Placebo: Remédio Inerte Ainda Agradará Mais
por Douglas Dickel
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Verbete: placebo
[Do lat.  placebo, 1ª pess. do sing. do fut. ind. de placere, 'agradar'.] S. m. Med.  Medicamento inerte ministrado com fins sugestivos ou morais, ou, ainda, em trabalhos de pesquisa, quando é dado a um grupo de pacientes que ignoram estar tomando o medicamento cuja ação se quer investigar.

Placebo é simples, não tem nada de mais. Mas agrada mais do que a maioria das bandas, inclusive aquelas que a imprensa londrina prega toda semana como a salvação do rock. O patrimônio do Placebo é constituído apenas de:

# Voz esquisita do Brian Molko.

# Um padrão diferente de afinação da guitarra e do baixo: F Bb Eb Ab C C. Entre em tablaturas no site oficial www.thebsh.com (Brick Shithouse), que tem tudo, tudo mesmo, sobre a banda.

# Arranjos simples com poucos riffs que repetem muito e a bateria bastante trabalhada por Steve Hewitt.

# Influência de Sonic Youth no ritmo das músicas e na levada da guitarra.

# O charme da androginia do Brian. A maioria, antes de saber que o guitarrista é menino, vê um clipe e acha ele uma menina bonita e atraente.

Com esse patrimônio a banda inglesa criou seu terceiro disco, feito para ser o fim de uma trilogia formada ainda por Placebo (1996) e Without you I'm nothing (1998). Black market music foi lançado em 9 de outubro de 2000 na Europa e só agora chega a América, claro, só a do Norte, com direito a dois bônus, Without you I'm nothing com participação de David Bowie e I Feel You, cover do Depeche Mode. 

 Nas primeiras duas semanas de loja o álbum ficou no Top 10 de Itália, Austrália, Noruega, Áustria, Reino Unido (3º), Alemanha (4º) e Finlândia n(3º) e no Top 20 de Portugal, Irlanda, Suíça e Suécia. Na Grécia e na França, ficou em 1º - coisa que os álbuns anteriores não haviam conseguido.

Segundo a crítica do NME.com, Black market music é um caso de ambição ofuscando o talento, de uma banda perdendo o rumo. Já o próprio trio se orgulha por ter lançado sua obra mais completa, que reúne tudo o que sempre quis fazer no passado. Inclusive com uma produção (de Paul Corkett) ao gosto da banda, já que o primeiro teve uma produção limitada e o segundo, exagerada.

A verdade é que o Placebo não se reinventou no segundo nem no terceiro disco, como ansiavam os jornalistas britânicos. Eu mesmo não gostei dos sucessores de Placebo nas primeiras audições. Mas o trio continua fazendo rock simples e agradável. Com mais peso que Iron Maiden, mais energia que Foo Fighters, mais melodia que Coldplay e mais sexo que Red Hot Chili Peppers.

"Este trabalho tem o lado punk, jovem e exuberante do Placebo encontrado no primeiro álbum e elementos de melancolia e de coração partido do segundo. Mas também tem um novo lado experimental, que nos ajuda a manter o interesse na música." Palavras de Brian Molko.

Quanto às músicas, a primeira assusta por iniciar com um riff idêntico  ao de Let there be more light, de um  Pink Floyd de 1968. Plágio, referência ou coincidência? Mandei um e-mail, mas eles ainda não respoderam. O Placebo já homenageou Syd Barrett, o fundador do Floyd. O single de 36 degrees contém uma versão afinada de Dark globe, do álbum solo do Syd, The madcap laughs(1970).

Taste in men e Days before you came são os hits. Black eyed tem seu MP3 já tocando na Unisinos FM. Haemoglobin tem um peso nervoso de impressionar. E o nome é muito bom.

Spite and malice é a pior música do disco pela participação absurda do rapper americano Justin Warfield. Passive agressive contém os mesmos vocais sonolentos de Lady of the flowers, do primeiro. Por outro lado, Blue american (cuja letra ironiza o estúpido modo de pensar norte-americano), Narcoleptic e Peeping Tom são lentas que apaixonam, assim como My sweet prince (sobre heroína), do segundo. Mas Black market blood já é um abuso, sendo a terceira calminha consecutiva. Ainda mais com um pianinho virtuoso à Mike Garson, o chato que toca com o David Bowie.

Commercial to Levi é uma brega declaração de amor fraterno ao roadie Levi, que salvou a vida do Brian certa vez. "Please don't die", ele pede. Special K e Slave to the wage são as medianas do disco. 

A mais pra cima do álbum acabou sendo relegada a b-side, Johnny & Mary, a música do Placebo que mais provoca sensação de otimismo. Será uma indicação do teor de uma nova trilogia?
 
 

"LONGEVIDADE É NOSSO MAIOR OBJETIVO"

Brian Molko nasceu na Bélgica e cresceu no Líbano, na Libéria e em Luxemburgo. Foi numa escola desse país do Benelux que ele conheceu o sueco Stefan Olsdal. Mas quando tinha 17 anos, foi para Londres estudar teatro.

Atuar foi sua primeira paixão. "Só não participo de mais filmes porque sempre querem que eu faça um músico, e eu quero fazer papéis diferentes", diz ele, sobre os convites que recebe hoje.  Enquanto Brian estudava interpretação, Stefan foi transferido para uma escola na Suécia.

Depois de um tempo eles se reencontraram por acaso nas ruas de Londres. Stefan tinha ido à Inglaterra para acompanhar os pais e estudar guitarra - que ainda usa para compor. Nessa época, Brian compunha e tocava de vez em quando com o baterista Steve Hewitt.

Juntos na mesma cidade, Brian e Stefan decidiram formar o Placebo. Steve, que tocava numa banda chamada Breed, só ajudou nas gravações das primeiras demos. Pelos compromissos com o Breed, ele teve que ser substituído por um sueco chamado Robert Schultzberg. Mas em 1996, Steve voltou e tornou-se membro permanente e a figura paterna do trio, por ser o único heterossexual. Brian é bissexual e Stefan é homo.

A estréia do Placebo nos palcos foi no Rock Garden de Londres, em janeiro de 1995. No mesmo ano aconteceu a estréia em disco, com o single de Bruise Pristine. Mas o sucesso veio no final daquele ano, quando o single de Come home atingiu o terceiro lugar da parada independente.

Então eles assinaram um contrato com a gravadora Hut, e David Bowie convidou-os para ser a banda de abertura em shows da sua turnê pela Europa. Era a primavera de 1996 no hemisfério norte.

Bruise pristine, Come home e Hang on to your IQ (cria das primeiras demos) ganharam nova versão para entrar em Placebo, o disco. O álbum foi lançado no verão e chegou a ser Disco de Ouro.

O single de Nancy boy foi lançado em janeiro de 1997 e entrou direto no quarto lugar da parada britânica. No mesmo mês, o trio tocou no Madison Square, em Nova York, junto com Sonic Youth, Lou Reed, Billy Corgan, Frank Black, Robert Smith e Foo Fighters. Eram os convidados para a festa de aniversário de 50 anos do Bowie.

Em 1997, o Placebo também abriu shows da Popmart do U2. Michael Stipe convidou a banda para atuar no filme Velvet goldmine, que ele produziu e lançou no outono europeu de 1998.

E então veio o novo single, Pure morning, em agosto de 1998. Logo veio também o segundo álbum, Without you I'm nothing, em outubro. Ele foi gravado numa atmosfera de crise de personalidade, insônia, coração partido e depressão pós-coito. Além disso, eles tiveram problemas pessoais com o produtor, que resultaram numa perda de controle das gravações. E então voltamos ao começo, Black market music. E depois, ir para onde, caro leitor?
 
 

PLACEBO, POR BRIAN MOLKO

« Minhas letras estão ficando cada vez menos como um diário, mas eu tento colocar nos personagens o máximo possível de mim. »

« Eu tento colocar o ouvinte dentro das emoções do personagem e mostrar o lado simpático da perversão, porque eu não acredito que tudo seja preto ou branco quando se trata de emoção humana. »

« Amor e drogas são as coisas em que as pessoas mais se viciam na vida. Elas têm as mesmas reações com ambos. Amor e drogas são um um grande travesseiro. Essa idéia do vício permeia nosso trabalho, seja com pessoas, emoções, substâncias ou situações. »

« Em 1998 eu simplesmente não me reconhecia nas entrevistas, no espelho, nas capas de revistas. Um lado extremo da minha personalidade que eu escolhi para mostrar estava ganhando vida própria. »

« Maior medo? Perder nossa espontaneidade. Queremos manter um desejo saudável de mudança e uma saudável desobediência com a fórmula. E não fazer auto-censura. Somos abertos. »

Douglas Dickel, 23, é editor do MusicZine e de sua versão e-pombo, o E-MusicZine ( e-musiczine-subscribe@egroups.com ). E o web-MusicZine em breve estará pronto ( www.musiczine.cjb.net )