Entrevista - Chris Cornell
por Marco Antonio Bart
Blog
04/12/2007

Dos primeiros shows do Soundgarden, em meados dos anos 80 do século passado - antes mesmo da invenção do termo grunge - até a trilha sonora do último filme de James Bond, Chris Cornell trilhou um longo caminho. O cantor norte-americano de 43 anos repassa alguns dos momentos marcantes desse caminho em sua atual turnê solo, que faz duas paradas no Brasil semana que vem. Legítimo ícone da geração do rock de Seattle, Cornell notabilizou-se como excepcional vocalista, primeiro à frente do Soundgarden, e depois no Audioslave (formado pelos músicos de outro grupo ícone do período, o Rage Against the Machine).

Depois de desmontar o Audioslave em fevereiro, o cantor lançou um álbum, "Carry On", e caiu na estrada sozinho… cantando músicas de seus dois ex-grupos. Vários hits do Soundgarden ("Outshined", "Spoonman", "Superunknown", "Pretty Noose"), algumas do Audioslave ("Cochise", "Show Me How To Live") e "You Know My Name", o tema de "007 - Cassino Royale". Antes do show, Cornell falou de sua casa em Los Angeles. Confira o bate papo:

Ouvi falar de seu acidente de moto, como você está agora?
Não me machuquei realmente. Já estou pronto para outra, foram só alguns arranhões.

E a turnê, tem ido bem?
Temos tocado pelo mundo afora. Passamos por toda a Europa, Austrália, Nova Zelândia… países do Norte da Europa, como a Islândia, onde nunca tinha me apresentado. É bom poder repassar canções de todas as fases de minha carreira, algo que eu nunca pude fazer antes. Quer dizer, o Audioslave tocava algumas músicas do Soundgarden, mas algumas outras eu nunca havia cantado ao vivo.

Você sabia que o Soundgarden ainda é muito popular por aqui, especialmente entre os jovens dos subúrbios? Há várias bandas cover tocando as músicas do grupo…
Sabia que o grupo era muito popular. Mas essa das bandas cover eu não tinha ouvido falar… Em 1994 tentamos armar uma turnê pelo Brasil, mas não deu certo.

Você foi integrante do Soundgarden por 13 anos e depois ficou no Audioslave outros seis. Como se sente agora, numa carreira solo “de verdade”?
Na verdade não é muito diferente de estar em uma banda. Eu amo a música que fiz com o Soundgarden e o Audioslave até hoje. Talvez a maior diferença seja a maior carga de trabalho que eu imponho a mim mesmo. Nem sempre é fácil conseguir com que os membros de uma banda se animem a ensaiar, a gravar, ou fazer uma excursão… E eu, pessoalmente, vivo apenas para isso. Todo o meu tempo é devotado à minha família e à música. Agora que estou solo, posso fazer mais shows, gravar mais, compor mais, porque não dependo de mais ninguém.

Essas dificuldades que você citou aconteceram pessoalmente contigo, no Soundgarden ou no Audioslave?
De um certo modo, sim. Às vezes quando os grupos fazem sucesso, eles assumem uma atitude meio burocrática. Ficam acomodados. Eu não; estou sempre cheio de projetos e idéias diferentes, e quero torná-los realidade. Quero escrever novas músicas, em estilos diferentes, que nunca experimentei antes. Isso é o mais importante. Vejo integrantes de bandas de sucesso fazendo de tudo, menos tocar e compor. Os caras viram paraquedistas, pilotos de corrida, roteiristas de cinema (risos). Quer dizer, eu entendo o lado deles, é todo um mundo de possibilidades que se abre, outras formas de expressão.

E como estão suas relações com os antigos membros de suas velhas bandas?
Tenho pouco contato com eles agora. Ainda sou amigo de todos eles, não houve briga. Mas eu moro em Los Angeles e faz mais de um ano desde minha última visita a Seattle. No meu tempo livre, não fico indo a shows e confraternizando com outros músicos; devoto todas as horas de folga à minha família.

Na turnê atual você canta músicas feitas há 12, 15 anos. Essas canções soam diferentes para você, com outra ótica, depois de todo esse tempo?
Agora tenho a chance de apenas cantá-las. Minha banda tem dois guitarristas e eu não preciso tocar guitarra no show, exceto por algumas músicas nas quais toco violão. É bastante diferente interpretar canções do Soundgarden como "Rusty Cage" e "Superunknown", concentrando-me apenas nos vocais. Já na época em que as compus, era um desafio tocá-las ao vivo – exigiam muito, tecnicamente falando. Em músicas mais simples, como "Loud Love", é mais fácil. É só uma questão de tentar recuperar a raiva que havia na versão original.

Sua banda atual precisou mudar muito os arranjos das músicas antigas?
As novas versões não são muito diferentes das originais. Estamos passando por vários territórios diferentes e isso é ótimo. Também há momentos sutis no show. Não se trata apenas de soltar agudos a torto e a direito. Isso é fácil. O negócio é manter a melodia, sem ter uma guitarra distorcida ou uma bateria trovejante por trás. É isso que amo nessa turnê: poder cantar coisas muito diferentes umas das outras, canções lindas e outras bastante agressivas.

Como você enxerga as diferenças entre as duas bandas agora?
Quando (nós no Soundgarden) gravamos "Superunknown", estávamos começando a nos interessar por outros tipos de música. Eu queria continuar a fazer barulho, mas também ser capaz de fazer música de verdade. O Audioslave era mais minimalista. Tudo girava em torno do groove, uma estética bem diferente do Soundgarden.

Olhando em retrospecto, qual sua opinião sobre a influência das bandas de Seattle - Nirvana, Pearl Jam - sobre o rock que veio depois?
Hmmm, isso depende do quanto eu quero pensar sobre o assunto (risos). Quando ouço rádio, consigo identificar o rock de Seattle em várias bandas. Tipo assim: “Hmm, acho que já fizeram isso antes”. É natural que jovens músicos se espelhem nas bandas que admiram. O que não é necessariamente uma coisa boa. Bandas como Creed e Nickelback fazem muito sucesso sugando o som das bandas de Seattle, mas no fundo elas não tem vitalidade alguma. Aconteceu antes, com grupos como Van Halen ou The Police. Eddie Van Halen e Andy Summers mudaram o jeito de se encarar a guitarra no rock, para o bem e para o mal. Veja o Led Zeppelin, por exemplo. Muitos dos grupos dos anos 80 e do começo dos 90 se inspiravam no Led, mas eles só enxergaram a postura e a imagem do grupo: os cabelos longos, a performance de palco…

Como se fosse apenas uma caricatura, um arquétipo de uma banda de rock…
Pouca gente parava para ouvir as canções, ou o trabalho de baixo e bateria que o Led tinha. Toda a influência pode se tornar uma má influência, basta que ela seja tirada de seu contexto original.

Você citou o Police. Sabia que eles vão fazer um show no Rio, alguns dias antes de sua apresentação?
Hum, não deve dar tempo para que eu consiga assistir ao show. Ah, eu gostaria de ser o quarto membro do Police (risos). Não sei se eles me aceitariam (risos). Acho que poderia dar certo, eu tocaria guitarra e faria as harmonias vocais com o Sting. Seria demais!