voices, Echo & The Bunnymen, Subfine, Simon & Garfunkel, Queen, Eletric Light Orchestra, Alan Parsons Project.

Luis: Blind Melon, Radiohead, The Mars Volta, Interpol, Nirvana, Pink Floyd, 60's, 70's, 80's.

Pedro: Rock e pop dos anos 80, rock britânico e bandas indie (estou ouvindo muito isso!).

A última e maldosa pergunta: roqueiro daqui tem moral com a mulherada? (risos)
Fernando: Eu peguei muito mais meninas por causa do meu weblog do que por causa da banda. Isso responde tudo [risos].

Pedro: Respeitando, sempre tem! Porque todo "roqueiro" acha que todas as mulheres sempre estarão disponíveis!!!

Links

Site Oficial do Seamus
Fotolog Seamus
Seamus no Trama Virtual