Marcelo
Nova ao vivo
Teatro do Sesi - SP
16/07/2002
por
Marcelo Costa
O
show era gratuito, no teatro do Sesi bem no meio da Avenida
Paulista, a São Paulo que não para, nunca. A apresentação
fazia parte do projeto "Acústicos, porém Elétricos"
em que a banda começa o show aos violões para,
logo depois, plugar as guitarras e fazer barulho.
Pensei.
Marcelo Nova está há um bom tempo sem lançar
disco, não está na mídia, então
não deve lotar os aproximadamente 500 lugares do teatro.
Assim, nem me credenciei como jornalista e fui como fã
de rock retirar meu convite na bilheteria uma hora antes do
show. Surpresa: tinha gente na fila desde às 14h (o show
estava marcado para às 20h) e os convites tinham esgotado.
Tristeza? Não. É legal saber que um cara como
Marcelo Nova, que tem muito a dizer, ainda esgota uma apresentação.
A organização do evento, vendo que muita gente
havia ficado de fora, decidiu colocar um telão na frente
do teatro. Valeu a ida.
Marcelo
Nova entrou no palco às 20h30 dizendo "teremos uma longa
noite de rock and roll" (às 22h10 ele ainda dizia: "agora
nós vamos começar o show"). Começou só
ao violão com a inédita Doce Anjo para,
em seguida, emendar com a polêmica Cocaína.
Logo na terceira música iniciou seus ataques geniais:
"Eu vou tocar uma do meu disco Blecaute. Antes de toda
essa moda de acústicos eu já tinha lançado
o meu. Fazer o que, eu estou à frente do meu tempo".
E mandou O Que Você Quer.
Velhas canções do Camisa de Vênus não
foram esquecidas. O Adventista, Hoje, Passatempo e uma
matadora versão de A Ferro E Fogo contagiaram
o público. Em Simca Chambord, Nova chamou ao palco
seu filho Drake, de 9 anos. O garoto, sentado em uma cadeira
com a guitarra no colo ao modo slide guitar, fez o solo da canção.
No final, recado de Nova para o filho. "Meu filho, espera mais
uns 5 anos que vai estar cheio de menininha te esperando ao
sair do palco". E para o público: "Não dá
para deixar todos com a Xuxa, né". A homenagem ao amigo/ídolo
Raul Seixas veio com a ainda atualíssima Pastor João
e a Igreja Invisível.
Mas
mais do que as músicas, o que mais emocionou e arrepiou
o público foi um longo improviso em formato blues de
uma música inédita ainda inacabada. De Quatro
em Quatro Anos (título dado por este jornalista)
fala do patriotismo que invade o coração dos brasileiros
durante a Copa do Mundo, na letra: "Tanta gente com a camisa
do Brasil, tanta gente feliz, mas eu não entendo, é
só de quatro em quatro anos". Prossegue: "Eu sou um idiota,
a economia está uma merda, eu estou desempregado, mas
quando eu vejo um gol eu esqueço tudo e fico feliz".
No longo improviso, narrações de fatos chocantes
como "o garoto de 18 anos que foi assassinado por estar usando
a camisa do time errado". Cortante.
Na
frente do teatro do Sesi, o vento frio castigava o público
que não arredava o pé do lugar mesmo com Marcelo
falando, perto do fim do show, que a noite estava apenas começando.
No entanto, na hora de ir embora para casa, mais que o vento
frio, o que castigava a mente era a presença do medo
de se viver em uma cidade violenta, a tristeza de um País
que não respeita seus cidadãos, de um povo que
se contenta em ser feliz só de quatro em quatro anos.
Só
por fazer as seiscentas pessoas que assistiram ao show refletir
sobre tudo isso, Marcelo Nova merece crédito, mas ele
não precisa, pois já tem 20 anos dedicados ao
rock and roll. A pena é que, neste exato momento, as
rádios estejam executando uma música de Sandy
& Júnior. Como diz uma velha canção,
"Não vai haver amor/ neste mundo nunca mais". Nunca mais.
E a culpa é nossa, caro leitor, a culpa é nossa...
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