MTV ao Vivo - Nando Reis
por Leonardo Vinhas
lvinhas1@yahoo.com.br
20/09/2004

Nada mais chato que resenha de disco transformada em análise de mercado, então nem vou entrar na surrada discussão sobre o atoleiro de discos acústicos, ao vivo ou de covers (e em breve, provavelmente, coletâneas) no qual o mainstream nacional se meteu.

Porém, mais chato ainda é que Nando Reis tenha se atirado nesse lamaçal. Chato porque Nando é um compositor e músico de talento raro, seguramente o único no Brasil a combinar o sabor do rock’n’roll setentista com a tradição nacional e o folk gringo.

Legou hits aos montes para muita gente, principalmente para Cássia Eller, que lhe devia as calças e as ceroulas pelo sucesso. Pouco antes de abandonar os Titãs, Nando lançou Infernal, onde registrou ao vivo em estúdio alguns de seus maiores sucessos gravados pelos Titãs ou por outros artistas. Misto de medo de ficar sem grana para o leite das crianças e vontade de clamar os louros pelo seu próprio trabalho, Infernal provou-se, com o tempo, um produto válido e um puta disco, que de fato afirmava as virtudes de Reis, não só na composição mas também na execução.

Depois disso, veio o ótimo A Letra A, de canções inéditas (ou quase, já que regravava Luz dos Olhos e Mesmo Sozinho), que não vendeu tanto quanto o esperado. O que fazer? Recorrer ao pronto-socorro mercadológico da franquia MTV Ao Vivo. E assim, creditado a Nando Reis & Os Infernais, chega o disco às lojas.

O disco é bom? Em grande parte é. Precisava existir? Como a maioria dos discos ao vivo (nacionais ou estrangeiros), não. Acredito que nem mesmo o fã mais xiita precisa do quinto registro em disco de Marvin (três vezes com os Titãs, duas com Reis solo), uma versão de um reggae semi-obscuro. E nunca, nunca mesmo, artista algum precisou daquele coro Programa Livre que estraga a beleza de All Star e empesteia os grandes sucessos – O Segundo Sol ficou mais com cara de karaokê animado de que da boa canção que é.

Até aí, valeria argumentar que isso é problema de qualquer disco ao vivo. Porém – insisto – por que apresentar o que já foi visto muitas vezes? Só há uma resposta: por causa do público. Não, espertinho, as gravadoras pouco tem a ver com isso. Somos nós, compradores de disco, que preferimos ouvir pela trocentésmia vez a mesma música em vez de arriscar algo diferente. Ou você acha que são os discos solos que pagam as contas de gente como Robert Plant, Mick Jagger e Pete Townshend? A grana vem toda das reedições, compilações e caça-níqueis com aplausos e assobios entre as faixas.

Para um artista (Nando em especial), que não raro tem crises de auto-estima quanto às suas qualidades, também é um meio de jogar para a torcida e pagar o cloro da piscina. E quem está um pouquinho a fim de escutar coisa diferente de seu ídolo, acaba comprando o embrulho por causa de uma ou outra composição inédita.

Dessas, MTV Ao Vivo traz as excelentes Por Onde Andei, que é Nando fazendo o que faz melhor (letra pessoal e primorosa, harmonia bela sobre melodia simples, refrão primoroso), e Mantra, uma espécie de cruza entre os Novos Baianos de Acabou Chorare com o Led Zeppelin de Physical Grafitti. Quase Que Dezoito também quebra bem o galho, mas o tatu sai do buraco em Do Seu Lado, insuportável canção que Nando fez para o Jota Quest e que é onipresente em FMs populares, barzinhos e repertórios de banda cover. Populismo escroto, refrão constrangedor (“lá... lalalaláa...”) e letra plena de lugares comuns (“Você me achava muito esquisito e eu te achava tão chata”, “o amor tem sabor para quem bebe sua água”). Deslizes, qualquer pessoa comete, não precisa ser artista. Mas o vício que Nando tem em dizer “ó, fui eu que fiz essa, viu?” poderia ter sido deixado de lado nesse caso. Não vou nem falar de Pomar, gravada com os gaúchos do Ultramen, mas que poderia perfeitamente ter sido acompanhada pelo Natiruts. Aliás, poderia ter sido composta por eles (“mas que belê lê lê lê leza de mulher/ que me apaixona só quando me quer”).

No mais, o disco traz boas (eu disse que não era de todo ruim) versões de No Recreio, Relicário, Luz dos Olhos (de novo...) e Meu Aniversário. Somados a Por Onde Andei e Mantra e mais uns momentos, daria para dar uma nota 7, fosse o caso de avaliar numericamente. Mas, honestamente, é um disco que não faz falta nenhuma, mesmo para quem (como eu) é fã do homem.

Leonardo Vinhas, 25, tem os quatro outros discos de Nando Reis, mas vai deixar esse fora de sua prateleira.


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