Entrevista - Hateen
por Marcos Paulino
Blug
Foto: Otávio Sousa / Divulgação
09/10/2006

Todo mundo sabia que a hora iria chegar. A idéia era ir adiando, adiando, até que inapelavelmente a dura decisão tivesse que ser tomada. E o Dia D realmente chegou. Foi 31 de agosto, quando, por meio de um comunicado distribuído à Imprensa, Ricardo Japinha anunciou que estava deixando as baquetas do Hateen. Baterista também do CPM 22, ele não conseguia mais conciliar as agendas das duas bandas. Com ele, saiu também o baixista Fernando Sanches, que igualmente vinha se desdobrando para dar conta dos muitos compromissos dos dois grupos, ambos num momento de intenso sucesso.

"A situação atual, de nos dividirmos entre as bandas, já estava causando transtorno e problemas pra muita gente, entre elas contratantes, escritório de shows, equipe do Hateen, Koala e Fabrizio. Por isso, estamos adotando esta nova estratégia. Mas continuamos no Hateen, mesmo não tocando. É para o bem de todos!", escreveu Japinha, fundador da banda junto com o vocalista e letrista Rodrigo Koala, no comunicado de despedida.

Formado em 1994, na Zona Oeste de São Paulo, o Hateen, com Shin e Sonrisal nos lugares de Japinha e Fernando, além de Fabrizio Martinelli na guitarra, vem realizando a turnê de Procedimentos de Emergência, o quinto disco da carreira e primeiro lançado por uma grande gravadora, a Arsenal/Universal. É também o primeiro cantado em português, que substituiu o inglês dos outros álbuns. Sobre a nova - e iluminada - fase, Koala conversou com exclusividade com o caderno Plug, parceiro Scream & Yell. Confira:

O que muda no Hateen com a saída do Japinha e do Fernando?
A saída dos caras, a princípio, foi bem difícil pra gente, até porque o Japinha fundou a banda comigo em 94. Mas a gente deu muita sorte com os dois amigos que estão entrando agora, o Shin e o Sonrisal, que estão trazendo a musicalidade deles. Isso vai trazer sons diferentes, não no sentido de mudar totalmente, mas a pegada na cozinha vai mudar, com certeza. A gente sente pelo amigo que não está mais com a gente por causa da agenda do CPM 22, mas por outro lado estamos superfelizes com os novos integrantes.

A separação motivada por brigas é difícil e triste. Mas e neste caso, em que a amizade entre quem entra e quem sai continua?
Não tivemos nenhuma briga, nenhum problema maior com a saída do Japinha. Chegou a hora em que tinha que acontecer. A gente só tentou adiar o máximo possível. Mas agora a idéia é que os novos integrantes fiquem definitivamente e que a gente comece uma nova etapa.

Há algum tempo, em entrevista ao Plug, o Japinha já falava desse trabalho nas duas bandas. A saída dele do Hateen foi conseqüência do sucesso de ambas. Como vocês, que ficaram tanto tempo no underground, estão lidando com os holofotes?
Pra gente, essa loucura é uma novidade. A gente ainda se admira das coisas que acontecem, de ver nosso clipe rolando na MTV. Mas a gente não se sente especial pelo que foi conquistado, e sim que estamos aos poucos conquistando. A gente se lembra da primeira demo que gravou, do primeiro show em lugar grande, e vai dando um gostinho de conquista muito legal. Talvez a gente não tenha absorvido ainda tudo que está rolando, a mídia, a molecada curtindo, comprando CD. Não tivemos um momento tão legal na nossa carreira. A preocupação agora é fazer um show cada vez melhor.

O sucesso do CPM 22 ajudou a impulsionar o Hateen, pela ligação meio umbilical entre as duas bandas, inclusive pelo Japinha tocar em ambas?
Ajudou. Mas eu também compus músicas para o CPM que fizeram muito sucesso. Então rola essa ligação mesmo, uma banda ajudando a outra. E essa saída do Japinha vai melhorar o lance de poder fazer mais shows, de gravação de CDs, porque a gente dependia muito dele. Sempre que ele puder, vai dar uma canja no nosso show, assim como nós no do CPM.

Esse boom na carreira de vocês também se deve ao fato de deixar de cantar em inglês para cantar em português?
A gente estava acostumado com outra sonoridade, o inglês flui melhor para o rock. Era bem mais despretensioso. A gente assumiu uma responsabilidade muito grande de cantar em português, uma coisa que nunca tinha feito. Em português, o cara entende de primeira. Isso é muito importante, principalmente nos shows, onde a galera canta junto. Claro que isso ajudou.

Até mesmo o material de divulgação do Hateen te classifica como um hitmaker. Quando você compõe, já pensa nas paradas ou o sucesso é uma conseqüência do seu trabalho?
Nunca imaginei que iria fazer sucesso. A primeira música que fiz em português, Não Sei Viver Sem Ter Você, o CPM gravou no seu segundo disco. Sempre brinco com o Japinha que fiquei com a maior vergonha de entregar a música, porque ainda não tinha me habituado a ouvir uma letra minha em português. Mas foi com o direito autoral dela que consegui comprar uma guitarra Gibson, que era meu sonho. E também abriu o caminho que me fez emplacar duas, três, quatro músicas seguidas. Apenas escrevo o que está na minha cabeça, não penso em fazer sucesso mesmo. O que traz sucesso pra música é a galera se identificar com ela, seja pelo sentimento, seja pelo prazer de dançar ou qualquer coisa desse tipo.

Você não curte a história de que o Hateen é precursor do emocore. Não te agrada a idéia de rotular o som que a banda faz?
Agora todo mundo só fala nesse assunto do emo. A gente começou isso em 94 e talvez a galera que curte emo nem ache que a gente é emo mais. O termo ficou muito pejorativo, virou motivo de brincadeira. Isso acabou tirando o sentido do termo, que vem de "emotion" e de "hardcore". São músicas hardcore que falam de sentimentos. Mas esse lance de moda, de maneira de se vestir, está tirando credibilidade do emo. Fui uma das primeiras pessoas a trazer esse tipo de música para o Brasil, a participar de discos lá fora, e é um prazer saber que isso virou um movimento. Mas ao mesmo tempo a gente vê que não está havendo consciência da galera, que está deixando o emo seguir caminhos que não são os certos.

Para quem ralou tanto até agora, como é finalmente poder contar com a estrutura de uma grande gravadora?
É uma coisa bem nova. Durante 12 anos de carreira, a gente só teve gravadora independente, não tinha acesso à mídia. Agora uma nova porta se abriu, ficou mais simples de conseguir as coisas. A gente também está aprendendo coisas novas, que achava que sabia. Estamos tendo lições de um monte de coisas diferentes. E também aprendendo a soar radio-fônico sem perder a identidade. A gente agora conta com toda uma assessoria que não tínhamos no passado.

Entrevista cedida pelo caderno PLUG do jornal Gazeta de Limeira

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Site Oficial do Hateen