BRMC - Black Rebel Motorcycle Club

por Marcelo Silva Costa
texto publicado originalmente na revista Rock Press #42
08/05/2002

Power trio é uma expressão famosa no rock and roll. São as bandas com apenas três integrantes (o básico guitarra/ baixo/ bateria com um dos três assumindo o vocal) em que a excelência da formação resulta num mix enxuto de crueza rocker.

A limitação do número de músicos quase sempre é compensada com técnica (caso do Jimi Hendrix Experience e do Cream) e barulho (Husker Dü e Nirvana). Pisando os dois territórios com sutileza impar, o rock recebe com aplausos Peter Hayes (guitarra e vocal), Robert Turner (baixo) e Nick Jago (bateria), também conhecidos como Black Rebel Motorcycle Club.

De São Francisco para o mundo, três garotos aumentam o volume das guitarras numa equação que une Jesus and Mary Chain com Spacamen 3, Nirvana com Spiritualized, Joy Division com Ride, rock and roll com psicodelia.

Tudo começou, só para variar um pouquinho, na universidade. Robert e Peter se encontraram, trocaram impressões sobre paixão rocker e começaram a compor um repertório de canções sobre a alcunha de "The Elements". Isso em 1998. Após uma sessão de O Selvagem, clássico das jaquetas de couro e das motocicletas com Marlon Brando, decidiram adotar o nome de Black Rebel Motorcycle Club (veja o filme, obrigatório, e você saberá muito mais sobre essa banda). O novo nome abria mais o leque de citações e paixões do duo.

Um guitarrista, um baixista, algumas canções e um nome. A finalização dessa lista pedia um baterista. E Nick Jago assumiu o cargo no segundo semestre de 1998.

Começaram a chamar a atenção com shows em vários botecos da região e logo prensaram 500 cópias de um cd demo, que esgotou rapidamente. No verão seguinte já estavam de contrato assinado com a subsidiária norte-americana da major Virgin Records, lar de gente como Mick Jagger, Lenny Kravitz e Gorillaz.

A responsabilidade pressionou a banda? Parece que não. O debute, BRMC, foi produzido por eles mesmos, liberdade total, o que reflete no encorpado som de guitarras no talo. A sonoridade revisita a Inglaterra da virada dos 80 para os 90. As letras remetem a Ian Curtis, poeta suicida do Joy Division. Não chegam ao fundo do poço joydivisiano, mas ficam por ali, lamentando o amor que queima por dentro (a excelente dobradinha de abertura, Love Burns/Red Eyes and Tears), a venda da alma para o sucesso fácil ("I fell in love with the sweet sensation/ I gave my heart to a simple chord/ I gave my soul to a new religion/ Whatever happened to you?" canta Peter na sensacional porrada Whatever Happened To My Rock'n'Roll?, que tem o carinhoso subtítulo de "Punk Song") até um lamento religioso que desafia Jesus a voltar a Terra ("Jesus seemed to steal my soul/ He’ll never let me go/ Jesus when you go will you come back home" cobra a usina de guitarras White Palms).

Dois dias antes do fim das gravações a banda já estava abrindo os shows do Dandy Warwols nos Estados Unidos, e em seguida, preparava uma excursão européia com Charlatans e Guided By Voices, já demarcando território para os famosos festivais de verão ingleses.

Uma boa pedida para saber o nível de interesse que cerca uma banda nova são os bootlegs e dois deles já circulam pelas melhores lojas brasileiras, já que o álbum, BRMC, que chegou as lojas do lado de cima do Equador em abril de 2001, ainda não tem previsão para ser lançado no Brasil. A capa de BRMC já diz muito sobre o produto. Alternando preto e branco, três jovens aparentemente desleixados posam para a eternidade na capa de um álbum de rock. E, por mais que pareça pouco, é só isso que eles querem. Nada de mudar o mundo, indicar caminhos, criar estilos. O negócio do Black Rebel Motorcycle Club é escrever canções e tocar. Num mundo onde tudo parece girar em torno de sucessos de massa, de exposições na mídia, de venda da alma a troco de nada, não deixa de ser reconfortante descobrir uma banda que quer apenas tocar. Mais um power trio para entrar para história? Só o tempo dirá. E o tempo está a favor de Robert, Peter e Nick. Caro leitor, aproveite.

Leia também:
Jesus and Mary Chain, por Ramon Antoniazzi
"Royal Albert Hall October 10 1997 Live, do Spiritualized", por Marcelo Negromonte

Links
Site Oficial do BRMC