"Siberia", do Echo & The Bunnymen

por Marcelo Costa
Fotos: Site Oficial
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26/10/2005

O Echo & The Bunnymen está de volta. Quatro anos após o lançamento do mediano Flowers, e duas décadas depois da fase áurea do grupo, Ian McCulloch e Will Sargeant se reúnem novamente, se isolam metaforicamente na Siberia e lançam a melhor coleção de canções desde Evergreen, o excelente comeback de 1997.

A rigor, acontece algo bastante comum (na música pop) com o Echo & The Bunnymen: Ian e Will só existem quando estão escudados pelo nome da banda. O vocalista e letrista têm uma carreira solo que, no máximo, chega perto do razoável. Já o guitarrista tem um projeto solo chamado Glide, que só pode ser definido como interessante. Os discos solos de Ian carecem de força. Candleland, de 1989, era um álbum de boas canções, mas que sentia a falta de um guitarrista. Mysterio (1992) é o ponto baixo da carreira do cantor, só se salvando uma boa cover de Leonard Cohen (Lover, Lover, Lover). Já Slideling (2003) é seu melhor álbum solo, que está longe, muito longe de qualquer coisa com a etiqueta Bunnymen.

A química dos dois principais integrantes do Echo & The Bunnymen (o demolidor batera Pete de Freitas morreu em 1989 e o baixista Les Pattinson se aposentou da banda) está em compor e tocar juntos. Não à toa, o comeback Evergreen é o melhor disco da volta dos coelhos, já que o dolorido e soberbo What Are Going To Do If Your Life? (1989) é muito mais um álbum solo de Ian que traz Will Sargeant tocando guitarra e Flowers soa como o inverso, um álbum de Will que conta com Ian cantando.

Siberia, lançado na gringa em setembro, e com previsão de tiragem nacional pela Sum Records para dezembro, volta a colocar as coisas em pé de igualdade na banda, e alcança momentos de grandeza que chegam a arranhar o status intocável dos quatro primeiros álbuns da carreira dos homens coelho. Ian exibe sua voz desgastada, mas ainda charmosa, cantando o repertório mais confessional desde What Are Going To Do If Your Life? enquanto Will Sargeant despeja uma coleção de riffs que só encontra paralelo no projeto Electrafixion, ao lado de Ian, um Echo influenciado pelo Nirvana.

O primeiro single do álbum, a pungente Stormy Weather, abre o disco alternando os dois principais ingredientes da banda: magia e mistério. Uma guitarra suave dedilhada traz Ian questionando se ele pode ser como todos, que fingem que não há nada errado, quando há. A delicadeza dura até o meio da canção, quando Will volta a praticar algo que marcou muito o som dos Bunnymen na década de 80: solos inesperados, barulhentos, e que não combinam com a melodia, como se fosse uma música dentro de outra música. O resultado coloca Stormy Weather entre as grandes canções da banda, em todos os tempos.

All Because Of You Days começa novamente com guitarras repetidas. A voz grave de Ian quase tropeça nas palavras, mas cresce no refrão romântico de despedida: "And it's goodbye, goodbye all my new days / Goodbye, all because of you days / Goodbye". Will alterna guitarra solo e base com maestria, quando não sobrepõe vários riffs sobre a mesma base. Uma bela canção de amor que finaliza com "Baby maybe someday / Maybe one day / We'll say hi". Parthenon Drive é outra canção nos moldes da primeira fase. Riff hipnótico, refrão grandioso e Ian exibindo seu fio de voz castigado pelo tempo. In The Margins, novo single, é pura fase Heaven Up Here, com Ian pedindo uma ajuda para voltar a sonhar.

Um riff forte escudado por violão abre Of a Life. "I wanna song to learn and sing of a love requited", canta Ian. No meio, novamente um solo de guitarra estranho dos velhos tempos escorado por uma bateria demolidora, cortesia Simon Finley. Make Us Blind, Siberia, e principalmente Scissors In The Sand mostram que a nova fase de Ian e Will está intimamente relacionada com Heaven Up Here, o álbum que definiu o som dos Bunnymen primeira fase, glacial, distante. A faixa título crava, entre frio e gelo: "Where were you / When all the doors were closing / It's you who chose".

Everything Kills You, Sideways Eight e What If We Are mostram a delicadeza do Echo pós-Evergreen. Melodias suaves preenchidas por belos riffs fazem a cama para que Ian apareça declamando sua poesia. "Maybe I'm not the world / Maybe I'm not the stars / Maybe you're not the girl / What if you are? / Maybe I'm not the boy / Maybe I'm not the man / Maybe I'm not the one/ But what if I am? / What if I am? / Then it's love yes it's love like it could be / It's love yes it's love like it should be", canta o vocalista na faixa que encerra Siberia, alternando piano com riffs de guitarra no melhor estilo Ocean Rain.

Siberia não é só um grande disco, como também uma carta de intenções. Ao escolher como nome de seu nono álbum de inéditas a região onde acontecem as maiores variações de temperatura do mundo, no circulo polar ártico, o Echo & The Bunnymen opta pelo exílio musical, o que é acentuado pelo resgate do som da fase mais forte da banda, mas também de menos sucesso. Enquanto "pares" dos anos 80 como U2, New Order e The Cure ostentam vendagens astronômicas, reconhecimento da crítica e fazem grandes turnês mundiais (até Morrissey já passou da casa de 1 milhão de discos vendidos com You Are The Quarry e tocou "até" na Argentina), Ian e Will se isolam na Sibéria, são fotografados em Berlim, e continuam lançando grandes discos. Pode parecer pouco, mas não para os dois bunnymens. Eles têm a música. Basta.

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