"Good News For The People Who Love Bad News" - Modest Mouse
por Leonardo Vinhas
lvinhas1@yahoo.com.br
29/10/2004

Você conhece o Modest Mouse? Eu não conhecia. Good News For The People Who Love Bad News é o sétimo disco deles, sem contar EPs e o projeto paralelo Ugly Casanova, e isso é o máximo de informação confiável que eu posso te dar sobre a banda. O que integra esse texto são impressões pessoais, aquelas coisas sutis e desconcertantes que fazem você se apaixonar pela música e por uma banda em especial.

Good News... foi lançado este ano e surpreendentemente ganhou uma edição nacional pela Sum Records. O disco parece ser badalado apenas por uma pequena parcela de críticos na Gringolândia, e ainda assim, de forma bem contida. Mas o Modest Mouse é mais que uma banda indie com um nomezinho esperto. É um trio de malucos cuca-fresca dos cafundós de Washington que usam um nomezinho esperto para veicular sua grande música. Os catálogos das lojas virtuais os classificam desde "emo" até "experimentalismo lo-fi". Como conseguem dar rótulos tão díspares, é coisa para um lingüista decifrar. Talvez dê para dizer que eles soam como o Supergrass fazendo covers do Flaming Lips, ou como um Primus que largou o funk para cair de boca em Tom Waits. Porém, acho mais correto dizer que eles soam como o Modest Mouse mesmo.

Há um inegável espírito neo-beatnik que permeia o disco do começo ao fim. Os metais ocasionais, as guitarras espaciais, os vocais "interpretativos", as passagens mais contemplativas, o senso de putaria, tudo remete a uma luz estradeira imprecisa, típica de quem está vagando à procura de diversão, mas também encontra tempo para pensar sobre a vida – ainda que sobre questões que não importam muito. Na verdade, é tão beat que não respeita nem os cânones do gênero, 'dessacralizando' Bukowskina canção que leva seu nome, na qual perguntam "Deus, quem gostaria de ser tão babaca assim?". Isso sobre uma base de valsa bêbada que confirma a supracitada influência de Tom Waits. Influência que reaparece no jazz falso de The Devil’s Workday, onde os vocais mutantes assumem uma fúria de escárnio como pouco se vê por aí. Talvez em Nick Cave se encontre algo semelhante. Talvez.

Tem muita guitarra emulando banjo, muita base grave e repetitiva, bastante bateria de lata. Mas tem também muitas linhas melódicas saltitantes, órgãos e teclados que enchem os espaços vazios com beleza e uma variedade inacreditável dos timbres de todos os instrumentos. Até a única vinheta, Eric’s Interlude, consegue encantar o ouvinte, com um bebê "falando" sobre uma trama quase sacra de órgão e cordas. E é essa peça de doce beleza que abre espaço para o tema mais delicado do disco, Blame It On The Tetons, uma canção que te envolve de tal maneira que você nem se dá conta que está ouvindo música, mas sabe que algo diferente está te alcançando. E ainda assim, é só uma fração do prazer que você encontra ainda mais emocionante na faixa de abertura, World At Large, uma obra que espíritos menos evoluídos definiriam como "triste". Eu não sou muito evoluído, mas digo que ela é bela. Belíssima. E a letra... "eu gosto de canções sobre errantes e livros sobre o mesmo assunto / gosto tanto deles porque eles fazem sentir-me menos insano”. E assim se segue... (Aliás, a única letra em que prestei atenção de fato foi a de World At Large mesmo. As músicas são tão atraentes que você entra no clima e ignora o que está sendo cantando).

Pelo que eu escrevi até agora, você deve estar achando que se trata de um disco calminho. Se você pensa assim, ou você precisa aprender a ler ou eu a escrever. Há passagens plácidas, sim, mas o pique aqui está além das idéias de "parado" ou "agitado". Pegue Black Cadillacs, por exemplo. Parece uma canção de ser tocada ao violão em um bar lotado, principalmente por causa de seu refrão balançado, mas não perde sua riqueza harmônica por causa disso. Ou One Chance, que nem por ser uma balada perde em vigor.

Eu ia encerrar por aqui, já que há outras coisas que o disco transmite que eu não me julgo capaz de escrever a respeito. Mas vi que nem falei do que o Modest Mouse tem de melhor, que são suas pequenas pérolas de pop perturbado. I’ve Got It All (Most) e o novo single The Ocean Breathes Salty seriam hits numa rádio que fosse ouvida por pessoas sem rumo e sem muita noção clara de quem são e o que querem. Pop, de certa forma, mas com um puta espírito errático. E realmente não me arrisco a dizer coisa alguma sobre Float On, até porque se você começar a ouvir o disco por essa canção, periga ignorar todas as outras. Meu Olimpo pessoal de canções recebeu uma nova habitante desde o primeiro momento em que ouvi essa maravilha.

Enfim, está aí mais ou menos o que eu posso falar sobre esse Good News For People Who Love Bad News. Tentei deixar as hipérboles de lado e me concentrar só no que interessa: a música. Não sei nem o nome dos integrantes, nem quero saber. Mas sei que esse é um disco como poucos, um disco que me lembra do aspecto absurdo e divertido da vida e que faz desta uma experiência bem mais divertida e empolgante.
"And we’ll all float on, ok..."

Leonardo Vinhas agradece muito ao amigo André Pagnossim, que me apresentou Modest Mouse num fim de semana em que a vida me parecia absurda e desinteressante. Não é.


Site Oficial do Modest Mouse