Entrevista - Renata Barros
por Danilo Corci
Speculum
Fotos: Divulgação
08/11/2005

A artista Renata Barros completa vinte anos de uma carreira pontuada por muito sucesso. O resultado disso pode ser visto em livro recém-lançado pela Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, que faz um mapeamento completo do trabalho da artista e toda a suas idiossincracias. Com 240 páginas, o livro Renata Barros x 20 anos - O Corpo da Arte e seus Fragmentos conta um pouco da artista e da sua trajetória rica de propostas, de experimentos e de questionamentos, valorizando a pesquisa dos materiais e utilizando-os como ferramenta para renovação de sua expressão visual.

Renata Barros formou-se em artes plásticas na Faap em 1981 e também cursou filosofia na USP - SP. Em 1982 foi para Paris onde cursou civilizacão Francesa na Sorbone. Passou grande tempo na Alemanha, onde depurou sua arte. Sua obra é marcada pela construção de uma identidade e linguagem própria, que exigem mais do que contemplação.

Após lançar o livro em São Paulo e Porto Alegre, Renata Barros prepara-se para lançá-lo dia 29/11 em Paris e no dia 4/12 na Galerie Forumberlin am Meer, em Berlim. O S&Y aproveitou este momento de calmaria na vida da artista para um bate-papo via e-mail. As idéias de Renata você acompanha abaixo.

Vinte anos de carreira, tempo suficiente para fazer um balanço de sua trajetória. Como você avalia sua carreira, quais as mudanças significativas entre seu início e sua arte de hoje?
Sem dúvida a realizaçao do livro implicou numa avaliaçao do meu trabalho ao longo destes últimos vinte anos. No início o trabalho era mais narrativo e a partir do fim dos anos 80 vai se tornando mais sintético. Uma questao a ser ressaltada é que apesar da diversidade de propostas e materiais, encontro relevantes pontos em comum no desenvolvimento da minha obra. Este elo está vinculado a uma preocupação de buscar retratar sobre diversos ângulos a condiçao do homem, da alma, de sua sensibilidade e efemeridade, da vida e da morte. Enfim questões ligadas à filosofia e à psicologia me movem e comovem.

Você pode ser incluída na geração FAAP de artistas. Qual foi a grande contribuição destes artistas para a arte contemporânea nacional?
Nossa geração teve o privilégio de ter sido estimulada e orientada por um grupo de artistas dentre os quais Duchenes, Rafael, Julio Plaza, Regina Silveira, Donato e Guta. Nos permitimos retrabalhar, naquele momento, um meio então relegado a um segundo plano, a pintura figurativa, experimentando e ousando a partir de um suporte tradicional.

Alguns críticos definem seu trabalho como hermético porque exigem muito mais do que uma mera contemplação. Você concorda com esta definição?
Concordo. As questões que procuro expressar são fruto da minha própria reflexão. Realmente fujo da arte comtemplativa e busco provocar novas idéias e trazer propostas.

O crítico alemão Carl Friedrich Schröer afirma que sua arte flerta com a ilusão de óptica, ou seja, vão de inofensivos à agressivos, dependendo do ponto de vista. Esta dualidade é importante para você? Mais. O que a Alemanha trouxe de influências ao seu trabalho?
A Alemanha foi de absoluta importância para mim. Primeiro por ser um país frio no que diz respeito ao clima e aos relacionamentos, provocando em mim um isolamento e uma tremenda introspecção que raramente temos a oportunidade de vivenciar no Brasil por razões óbvias. Assim sendo trabalhei como nunca, intensamente. Por outro lado, tive a chance de conhecer um público muito sensível às experimentações que permitia uma pesquisa de materiais que sempre me interessou, além de dialogar sobre meu trabalho e sobre a arte em geral. Houve para mim na Alemanha uma rica troca.

Qual a importância da técnica no seu trabalho?
A técnica é importante na medida que me pemite expandir as possibilidades de expressão através dos meios utilizados e que pesquiso em cada momento . Então tanto o trabalho como a técnica se renovam. Estou sempre à procura de novos meios dando-lhes outro tratamento. A técnica então não existe isoladamente, é criada a partir do desenvolvimento de um novo trabalho, sendo requisitada para "solucionar" e permitir a realização da obra.

Sua série Cadeiras pode ser considerada o seu trabalho mais importante até hoje por ter sido o que te lançou no mercado?
Acho que a série Cadeiras foi importante na minha trajetória na medida que foi o início do processo de "limpar" o assunto, a cor, o desenho até a sua descontrução. Adicionalmente, esta foi a minha primeira individual , adquirindo uma importância de "batismo".

Seu interesse pelo corpo humano, em especial o seu próprio, é uma maneira de fazer um tributo ao próprio artista como um Narciso?
Não. Meu corpo é a minha maior e constante companhia e uma extensão da busca já mencionada de retratar os dilemas da condição humana a partir de um olhar para dentro de mim mesma. No atelier conto com êle nas minhas experimentações.

Instalações. Por que você acredita tanto neste formato?
Acredito em instalações como em outros suportes, mas, sem dúvida, me interesso pelo espaço como um todo de forma multidimensional. Acho também mais participativo e completo. Pode-se entrar na obra. Começei no fim dos anos 80 e início dos 90 fazendo instalações nas paredes com recortes em madeira. Fiz a exposição "Slices" no Masp com muitos objetos e recortes, na parede e no teto.

Como você enxerga a produção artística contemporânea no Brasil?
Considero o trabalho dos artistas brasileiros muito rico e criativo. O brasileiro explora linguagens e sabe realizar sua obra com limpeza, no bom sentido. O que falta é o Brasil levar seus artistas a sério.

Qual o rumo da arte de Renata Barros? Em que direção você pretende seguir agora que completa 20 anos de carreira?
Eu tambem me pergunto isso, mas acho que continuarei a experimentar novos meios e a revisitar os eternos meios como a pintura, desenho, etc. Por exemplo, hoje trabalho as mesmas sobreposições que fiz com madeira e vidro com a fotografia no acetato.

A arte contemporânea muitas vezes mergulha pesado no showbiz, nos espetáculos grandiosos. Esta não seria uma fórmula limitadora?
Claro que sim, desta maneira se perde o foco nas artes, criando-se espetáculos e eventos sem nenhuma sutilidade e profundidade . Para mim é frustrante.

Por fim, existe alguma maneira de tornar as artes plásticas num formato mais popular ou devemos caminhar rumo à erudição absoluta dos trabalhos?
Arte é sempre uma antena, se descobre e se questiona trazendo e propondo algo novo. Por isso é claro que a proximidade com o grande público só tem a acrescentar. Existem duas vias para que isso ocorra: a educação ser mais priorizada e a criação de espaços públicos, para que a arte seja desmistificada dos museus e se aproxime mais do público em geral.

Entrevista cedida pelo site Speculum

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