"Daqui Pro Futuro", Pato Fu
por Marcelo Costa
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10/09/2007

"Daqui Pro Futuro", nono trabalho de inéditas do Pato Fu, é um disco carregado de exclamações. A banda mais genial do lado debaixo do Equador assume a independência e privilegia a internet ao mesmo tempo em que lança um de seus álbuns mais melancólicos e poéticos. O lirismo sempre marcou o texto de John, guitarrista e principal compositor da banda, mas no passado vinha carregado de uma dose de ironia que escondia o azedinho da tristeza. Agora não. John e Fernanda compuseram um disco que parece ter sido feito de encomenda para Nina, a filhinha do casal: é calmo – como que para não assustar crianças – e cheio de recadinhos sobre o futuro.

Se o clima não irá incomodar crianças, adultos podem até se assustar com a verve afiada de canções como "Espero" (que narra um fim de romance de forma desoladora, porém bela: "É difícil respirar sem você, não que eu goste de ser má, mas sorrir pra quê?"), "Tudo Vai Ficar Bem" (que, apesar do título "pra cima", crava: "Eu distribuo amor, eu curo solidão, mas peço por favor, alguém me dê a mão"), Woo! (do ótimo verso "A confusão pode ser doce, a perfeição pode matar"), "Nada Original" (do também ótimo verso "Você é como um filme ruim, que eu já sei o fim e é nada original") ou "1000 Guilhotinas" (que fala sobre guerra e traz outro poderoso verso: "Aqui não é lugar pra quem não tem coragem de atirar").

Produzido "em casa", no estúdio pessoal do guitarrista John em Belo Horizonte, "Daqui Pro Futuro" é um disco para ser ouvido prestando muita atenção no encarte, mas sem desviar a atenção dos arranjos. A famosa guitarra de John (que já levou prêmio de guitarrista do ano da finada Bizz em uma época que Edgard Scandurra ainda não era hors-concours) acrescenta detalhes, mas quem brilha são os barulhinhos eletrônicos que pontuam de forma especial cada arranjo. John usou a computação para emular harpas, realejo ou mesmo buscar outros tons para cada melodia do novo álbum. Esse trabalho cuidadoso deu ao disco um sotaque atemporal, cuja ligação com o título se aprofunda mais conforme o laser bate no CD.

"30.000 Pés" abre o álbum de forma leve com violão e teclado (tão suave quanto uma caixinha de bailarina); "Mamã Papá" (parceria do casal Pato Fu com o genial Rubinho Troll) brinca com versos infantis e tenta inverter o foco de atenção quando Fernanda canta "Estou aqui pra te escutar". A bela "Espero" bate forte na memória enquanto a cover de "Cities In Dust" (Siouxie and The Banshees) surge eletrônica e totalmente encaixada no espírito do álbum. A excelente "Tudo Vai Ficar Bem" conta com a colombiana Andrea Echeverri (do grupo Ateorcipelados) assinando a letra e dividindo os vocais com Fernanda Takai. As fofas "A Hora da Estrela" e "Vagalume" sugerem influência da pequena Nina enquanto "Woo!" é a faixa dançante do álbum, com guitarras altas, batida eletrônica marcada e refrão sacolejante.

"Daqui Pro Futuro" não é fácil (no conceito pop de música e letra), mas despeja inteligência em baldes sobre o apático cenário mainstream nacional. É um disco maduro de uma banda que insiste em buscar novos caminhos para a música popular brasileira, seja em termos musicais, seja em termos de mercado. Neste último caso, destaque para o fato do álbum ter chego primeiro às lojas onlines antes mesmo do disco ter ganhado um formato físico. Agora, com o álbum em mãos, optaram por lançar por selo próprio (o Rotomusic) e pela distribuição da pequena Tratore (que trabalha com selos indies como a Monstro Discos) ao invés de majors que pararam no tempo com relação à tecnologia. Com o Pato Fu, a música brasileira caminha – daqui pro futuro – sintonizada com o que de melhor acontece no mundo.

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