"Back To The Cat", Barry Adamson
Por Leonardo Vinhas
Operário Padrão
11/06/2008

Barry Adamson é o baixista da formação original dos Bad Seeds, para o qual migrou após sua saída do Magazine (o do Howard Devoto, anta, não o do Kid Vinil). Dispensou o papel de "negão de terno e topete" ao lado de Nick Cave e foi seguir carreira-solo. "Back to The Cat" é seu quarto disco, e é o melhor que já fez - o que não é pouco, levando em conta seu passado solista ou nas bandas citadas.

É grande a tentação de dizer que Adamson está fazendo o que Nick Cave deveria, mas isso seria também uma grande imprecisão. Enquanto Cave deixou o apuro musical que gerou obras do porte de "And No More Shall We Part" e "The Boatman's Call" para ficar brincando de combo garageiro, Adamson foi burilar seu senso de composição ao máximo, tal como seu ex-patrão fazia, mas sua área de atuação é mais... luminosa. Suas fontes estão nos cancioneiros dos anos 50 e 60, com um acenozinho ao funk trilha-sonora-de-blaxploitation dos 70. Dos tempos modernos, só as tecnologias de gravação, que permitem que o negão cuide de todos os instrumentos... sozinho.

Dos 50, Barry roubou diversos formatos de canção, desde o jazz midtempo (dê uma "olhada" na instrumental "Flight") até standards românticos, além da cara-de-pau dos crooners safados. Dos 60, soul da Stax, basicamente, cujo suingue abre as portas para as influências setentistas. Tudo se equilibra em uma única canção, a vívida "Civilization", e se encontra em dosagens parciais e bem-medidas ao longo das 10 faixas do disco. (Eu tinha escrita "enxutas 10 faixas" mas apaguei o adjetivo. Nada aqui é enxuto, há suor de desejo e/ou de ambientes enfumaçados, gotículas geladas de cerveja, ungüento de copo de destilados, quase-lágrimas de olhos marejados de alívio. Uma receita para um melodrama clichê ou mais uma tola fantasia outsider, é verdade, mas também a combinação para grandes canções).

"The Beaten Side of Town" engana com seu começo que remete aos Bad Seeds, pois em menos de um minuto você já tem a voz negra e quente de Barry entre sopros lânguidos dizendo "I woke up this morning from a crazy dream". O suingue dos fifties agita as duas faixas seguintes, para deixar o passeio cair no funkão "Shadow of Death Hotel", com solos de sax, hammond e guitarra passeando sobre o tema executado com força pelos metais. Os 70 ainda passeiam em "Walk On Fire" e dão um breve aceno no quase-jazz quase-vulgar de "Psycho Sexual", o encerramento do disco que, de certa forma, retoma sua abertura, ainda que numa temperatura um tanto mais... Ah, você já viu o nome da música, pra que falar mais?

Com essa sucessão de petardos, parece não sobrar espaço para um destaque maior, mas "Back to The Cat" ainda entrega dois: "People" e "I Could Love You". A primeira é linda, comovente, uma entrega aberta de quem se cansou dessa vida que está aí, mas não se cansou de viver, com uma pedal steel abrilhantando inusitadamente seu soul. A segunda é Otis Redding sucumbindo aos pecados da carne e da paixão, e... bom, se você escutar gente dizendo que esse é o disco da década só por causa dessa canção, não estranhe. É compreensível.

Já houve quem se apresasse ao ponto de ver em Adamson um Frank Sinatra para as próximas décadas, mas isso é pura ignorância musical. The Voice era um intérprete talentoso e com "boas" conexões (afinal, qual é o mal de ter amigos mafiosos que ameaçam e subornam executivos e programadores de radio?). Adamson é um grande compositor e intérprete, e parece estar mais preocupado com a qualidade de seus registros fonográficos do que com microfones de ouro. Além de ser versátil. Além de ter estilo. Além de... Alguém por favor ponha "Back to The Cat" para tocar de novo?

Site oficial: http://www.barryadamson.com
MySpace: http://www.myspace.com/barryadamson