Entrevista - Forgotten Boys
por André Azenha
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07/02/2006

Fazer rock no Brasil não é tão fácil. Entre tantas bandas, são poucas as que conseguem atingir uma boa quantidade de pessoas, fazer shows com uma estrutura razoável e ainda ser reconhecida pela (várias vezes) tão exijente crítica musical. Nesse cenário, quem vem se destacando são os caras do Forgotten Boys (banda formada por Gustavo Riviera na guitarra e vocal, Chuck Hipolitho que também toca guitarra e canta, Zé Mazzei no baixo e Flavio Cavichioli na bateria). Ralando desde 1997, quando lançaram sua primeira demo (intitulada cos revenge is sweet), a banda conseguiu destaque no cenário independente brasileiro e agora procura alçar vôos mais altos.

Com um verdadeiro caldeirão energético de referências, que passa por Ramones, Iggy Pop (o nome do grupo, que significa "garotos esquecidos", foi tirado de um verso de Search & Destroy, dos Stooges), Johnny Thunders, MC5 e até Rolling Stones (fizeram cover dos ingleses no programa Covernation da MTV), a banda se destacou em 2005 com o lançamento do seu terceiro álbum, Stand By The D.A.N.C.E. (os anteriores foram Forgotten Boys de 2001 e Gimme More de 2003, ambos independentes; além da participação em coletâneas e álbuns split com bandas como Motosierra e Killer Dolls), produzido por Daniel Ganjaman (do coletivo Instituto), que foi bastante elogiado pela crítica e têm aparecido nas listas de melhores do ano.

Com a boa repercussão desse último trabalho, que mereceu reverência até de grandes veículos da imprensa como o jornal Folha de S. Paulo e a revista Isto é Gente, os caras se sentem cobrados para levar ao público um show cada vez melhor. "Se falaram bem pra caralho, é bom que o show seja bom pra caralho", analisa Chuck. Um fator que contribuiu para a boa recepção de Stand By... foi a parceria com a gravadora ST2, que possibilitou uma estrutura profissional às atuais apresentações do quarteto. "Tem um pessoal de marketing envolvido que ajuda a divulgar o disco. Temos assessoria de imprensa. Possibilitou que gravássemos o disco do jeito que quiséssemos", lembra Gustavo.

O disco também se diferencia dos anteriores, já que - pela primeira vez na carreira - eles gravaram três músicas cantadas em português (Não Vou Ficar, Blá, Blá Blá e 5 Mentiras). Gustavo comenta a influência da ST2 na gravação das músicas: "(...) Já havíamos pensado em gravar em português antes de ter a gravadora; mas na época o resultado não ficou legal. E com eles pedindo, forçamos um pouco mais e chegamos ao resultado que queríamos".

Com o merecido destaque na cena nacional, os quatro chamaram a atenção de bandas gringas e já excursionaram com gente como Backyard Babies, Marky Ramone and the Intruders e MC5, ídolos dos Forgotten Boys. "Eu acho que o mais legal de todos foi o MC5... com o Wayne Kramer", lembra Riviera. E ao mesmo tempo que idolatram os Ramones, se mostram decepcionados ao terem conhecido Marky. "Somos muito, muito fãs do Ramones. Passei minha adolescência toda vidrado nesses caras. Todos nós. Então, naquela época, a gente conheceu o Marky e ele talvez não fosse aquilo que a gente esperasse", lamenta Hipolitho.

De passagem por Santos para um show no Sesc, no dia do aniversário de 460 anos da cidade, o S&Y teve a oportunidade de bater um papo no camarim com os caras, que também falaram sobre seus objetivos, analisaram a possibilidade de surgirem mais músicas em português e comentaram o cenário rock brasileiro. Confira a entrevista completa.

O último trabalho da banda foi bastante elogiado pela crítica e têm aparecido nas listas dos melhores de 2005. No que isso afetou a carreira de vocês? O público dos shows aumentou?
Gustavo – A gente se sente um pouco mais cobrado, não diretamente, mas por termos feito um disco que achamos muito bom, queremos ter um show que seja tão bom quanto. Trabalhamos pra isso, pra fazer um show do mesmo nível de qualidade do disco.

Chuck – A crítica falar bem trás mais responsabilidade ainda. Se falaram bem pra caralho, é bom que o show seja bom pra caralho.

Gustavo – É muito bom você ouvir o seu trabalho sendo elogiado.

Chuck – Foi muito bom o que aconteceu com a crítica desse álbum pra gente. Pessoas legais falaram coisas legais do disco. Isso foi o mais legal.

E até que ponto contar com uma gravadora (a ST2 Records) ajudou nesse sentido?
Gustavo – Entra na parte financeira, de divulgação. Ajudou bastante à banda a ter roadies e o disco chega mais fácil nas lojas. Tem um pessoal de marketing envolvido que ajuda a divulgar o disco. Temos assessoria de imprensa. Possibilitou que gravássemos o disco do jeito que quiséssemos. Se fosse antes, não seria possível gravá-lo em uma semana. Antes o custo era maior.

Chuck – Tem alguém com um pensamento maior por você também. Como é algo maior, aquela cobrança que falamos... tem uma expectativa maior em cima da banda.

Gustavo – Há mais pessoas envolvidas com a banda. Então nos sentimos mais responsáveis por envolver mais pessoas.

Vocês ainda se consideram independentes?
Gustavo – Um pouco menos. Só éramos independentes por falta de estrutura e opção. A independência tem a ver com a música que queremos fazer. A gente nunca conseguiu organizar direito e agora temos uma gravadora; mas continuamos fazendo a música que queremos.

Chuck – E acho que o que mudou depois de tudo isso foi o profissionalismo. Passamos a pensar de uma maneira mais profissional.

Esse é o melhor trabalho do grupo?
Gustavo – Eu considero. O último disco sempre é o melhor (risos).

Chuck – A gente não considerar o último trabalho o melhor acho que é um erro.

Há três músicas com letras em português em Stand By The D.A.N.C.E.. Como surgiu a idéia de gravá-las assim e rolou alguma influência externa nesse sentido?
Gustavo – Rolou influência da gravadora sim. Não que eles forçaram a gente a gravar. Mas eles sugeriram e já havíamos pensado em gravar em português antes de ter a gravadora; mas na época o resultado não ficou legal. E com eles pedindo, forçamos um pouco mais e chegamos ao resultado que queríamos, sem pensar em vendas.

Chuck – O Ganjaman (Daniel, produtor do disco)... quando chamamos o Ganjaman pra produzir, ele achou que pudesse ser uma boa idéia. Então com o produtor que você confia, apoio da gravadora, você acaba um pouco mais confiante pra tentar. Fizemos cinco músicas (com letras em português) e três entraram no disco. São músicas que passaram no nosso aval “Forgotten”.

Gustavo – As outras não entraram por que não achamos que ficaram boas.

No futuro podem surgir mais músicas em português? Quem sabe um disco todo?
Gustavo – Pode ser, não sabemos ainda, mas vai saber... particularmente prefiro o inglês. Mas acho que temos potencial pra fazer músicas em português tão boas como as que fizemos. Acho que vamos conseguir fazer melhor ainda.

Chuck – O negócio é ter vontade e estímulo também.

Gustavo – 100% em português eu não sei, mas vejo a gente experimentando...

E como está a turnê?
Chuck - Tá legal... tudo acumulou, o disco saiu, e conseguimos fazer um show de lançamento pra divulgar o CD. Não deu pra pensar em uma turnê pelas capitais. Só no meio do caminho é que conseguimos formar nossa equipe com roadies, uma produtora, a empresária, técnico de som... Agora temos uma estrutura que queremos para os nossos shows. Mas essa época do ano é parada e então espero que à partir de março a gente toque bastante.

As composições rolam na estrada?
Gustavo – A gente não compõe na estrada.

Chuck - A gente compõe separado, cada um no seu quartinho lá escondido.

Gustavo – Trocamos idéia. Mas no dia que fizermos uma maior quantidade de shows, de ficar mais na estrada, talvez passemos a compor mais na estrada; o que acho que vai ser uma coisa muito boa que vai acontecer. Será diferente...

O objetivo da banda é ser grande...
Chuck – É trabalhar muito, fazer muitos shows e evidentemente conseguir todo mundo viver disso. Não exatamente ser grande.

Gustavo – Buscamos atingir um certo nível de qualidade.

Se pintar uma major pela frente?
Gustavo – Isso não faz diferença, só vem a acrescentar. Se alguém quiser acrescentar algo ao que temos, iremos aceitar numa boa; caso contrário, não.

Vocês já tocaram com um monte de gente bacana. Dos grupos que a banda excursionou, que possam ser ídolos de vocês, quais foram os mais legais e os que possam ter decepcionado?
Chuck – Decepcionado... acho que o Marky (Ramone, ex-batera da lendária banda que veio ao Brasil com o The Intruders).. é que rolou um bode, sei lá...

Gustavo – Eu acho que o mais legal de todos foi o MC5... com o Wayne Kramer...

Chuck - Foi a maior banda que a gente chegou e não sei se iremos chegar de novo nisso (risos)

Gustavo – (talvez) Rolling Stones... (risos)

Irão ao Rio conferir o show deles?
Gustavo – Vamos sim...

Qual o bode com o Marky Ramone?
Chuck – Somos muito, muito fãs do Ramones. Passei minha adolescência toda vidrado nesses caras. Todos nós. Então, naquela época, a gente conheceu o Marky e ele talvez não fosse aquilo que a gente esperasse. Também nossa cabeça na época... não sei o que esperávamos... só sei que não era o que esperávamos (risos)

Gustavo – A gente esperava curtir mais...

Chuck – E tinha uma tiazinha, uma mulher que ficava controlando... a gente queria fazer balada...

Gustavo – Mas foi legal... fizemos um show tocando Ramones com ele na bateria. Foi a primeira banda do Brasil que fez turnê com ele! E foi muito bacana estar na estrada com bandas experientes, com uma visão profissional da estrada.

Como vocês enxergam o cenário rock no Brasil?
Gustavo – Toda a parte cultural e artística no Brasil é difícil. Não só para o músico; mas para o pintor, artista plástico, fotógrafo... A não ser que tenham pessoas que queiram investir nisso.

Chuck – Na verdade a gente quer poder ser reconhecido, viver disso, mas é difícil. Tem que ralar bastante até ter um retorno. Mas não só aqui no Brasil, lá pra fora também é difícil...

Conversando com o Gabriel (vocalista e guitarrista) do Autoramas, ele disse que mesmo sendo e tendo um tratamento de banda independente no Brasil, quando eles foram tocar no Uruguai e na Argentina, eles tiveram tratamento de banda grande...
Chuck – Na verdade é assim... Nós fomos tocar na Argentina... A gente era uma banda independente, pequena, que foi tocar no país pela primeira vez; só que as pessoas que estavam envolvidas com o show, o cara que mexe com o som, que tá envolvido com o lugar... todo mundo fica envolvido com o negócio de uma maneira artística também. Isso é engraçado, e por mais que seja um show até tosco, o cara responsável por tirar o som de você vai tratá-lo de maneira profissional. Isso falta às vezes no Brasil...

E algum recado pra quem curte a banda?
Gustavo – Quem quiser, visite nosso site, tem as datas dos shows, downloads, todas as informações da banda.

Chuck – Só queria que as pessoas que gostam da gente... curtam mais música.


Forgotten Boys - Ao vivo no Sesc de Santos - 26/01/2006
por André Azenha


No dia do aniversário de 460 anos da cidade de Santos, com uma baita tempestade caindo do céu, os Forgotten Boys mandaram ver seu rock energético e sem fírulas no Bar do Sesc do município. O local não lotou completamente, mas o público compareceu em boa quantidade e se aglomerou frente ao palco para conferir o set dos caras. Geralmente, nesses shows às quintas, que fazem parte de um projeto da instituição, costumam ter mesas por todo o bar; porém, quando as apresentações são roqueiras, as mesas logo dão lugar à garotada que pula sem parar. E não teve como ser de outro jeito.

A banda faz um som ultra-rápido, sem pausa, com raras intervenções dos integrantes ao público e liberam uma porrada atrás da outra. O show começou por volta das 21h50 com Hey Hey Hey. Seguiram-se outras pancadas sonoras como All You See, Just Done e Bad Luck. No palco, Chuck e Gustavo cantam junto seus rocks crus e adolescentes. Zé Mazzei manda bem no baixo e Flavio espanca sua bateria. Não há tempo para pausas, suspiros ou conversas. Não há baladas. O negócio é rock, guitarras altas, sujeira e barulho, no melhor estilo Stooges de tocar. O som dos caras mescla todas suas referências para criar uma cara própria. É punk, mas é hard-rock. É cru, mas tem solos. É Ramones com Stones. E gruda no ouvido.

Destaques da apresentação foram o cover dos Stones, Gimme Shelter, Rosana (essa fica na cabeça) e a clássica, anunciada como "uma das antigas", Can You Love Me?, uma das mais pops do quarteto e que não há como não cantar/berrar junto. Após cerca de 20 músicas e uma hora e meia de show, em uma das raras vezes que se dirigiram à platéia (já que o importante é tocar, ou não?) eles deram parabéns ao povo de Santos e encerraram a noite. Depois, ainda ficaram um tempo conversando e autografando CDs de fãs. Tudo nos conformes e rock no talo. Se há um caminho certo a seguir, a banda está nele.


Links
Site do Forgotten Boys com várias MP3 para 'baixar'