Entrevista com Canastra
por Marcelo Costa
maccosta@hotmail.com
04/04/2005

Lançado no segundo semestre de 2004, e apontado por muitos jornalistas com uma das revelações do ano, Traz a Pessoa Amada em 3 Dias, do quarteto carioca Canastra, exibe a busca de uma banda pela tão sonhada originalidade. "A inspiração maior é primeiramente tentar fazer uma música razoavelmente original", diz Renatinho, em entrevista. Traz a Pessoa Amada em 3 Dias é primeiro disco do Canastra, lançado pelo selo independente Monstro Discos. A banda foi formada em 2000, logo após o fim do Acabou La Tequila, banda anterior de Renatinho, e influência e inspiração confessas para o pessoal do Los Hermanos.

"Eu comecei a fazer umas músicas que não eram bem a cara do (Acabou La) Tequila", conta Renato Martins. "Ao mesmo tempo, essas músicas apresentavam uma unidade entre si. Percebi então que seria necessário montar uma banda para explorar melhor essas idéias", explica o músico, que formou o Canastra ao lado de Marcelo Callado (bateria), Bruno Levi (guitarra) e Edu Vilamaior (baixo acústico).

"Ficamos um tempo mais voltados para a formação do repertório e da identidade estética da banda, que na minha opnião é diferente de tudo que rola por aí. Em novembro de 2002 tocamos no Festival Goiana Noise e a partir daí as coisas começaram a efetivamente acontecer", resume.

O som da banda é uma mistura do dixieland, do country e do jazz de New Orleans com os sambinhas elegantes da MPB, contando ainda com country, rockabilly e surf music. Para Renatinho, daria para se resumir de forma bem simples: músicas do tempo da vovó. "Eu, particularmente, gosto de tudo que é tipo de música, mas me identifico mas com as canções mais antigas, tipo músicas do tempo da vovó. Não é culto a nostalgia. É que eu acho que elas são mais verdadeiras e menos comprometidas com o mercado", explica.

Essa paixão por "sons antigos" de maneira alguma faz do som do Canastra algo datado. Ao contrário. Traz a Pessoa Amada em 3 Dias mostra que é da mistura do antigo com o novo que surgem os melhores momentos da música brasileira na atualidade. Renato, por sua vez, garante que o som não é nada nostalgico. A idéia, segundo ele, é pegar coisas diferentes para fazer um som original. O disco abre com Diabo Apaixonado, cuja letra traz o diabo de joelhos por uma... mulher: introdução com baixo acústico, guitarrinha de desenho animado e letra esperta e divertida. Na seqüência, a banda fala sobre seu melhor amigo em Meu Cappucino: "Meu cappucino tem o gosto dos carinhos / Que meu amor não quer mais me dar", diz a letra, embalada por um bom arranjo de sopros. A arte gráfica, de Tita Nigri, é um show à parte, em um disco excelente.

Eu Te Disse é embalada por baixo acústico e bateria jazzistica em clima New Orleans ("Você entrou na dança, agora dance", canta Renato) enquanto Olhos Pra Mim é puro samba-canção do Rio de Janeiro dos anos 40 ("Se você quiser ficar comigo vai ter que ser assim / Eu quero uma mulher que só tenha olhos pra mim"). O passeio por ritmos diversos chega ao country, em Cada um por Si, de levada rápida e riffs certeiros para uma letra realista ("Fraternidade só existe em mensagens de cartão postal / Eu não queria que o mundo fosse assim / Infelizmente não depende só de mim"). O bom humor retorna na nonsense Chá com Sorrisos, com sotaque folk, e chega ao ápice na instrumental Xeque-Mate.

Dai em diante, o clima é de festa. "Sorte é uma questão de probabilidade", canta Renato na excelente Roleta Russa, uma das melhores músicas do disco. Sorria, a próxima, é uma parceria com o poeta Chacal ("Se você hoje descobriu que é um fracassado, sorria / Você será um faixa preta na arte de apanhar calado, sorria"). Nuvem Negra também se apoia no country enquanto Die Hillbilly, de Donida, do Matanza (o disco foi produzido por Jimmy, vocalista do Matanza, da sensacional Ela Roubou Meu Caminhão), é um rock sixtie delicioso com refrão grudento. "Sangue, eu quero sangue", diz a letra de Vingança, embalada por uma baladinha que disfarça o tema pesado. Para fechar, outra boa instrumental, Royal Straight Flush.

O Canastra esteve, recentemente, apresentando suas canções no festival Vivo Open Air, em SP. "Achei maravilhoso. Som bom, pessoas bonitas e inteligentes. Cervejinha no camarim. Parafraseando o grande gênio visionário Carlos Eduardo Miranda: Só alegria véio!", brinca o guitarrista, que também abriu o show do O Rappa, no Circo Voador, no Rio de Janeiro. "Qualquer show que apresente uma estrutura digna e que o público compareça é importante. Músico tem que tocar, fazer show. É o mais importante de tudo", acredita.

Para fechar, uma pergunta comum em se tratando de banda independente: Como está o cenário carioca para novas bandas? E no resto do País? "Cara, sempre me perguntam isso e a resposta que eu tenho é sempre a mesma: blá blá blá. Mas hoje eu vou responder diferente: Recentemente conheci uma garota muita bacana e estou apaixonado. E isso me faz ter forças pra vencer qualquer tipo de dificuldade. É isso que eu acho que falta no cenário no Rio ou no Brasil: Paixão", encerra, com muita propriedade, Renatinho.


Confira a integra da entrevista:

Quando surgiu o Canastra?
O Canastra começou 2000 quando a galera do (Acabou La) Tequila resolveu dar uma parada. Eu comecei a fazer umas músicas que não eram bem a cara do Tequila e, ao mesmo tempo, essas músicas apresentavam uma unidade entre si. Percebi então que seria necessário montar uma banda para explorar melhor essas "idéias". Ficamos um tempo mais voltados para a formação do repertório e da identidade estética da banda, que na minha opnião é diferente de tudo que rola por aí. Em novembro de 2002 tocamos no Goiana Noise e a partir daí as coisas começaram a efetivamente acontecer.

O que você julga de diferenças entre o Canastra e o Acabou La Tequila?
A diferença básica é que no Canastra você percebe nitidamente uma vertente, um norte que conduz o projeto a uma direção, ou seja, existe uma direção artística. No caso, em geral, começa por mim e vai somando com o resto da galera (Edu, Marcelo, Bruno). No Tequila não era totalmente caótico, mas um puta exercício de paciência e diplomacia. Todo mundo era compositor e arranjador do lance e não existia uma preocupação tão grande com o resultado final, e sim com essa administração entre vários "caciques".

Vocês tocaram em Sampa, no Vivo Open Air. O que você achou do show?
Achei maravilhoso: som bom, pessoas bonitas e inteligentes, cervejinha no camarim. Parafraseando o grande gênio visionário Carlos Eduardo Miranda: "Só alegria véio!!".

E os shows com o Los Hermanos? Isso ajuda a banda?
O Tequila foi quem abriu para o Los Hermanos. O Canastra, recentemente, abriu pro Rappa no Circo Voador e foi ótimo também. Qualquer show que apresente uma estrutura digna e que o público compareça é importante. Músico tem que tocar, fazer show. É o mais importante de tudo.

De onde vem a inspiração para o som da banda?
A inspiração maior é primeiramente tentar fazer uma música razoavelmente original. Algo que acrescente a vida das pessoas que vão ouvir. Eu, particularmente, que sou o principal compositor da banda, gosto de tudo que é tipo de música, mas me identifico mais com as cançoes mais antigas, tipo músicas do tempo da vovó. Não é culto a nostalgia. É que eu acho que elas são mais verdadeiras e menos comprometidas com o "mercado".

Fiz uma votação sobre os melhores de 2004 no S&Y, e o Gabriel Thomas votou em Meu Cappucino como melhor música do ano. Ele produziu o disco ou só gravou mesmo?
Gabriel começou a gravar o lance, mas nós perdemos o esquema no estúdio que ele descolou e o projeto foi engavetado. Ai surgiu o Jimy, do Matanza, e tocou o projeto adiante. Os dois foram fundamentais. Acho que sem a intervenção deles a banda teria acabado antes mesmo de começar. E até hoje os dois funcionam como uma espécie de conselheiros.

Como está o cenário carioca para novas bandas? E no resto do País?
Cara!!! Sempre me perguntam isso e a resposta que eu tenho é sempre a mesma: blá blá blá. Mas hoje vou responder diferente. Recentemente conheci uma garota muito bacana e estou apaixonado. E isso me faz ter força pra vencer qualquer tipo de dificuldade. É isso que eu acho que falta no cenário, no Rio ou no Brasil: "PAIXÃO!"

Links
Site Monstro Discos
Download de "Diabo Apaixonado" do Canastra