Hardcristo de um ex-junkie
por Victor Hugo Lopes

Não dá para negar. Se a filosofia de vida de Rodolfo transmutou-se em algo novo, seu som continua o mesmo. Estreito traz ecos de praticamente todos os discos dos Raimundos. A nova opção até permite um trocadilho: "hardcristo". Mensagens 
positivas e reflexivas emolduram a porrada sonora. Na primeira audição, o trabalho parece um pouco indigesto. 

Olhos Abertos tem quebras harmônicas ao mesmo tempo em que os riffs se despejam pela música como trovões. A mudança é audível. Já tem clipe rodando na MTV e é a primeira faixa de trabalho. Traz termos como "condenação", "atitude prostituta", "caiu a máscara", "el shadai" e "sirvo ao meu rei" que resumem um pouco do novo Rodolfo. Não Lembro Mais é rápida, bem punk. Tem influências de hip hop no canto forte. O músico diz que canta o que vive. De Uma Vez Só tem pegada ramônica. Bubblegum pacas, tem potencial radiofônico. Para ouvir na praia, talvez seja uma das letras mais pessoais do CD. 

Ao Lado Do Sol é outra porrada, com pitadas do hardcore californiano. As primeiras músicas poderiam muito bem estar no disco Lapadas do Povo, o mais criticado -- e pesado -- dos Raimundos. Continuar de Pé é um ska praieiro com voz de 
macho. Dia Quente tem introdução ultra relax e melodia pop rock, tipo Everclear com Foo Figthers. A faixa-título despiroca na porradaria ultra-veloz. Como dizem, de um vômito só. Três Reis, com participação de Xis e Falcão (Rappa), é a melhor do disco. Ritmada, mostra a veia hip hop de Rodolfo sem ser pedante ou enfadonha. 

Quem Tem Coragem Não Mente é quase uma balada. Sabe o Rumbora? Pois então, veio dessa escola. "Se eu agi errado, me perdoa porque não quis", canta Rodolfo. Perde-se no esporro do resto do disco. Definitivamente, a voz do cara não 
fica legal em baladas. É cantor de rock, véio. Flautinha, violão, esses esquemas não rolam. Os críticos notariam uma veia gospel. Aí, Horário Nobre explode tudo e fode a melodia bonitinha. Vai entender... 

De uma forma geral, Estreito é um disco mediano. Tudo parece calculado, sem espontaneidade, como se Rodolfo quisesse evitar qualquer referência pejorativa aos ex-colegas de banda. Ainda não é o melhor trabalho do ex-Raimundos. As mensagens das letras dão um clima para cima, mas não salvam o disco da vala comum do rock brasileiro feito nos anos 90. O músico vai precisar de mais vitaminas para afastar definitivamente o passado e voltar a ser a grande referência que foi na última década. Não importa. Ao menos não faz apologia de drogas e violência. Ponto para ele.