Entrevista - Los Pirata
por André Azenha
Foto - André Azenha
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22/03/2006

A cena: ao chegar no camarim para entrevistar a banda me deparo com um ser deitado em um colchonete em uma posição que parece meditação ou ioga. A explicação: "toda a vez que tem show ele incorpora um espírito, só assim ele se concentra (risos)". A banda: Los Pirata, vinda diretamente de San Pablo para conquistar o mundo. O cara deitado no chão é Loco Sosa (baterista), que junto com Paco Garcia (guitarra e voz) e Jesus Sanchez (baixo e voz) formam a trupe de piratas malucos.

O grupo, que atualmente é uma das sensações do cenário roqueiro independente nacional, criou um som próprio que mistura country, surf-music, letras cantadas em um portunhol "castiço", punk e rock com energia e estilo, como eles próprios definem.

Os três figuraças começaram a chamar atenção em 2001 quando concorreram na categoria Melhor Democlipe no VMB com Nada (que também disputou a categoria Pior Clipe). A letra, que traduz o espírito da formação, diz o seguinte: "Nada, nada, nada, nada, nada, nada, nada, nada, nada, nada / em mi corazón". Em 2003 chegou ao mercado o primeiro álbum, intitulado En Una Onda Neo-Punque (cuja tiragem inicial de 5 mil cópias está esgotada), com dezessete faixas "costuradas com uma surpreendente profundidade temática das canções e com produção toscamente bem cuidada" (como diz o release da banda).

Com uma apresentação verdadeiramente insana, onde se destacam a bateria de brinquedo esmurrada por Loco, e músicas rápidas que duram no máximo três minutos, o reconhecimento chegou com o prêmio de Melhor Show do Ano de 2005 pelo Guia da Folha. Além disso, eles estão no álbum Vou Tirar Você Desse Lugar -- Tributo a Odair José (que conta com participações de Paulo Miklos e Jumbo Electro, entre outros), em que interpretam a canção Cotidiano nº 3, e ainda foram parar no quadro Salva Vidas do Caldeirão do Huck com a faixa Me Gusta (Paloma).

Em um bate-papo divertidíssimo, o trio contou ao S&Y como foi o processo para participar desse tributo a Odair José e a história sensacional de Me Gusta (Paloma) no programa de Luciano Huck. Eles, que são amigos há anos e passam a impressão de realmente se divertirem muito juntos, ainda falaram sobre o próximo álbum, que será lançado em 2006 e outras "cositas" mais. (Detalhe: antes da conversa, Jesus me perguntou se eu gostaria que a entrevista fosse em portunhol ou português. Eu disse: "tanto faz", e eles resolveram se expressar em português provavelmente por achar que eu não fosse entender o portunhol "castiço" deles).

Vocês estão tocando músicas novas nos shows. Quando fica pronto o próximo álbum?
Paco - Provavelmente... O disco está pronto praticamente, mas não definimos data de lançamento.

Jesus - Muito provavelmente não será no primeiro semestre... E deve se chamar Los Pirata - La Re-vuelta.

Lançamento independente?
Paco - Muito provavelmente.

Jesus - Com distribuição da Tratore.

Como será musicalmente esse disco? Será gravado em portunhol também?
Jesus - Olha, o En Una Onda Neo-Punque foi gravado muito tempo atrás. Foi lançado em 2003, então muita coisa mudou desde lá. O portunhol ficou muito mais castiço, mais sofisticado. As canções ficaram praticamente um rock progressivo. Uma sinfonia eu diria. (risos)

Paco - Saindo de uma média de...

Jesus - De quarenta segundos fomos para o recorde de dois minutos. (risos)

Quantas músicas deve ter?
Jesus - Dezesseis...

Paco - Se "eles" deixarem... dezesseis.

Jesus - "Eles" é (sic.) o sistema. Você concorda Loco Sosa?

Loco - É o sistema, isso...

Jesus - O Loco tem um potunhol um pouco mais limitado que ele acha prolixo. (risos)

Onde vocês estudaram esse portunhol?
Jesus - Em Florianópolis. (risos)

Como rolou o lance da música que é trilha-sonora do quadro Salva Vidas do Caldeirão do Huck?
Paco - Eu acho que um dos DJs do programa... Na verdade essa música é uma versão, não é nossa. Aliás, se você tiver tempo, a história dessa música é maravilhosa.

Pode contar...
Paco - É meio maluco cara. Essa música é um dance, um disco, sei lá, um house. E aí a gente tinha um amigo em comum, o Zé Paulo...

Jesus - (corrigindo) É Zé Pablo!

Paco - ...que é baterista também, e que a gente não sabe qual é a conexão com esse cara. E ele cantava essa música para o Loco Sosa.

Loco - Cantava pra todo o mundo.

Jesus - Ele era professor?

Paco e Loco - Não.

Paco - Cantavam até no acampamento na escola. Ele cantava tanto pra gente e acabamos fazendo uma versão pra essa música, mas não sabíamos de quem era a música. E um belo dia, um outro cara, amigo meu, que não tinha nada a ver com essa galera, quando levei a música pra ele escutar, quando gravamos o disco, não, não, eu comecei a cantá-la pra ele e ele disse: canta de novo. Ele virou e falou: Peraí, essa música é minha! (gargalhadas) E o DJ do programa era um dos autores dessa música. Ele gostou mais da nossa versão e passou a tocá-la no quadro do programa.

Jesus - Essa música já tocava no programa do Huck na Bandeirantes...

Paco - Acho que sim...

Jesus - O Téo Werneck tocava...

Paco - É tamanha a confusão que não sabemos (risos).

Jesus - E a música ainda toca hoje em dia?

Paco - Não sei, acho que sim.

Jesus - Se não toca, ao menos ficou mais de um ano lá...

E como rolou a participação no álbum tributo a Odair José? Vocês gostam do cara mesmo?
Jesus - Sabe como surgiu essa história? Uma vez, acho que foi no Terra, ou um site qualquer, em uma entrevista, perguntaram o que a gente achava da música brega.

Paco - O que era brega, mas que fosse legal.

Jesus - E cada um de nós falou três coisas e esse Loco aqui falou Pare de Tomar a Pílula, Odair José, alguma coisa assim. Isso aí ficou na Internet um tempo desde então, provavelmente o cara que organizou...

Loco - O Sandro (Belo, da Allegro Discos).

Jesus - É, o Sandro, que organizou essa homenagem deve ter lido isso lá, imagino, ou não, e procurou a gente. E levamos um tempão pra escolher a música até o dia que descobrimos que tinha um disco do Odair José lançado na Argentina, que teoricamente era em espanhol, mas na verdade... (risos)

Paco - Na boa, na boa, o portunhol lá é foda cara (risos). Nosso portunhol acho que é até melhor.

Jesus - Mas é legal. Eu conheço pouco dessa época. O Fernando Catatau, do Cidadão Instigado, me deu um CD dele que eu não conhecia e achei genial, muito bom.

Rolou uma divulgação (para a banda) legal depois que vocês gravaram essa música?
Paco - Ainda não surtiu o efeito...

E vocês foram eleitos em 2005 como o melhor show do ano pelo Guia da Folha. Isso influenciou em algo a procura por shows?
Paco - Acho que um pouco sim, viu... Se bem que é recente também. Mas isso gerou alguns shows. Em Macau, também na África do Sul (risos). Assim, não quer dizer que você está fechando vários shows. Mas às vezes as pessoas gostam de ser pautadas de algum jeito e bem ou mal, ajuda.

Jesus - As pessoas acreditam na imprensa. (risos)

Paco - Mas é um pouco ao contrário também. Ao contrário não. A gente pra se divertir fazendo um show, quer fazer um show legal. Então tomamos um certo cuidado com equipe de som, com iluminação, em ter um equipamento acima da média.

Jesus - O figurino do Loco Sosa é uma coisa...

Loco - É, tem muitos detalhes, né?

Como surgiu a idéia dessa concepção meio maluca da banda? Tocar com bateria de brinquedo...
Loco - Surgiu de todas as bandas erradas que a gente teve. (gargalhadas)

Paco - Tudo o que tinha de errado... Falamos: Vamos tirar tudo isso.

Jesus - Todas eram um saco, tinha que levar um monte de equipamento, era uma tralha. Com bateria de brinquedo a gente vai lá e toca. As bandas têm reunião. (explicando) "Não, desencana, sem reunião, quando der vai, se não der não vai..."

E nos ensaios rola alguma concentração?
Loco - Ensaio? (risos)

Paco - Não... Quando tem ensaio é quando demora muito pra fazer show ou quando vamos tocar para a rainha. (risos)

Jesus - Pra rainha do carnaval. (risos)

E qual o lance com as hamburguesas (da música A mi me gustan las hamburguesas, um hino à cultura junk-food, contraditória às tendências alimentares da banda, cuja letra diz: A mi me gustan las hamburguesas / com papas fritas / con mayonesa)?
Paco - Essa é uma música tabu.

Loco - Dois terços da banda não concordam com a temática dessa música.

Quem compõe aqui?
Todos - Todo mundo.

Jesus - O método de composição é o seguinte. Ele (Paco) começa a fazer uma coisa séria e nós dois tentamos destruir. (risos)

Paco - Ou eles começam a fazer uma coisa bagaceira e eu tento fazer sério.

Jesus - Quando os outros conseguem o seu objetivo tá pronto.

A banda existe há quanto tempo?
Jesus - A primeira formação é de 1963 (risos). Não lembramos na verdade...

Loco, como você faz pra conciliar a banda com tocar com o Arnaldo (Antunes)?
Loco - Fazia, fui despedido agora (gargalhadas). (N: na verdade o Arnaldo está gravando o novo CD com músicos do Rio de Janeiro e Loco ainda não sabe se sairá novamente em turnê com o músico)

Dá pra viver apenas da banda?
Jesus - Tudo menos a banda. (risos)

Paco - A banda é um grande buraco de caixa 2. (risos)

Loco - A gente tá pra abrir a CPI da banda.

Paco - Quem pega o dinheiro quando tem show, distribui. (exemplifica) Um pra você, dois pra mim...(risos)

Então acho que é isso...
Jesus - Ihh... O cara desistiu... Eu vi um monte de perguntas ali ó... (risos). Mas então me fala da cena (musical) de Santos... (como esse é outro assunto o papo seguiu com o gravador desligado noite adentro)


Los Pirata no Sesc de Santos - 23/02/2006

Eleitos pelo Guia da Folha como o melhor show do ano passado, não dava para esperar menos do que muita diversão da apresentação do trio paulistano Los Pirata. A festa roqueira começou por volta das 22h no Bar do Sesc de Santos, e a platéia (que infelizmente não lotou o local) pôde suar a camisa em uma maratona de músicas de dois e três minutos de tirar o fôlego. Eles são ótimos músicos e criam um som que mistura de tudo e soa tosco, fresco.

De primeira, emendaram Batechica (que tem um videoclipe divertidíssimo), Beverly-Krishna e Pancho. A quarta pepita da noite, que deve pintar no próximo trabalho do grupo, foi a divertidíssima Lospi Gospel, (cujo refrão diz: Elvis esta muerto / Pero Jesus ressucitou) com levada de bateria que lembra a new wave. Aliás, o batera Loco é um show a parte. Ele, muito bom por sinal, toca uma bateria feita de brinquedo, que fica no centro do palco, e faz tanto barulho quanto um instrumento "de verdade". Paco também marca presença em ótimos solos e riffs de guitarra e Jesus segura a onda no seu baixo-guitarra. Um amigo a certa hora da noite falava: "meu, são só três caras fazendo esse som!"

Na seqüência, o trio alterna sons novos e antigos, com destaque para Vader (extraída da Marcha Imperial de John Williams), Me Gusta (Paloma), a engraçada A Mi Me Gustan Las Hamburguesas, Tid Bits (parceria com o portenho Sebastián Zubieta) e - apresentada como uma crítica social - República de Los Bananas. Aliás, a comunicação com o público foi pouca, mas quando rolou, provocou gargalhadas, principalmente com as piadas em portunhol de Loco Sosa.

Lá pela vigésima música, em pouco mais de uma hora de barulho, Jesus brincou dizendo que pela primeira vez na carreira deles a bateria estava inteira, já que geralmente lá pela oitava canção o instrumento costumava quebrar. Não foi pra menos. Logo em seguida parte da batera caiu.

[ Antes do fim, mandaram ver No Sei (da impagável letra que cantada por Paco ao vivo é um sarro total e que diz: No sei / Talvez / Quien Sabe?), Maldito Verano (outro sarro direcionado aqueles que não gostam de calor), Xa La La (porrada sonora que fica apenas no Xa La La La/ Xa La La La...) e o clássico Nada (essa não precisa dizer como é a letra, né?). Passada uma hora e meia, e vinte e quatro músicas, ficou provado que quando feito por diversão e de maneira desencanada, o rock ainda é capaz de divertir e muito. Principalmente quando a banda é formada por grandes amigos como os malucos do Los Pirata.

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Site Oficial Los Pirata