"With Teeth", Nine Inch Nails
por Marcelo Costa
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22/07/2005
With Teeth é um pequeno tratado de barulho e silêncio
que reúne os dois caras mais fodaços da música norte-americana
na atualidade em metade das 14 músicas do tracking list do CD.
Não, não estou falando de Jack White e Julian Casablancas. With
Teeth é o quarto disco da carreira do Nine Inch Nails, que
nada mais é do que uma one man band do esquisitão Trent Reznor,
e quebra um silêncio de seis anos na carreira do doido, e ainda
traz o cara mais cool do rock esmurrando a bateria em seis músicas,
e tocando percussão em outra: Dave Grohl. Essa dupla é responsável
pelo segundo melhor disco gringo do primeiro semestre de 2005.
Enquanto Killers e Bravery não se decidem quem copiou primeiro
o Duran Duran; enquanto o Kaiser Chiefs surge emprestando o
baixo do Gang of Four e as bases do Devo; enquanto o Strokes
tenta desovar o terceiro disco após o fiasco do segundo; enquanto
o Franz Ferdinand vive do sucesso de uma música e o Coldplay
tenta fazer do mundo um lugar perfeito, Reznor e Grohl lançam
discos adultos, pequenos choques de realidade musical pra quem
quer um pouco mais do que dançar ou chorar ouvindo algo.
No caso de Reznor e With Teeth, a preguiçosa grande imprensa
ainda insiste em definir o som como "música industrial". Porém,
o termo até podia valer alguma coisa 11 anos atrás, quando
o Nine Inch Nails lançou Downward Spiral. Hoje em dia,
principalmente após a popularização da eletrônica e a vagabundagem
do electro, não há nada mais retrô do que ser industrial. E
With Teeth não é só industrial: é rock, é eletrônico,
é gritado e é sensacional. E é popular, visto que alcançou o
primeiro posto da parada da Billboard.
A fórmula, no entanto, não mudou nadica de nada. Reznor canta
suas letras malucas sobre bases pesadas e lança em 2005 um disco
que poderia ter sido lançado em 1995 ou 2000. E provavelmente
em 2010. Várias músicas de With Teeth poderiam ter sido
inclusas em discos como Pretty Hate Machine (1989), o
citado Downward Spiral (1994) ou Fragile (1999),
mas juntas sobre o mesmo nome fazem do novo álbum o disco com
mais canções 'leves' da carreira do Nine Inch Nails. E parece
que foi tudo pensado.
All the Love in the World abre o disco pedindo atenção.
Reznor canta quase sussurado que está prestando atenção no marchar
dos insetos, sobre uma base leve, de programação econômica,
que traz Grohl na percussão. Ele só começa a rasgar a voz com
pouco mais de 1m30s de música. Ou seja, se você colocar o CD
e não prestar atenção, quando der por si já vai encontrar a
primeira música quase na metade. Reznor quer atenção. All
the Love in the World ganha corpo quase aos 4 minutos, quando
o cara começa a berrar: "Por que você fica com todo o amor do
mundo?". A faixa seguinte, You Know What You Are? traz
Grohl esmurrando o kit na faixa mais porrada de With Teeth,
que deve ser sensacional de se ouvir em uma pista em volume
máximo. Reznor berra e encerra o papo: "Lembre-se de onde você
veio, lembre-se quem você é".
É Grohl quem abre - e carrega - The Collector, faixa
musicalmente mais normalzinha, mas não menos "legal", principalmente
em seu final, quando um piano surge para duelar com os sussurros
do cantor. The Hand That Feeds surpreende por ser impressionantemente
dançavel, na linha do Garbage. A ausência de Grohl aqui deixou
a batida limpa, mas a letra é o NIN de sempre: "Dentro do seu
coração é negro, escuro e frio". Love Is Not Enough (outra
sem Grohl) é uma das grandes canções do CD, e ao contrário da
anterior, é estranha, com alternância na melodia, teclados góticos
e uma letra que defende que o amor nunca é o bastante.
Everyday Is Exactly the Same é prima de The Collector,
e as combinações do feeling criado entre a bateria
detalhista de Grohl e os sussuros de Reznor denotam um casamento
perfeito, principalmente na segunda parte de uma das melhores
letras de With Teeth: "Ás vezes eu penso que sou feliz
aqui, às vezes... contudo ainda finjo. Não há nenhum amor e
não há nenhuma dor: cada dia é exatamente o mesmo", canta Reznor,
do alto de seu mundo psicologicamente perturbado.
With Teeth, a faixa título, é a que mais se aproxima
do Reznor das antigas, alternando barulho e silêncio. Only
é prima de The Hand That Feeds, e as duas apresentam
ao mundo um Reznor musicalmente dançante e até melodicamente
calmo. Há até melodia vocal no refrão de Only, que tem
mais peso e é mais forte que The Hand That Feeds. Riffs
violentos de guitarra anunciam que o barulho está novamente
na ordem do dia, e Grhol acelera Getting Smaller como
se ela fosse um punk rock desgovernado.
Sunspots começa lenta e lembra Joy Division. "Ás vezes
eu me esqueço que estou vivo", canta Reznor sobre uma base lenta
que cresce no refrão, de bateria quebrada, cortesia Dave Grohl.
Melodicamente é uma das canções mais lentas do disco e faz a
cama para The Lines Begin The Blur, que segue quase no
mesmo clima, não fossem efeitos e microfonias disputarem atenção
com a voz (e
'pontadas' do New Order de Ceremony).
"Há coisas que eu disse que eu nunca faria", garante Reznor.
Juntas, Sunspots e The Lines Begin The Blur parecem
levar o álbum para seu final, após o início silencioso e sussurado
com All the Love in the World e a metade esquizofrênica
marcada por Everyday Is Exactly the Same.
A parte final do disco abre com a climática Beside You In
Time, de base repetida, e vocal calmo, e ganha reforço com
a bonita Right Where it Belongs, prima distante de Hurt,
canção já clássica do Nine Inch Nails, e que ganhou uma versão
sublime de Johnny Cash em seu último disco. Conforme citação
do grande Arthur Dapieve, que escreveu uma coluna inteira sobre
Right Where it Belongs no site No Minimo, Rob Sheffield,
crítico da Rolling Stone, ao falar sobre a música, escreveu
que esta é "a grande balada de piano ao estilo de Hurt
no álbum (...), tão triste que Johnny Cash a deve estar cantando
no paraíso".
Acabou? Ainda não. É com a bonus track Home, de bateria
marcante porém calma, e voz desnuda sobre a microfonia de guitarra,
que Trent Reznor desce o pano de With Teeth, um disco
intenso, excelente, cheio de nuances e variações melódicas.
Dave Grohl é peça chave em vários dos grandes momentos de um
dos prováveis grandes discos de 2005, assim como fez em Songs
For The Deaf, do Queens On The Stone Age, em 2002. A diferença
é que neste ano ele divide as atenções com o Foo Fighters, que
lançou In Your Honor, o melhor disco do ano, até agora,
mas isso já é uma outra história...
Links
Site Oficial do NIN
"Right
Where it Belongs", do NIN, por Arthur Dapieve
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