A indústria do entretenimento sempre temeu a nova tecnologia
Da fita cassete ao Napster, o avanço da tecnologia sempre amedrontou a indústria do entretenimento
por Alexandre Petillo

Silêncio no tribunal. Pela porta entra Jack Valenti. Valenti é presidente da Motion Picture Association of América (a famosa MPAA) e está diante do Comitê Judiciário Americano. Depois de jurar dizer somente a verdade, ele inicia o seu testemunho.

– A crescente e perigosa invasão dessa nova tecnologia ameaça a vitalidade econômica de toda uma indústria e a sua nova segurança no futuro. Essa nova tecnologia é,  para o produtor americano de cinema e para o público americano, o que o estrangulador de Boston era para as mulheres desacompanhadas – declarou à Corte.

Napster? Gnutella? MP3.com? Não. Estamos em 1982 e Jack Valenti fala sobre o videocassete.
Quase vinte anos depois é possível dizer que o videocassete não fez com que os estúdios perdessem o controle de seus produtos por causa das gravações caseiras, e nem o público deixou de pagar ingresso para ir ao cinema.

É incrível que a declaração de Jack Valenti ainda ecoe a cada lançamento tecnológico. Resta saber até quando a ladainha vai se estender. Quando a fita cassete foi lançada, as grandes gravadoras ficaram apavoradas. O baixo preço do produto e a possibilidade de gravar qualquer disco sem qualquer controle soaram como uma sentença de morte para a indústria fonográfica. Em todos esses casos, processos judiciais se arrastaram.

Às portas do século 21, a tecnologia apronta mais uma para a indústria do entretenimento. O advento do MP3/Napster tem sido a grande pedra no sapato da indústria, que, sem aprender com os erros e derrotas do passado, recorre aos tribunais de Justiça. Adaptar é uma palavra que não existe no dicionário dos chefões do entretenimento. Em julho último, a juíza federal de São Francisco, Marylin H. Patel decretou a morte do Napster (programa que permite a troca indiscriminada de arquivos musicais). Dias depois uma instância superior adiou a execução.

Em agosto, um juiz de Nova York mandou fechar um web site que continha links para páginas que disponibilizam códigos para decodificação de DVDs. Mas o retrospecto em batalhas judiciais não é favorável a industria. A Justiça ainda não está preparada para resolver os litígios do século 21. Nem nos Estados Unidos e muitos menos em qualquer outro país do mundo, existe um código de leis adequado para lidar com os desenvolvimentos tecnológicos. Mesmo porque os legisladores não podem prever tais avanços. O próprio caso do videocassetecausou perplexidade aos doutores da lei, que ficaram sem ação ante os aspectos técnicos. Um dos juízes que apreciaram a demanda chegou a declarar que “os problemas criados pela interação entre a lei dos direitos autorais e uma nova tecnologia não encotrarão solução satisfatória enquanto o Legislativo não entrar em ação”.

Parece certo que qualquer tipo de aplicação legislativa ao caso Napster/MP3 será imperfeita. A única saída real será a indústria utilizar a lei pra moldar seu modelo tradicional de negócios à internet. Mal comparando, proibir o compartilhamento de arquivos musicais através do Napster, seria o mesmo que chegar em casa e se deparar com um engravatado confiscando suas fitas k-7. 

Adaptar-se a internet é fundamental para a sobrevivência no terceiro milênio. As gravadoras terão que levar em conta o Napster, o Gnutella e outros programas e sites que oferecem músicas grátis. E outros tantos que estão por vir. Somente os executivos do entrentenimento que ainda não enxergaram a internet como a principal nova vitrine para o lançamento de seus produtos.

É certo que revoluções proliferam-se do caos. E a internet é o caos tecnológico. Trata-se de um labirinto infindável de informações e sensações. Nesse admirável mundo novo, o Napster é o arauto da anarquia virtual, da confusão via modem. Ante a confusão entre o mundo virtual e os tribunais silenciosos, a previsão do jornalista André Forastieri faz cada vez mais sentido: "Quando o mundo enlouquece, só os loucos se dão bem”.