Televisão: 3º Festival Internacional de Televisão
Entrevista com Marcelo Tas
por André Azenha
Blog
Fotos: Paulo Freitas
08/12/2007

"Quando há a opção de poder escolher entre 2600 canais de televisão não há sentido em ver 'Duas Caras'". A frase, carregada de ironia e razão foi dita por Nelson Hoineff, presidente do IETV, o Instituto de Estudos de Televisão, instituição que promove eventos para debater novos caminhos para a cultura televisiva. E foi em um desses eventos que Nelson, junto com Marcelo Tas, abriu a terceira edição do Festival Internacional de Televisão, num debate ocorrido no auditório da CPFL em Santos, litoral paulista.

O festival é considerado uma dos cinco melhores do mundo no gênero e proporcionou aos santistas uma pequena, mas importante, mostra do que rola na telinha mundo afora. O tema do debate foi "Novas Mídias e a democratização do conhecimento no mundo contemporâneo", mas obviamente a tão comentada TV digital não ficou de fora da conversa. Hoineff e Tas são adeptos da democratização da TV, e nesse sentido, a web TV desempenha papel importante. O presidente do IETV não cansou de falar das qualidades que a televisão via computador ou celular pode proporcionar ao público e Tas seguiu pelo mesmo caminho. Sobre o futuro da TV, Nelson apontou duas direções: a digitalização e a diversificação. Transmitidos via internet, os programas televisivos tendem a perder em alta definição, porém o expectador ganha um maior leque de opções e não precisa, no caso da alta definição, comprar um conversor ou uma TV de plasma.

Claro que, para qualquer uma das opções, é preciso grana, muita grana, e grande parte da população ficará excluída dessa "nova era", ao menos por alguns anos. Mas Tas, que atualmente apresenta um programa na TV UOL, argumenta: "Eu acho que o problema econômico não é da televisão, é um problema do Brasil. E também tem o lance que vai caindo de preço, como tudo sempre foi. Antes o telefone celular custava quase três mil dólares, agora é quase de graça, às vezes é de graça, o cara te dá um telefone pra você gastar na conta. Então esse problema não tem nada a ver com TV digital", diz ele, para logo em seguida apontar um problema maior da TV digital no Brasil, a concessão dos canais.

Marcado para começar às 18h, o debate sofreu um atraso de 45 minutos, e aproveitando o tempo de espera para que as pessoas chegassem ao local, batemos um papo com o jornalista Marcelo Tas. criador de programas inovadores da televisão brasileira como "Castelo Rá-Tim-Bum" e "Vitrine" na TV Cultura. Ele já trabalhou tanto na TV aberta como na TV a cabo, e atualmente possui um site e um blog na internet. Tas comentou a importância do festival, as diferenças entre apresentar um programa na web e num canal convencional, sua trajetória para chegar ao UOL, projetos para a televisão e principalmente, sua indignação com o ministro das comunicações Hélio Costa e a concessão dos canais digitais. A seguir, o papo completo.

Qual a importância do festival?
É maravilhoso. Quem faz televisão está muito acostumado a falar sozinho, com uma lente de câmera. E agora que estou navegando mais nessas águas da tecnologia digital, da internet, é muito legal estar em contato ao vivo com pessoas que eu converso pela internet o tempo todo. Muita gente aqui de Santos vive freqüentando o blog e tal. E desde ontem eu falei que estava vindo aqui. Nossa conversa começou faz tempo. E hoje é quase que a concretização de uma conversa que continuou o tempo todo, que é o que acontece hoje com a minha vida que está muito emersa na rede.

O senhor já trabalhou em TV aberta e TV paga. Agora está numa web TV. Quais as vantagens e desvantagens de trabalhar numa web TV, com relação a alcance, a audiência, etc?
Olha, a diferença principal é que na TV aberta você basicamente só fala o tempo inteiro e as pessoas ficam te ouvindo. Na TV UOL eu ouço o tempo inteiro a opinião das pessoas sobre o que eu estou fazendo. Outra diferença importante é a questão da audiência. Quando eu fazia televisão, eu estava em contato com uma audiência muito grande, em rede nacional. Hoje, a audiência que tem na internet, no UOL especialmente, não tem nenhuma diferença quantitativa com a audiência de televisão. Na home do UOL, todos os dias, passam cinco milhões de brasileiros, que é uma audiência estúpida até pra uma emissora de televisão. Então, tem a coisa da quantidade, com a diferença de que a pessoa que chega até onde estou lá no UOL, chega até mim, quer dizer, ela sabe porque foi clicando até chegar naquele lugar. Enquanto que na televisão tem um monte de gente que te vê de susto, que estava zapeando, vendo um programa e te pegou no meio, o cara é um consumidor mais desatento, enquanto que o da internet sabe onde está indo e é muito mais crítico.

Como você foi parar na TV UOL?
(Quando eu estava) lá na TV Cultura, lá atrás, em 1998, eu fui convidado pra fazer o Vitrine e eu sugeri da gente usar um blog no programa pra gente interagir com os telespectadores. Naquela época, (o universo online) era muito pouco conhecido, o pessoal achou que podia ser algo meio elitista, mas explodiu, o Vitrine virou um programa referência nessa questão das novas mídias e está assim até hoje. Eu ainda não tinha botado meu pezinho na internet, tinha feito todo o blog do Vitrine, tinha participado da criação do site da Cultura, e aí realmente resolvi fazer meu site em 2003, e o UOL convidou para entrar no time. Comecei timidamente, com um blog, um site pessoal e aí fui ficando e agora eles querem que eu entre cada vez mais. Comecei a produzir televisão e agora eles querem que eu fique morando lá e eu estou adorando essa experiência, estou achando o máximo. Hoje o meu principal contrato de trabalho é com internet, com o UOL.

Há algum projeto de trabalho para 2008 de voltar para a televisão?
Olha, tem algumas coisas pra TV. Tem um projeto que estamos desenvolvendo com a ESPN Brasil e tem outras coisas que nós estamos desenvolvendo e ainda não escolhemos, não fechamos um parceiro.

Do que se trata esse projeto na ESPN Brasil?
Na ESPN Brasil eles vão começar a veicular uma série de vinhetas - que eu criei pra eles já há algum tempo - chamada Professor Planeta, que é um cientista que explica os esportes. Eles vão inclusive colocar no canal deles na internet, que está sendo inaugurado agora em dezembro, um canal muito bacana chamado ESPN 360, que já tem nos Estados Unidos, que é TV de alta definição na internet e estamos discutindo alguns projetos pro ano que vem com a ESPN.

Falando em alta definição, tem se falado muito na chegada da TV digital ao país. Mas as pessoas mais desfavorecidas não terão acesso por enquanto a essa nova tecnologia. O que você acha dessa “nova era” televisiva?
A importância dessa nova era é que a TV digital é uma ferramenta que possibilita a TV chegar até todos nós em locais que antes ela não chegava. Então, se você passa uma hora do seu dia num transporte público, num ônibus, você vai poder ter televisão com qualidade com você naquele ônibus, assistir televisão num aparelho celular ou outro tipo de aparelho. A outra coisa bacana é que ela amplia os canais, quer dizer, ela gera mais pistas pra você veicular conteúdo. Então você pode estar usando isso pra educação, entretenimento - você está ampliando a voz da televisão. Esse é o lado bacana. O lado desfavorável, além do problema econômico... Eu acho que o problema econômico não é da televisão, é um problema do Brasil. E também tem o lance que vai caindo de preço, como tudo sempre foi. Antes o telefone celular custava quase três mil dólares, agora é quase de graça, às vezes é de graça. O cara te dá um telefone pra você gastar na conta. Então esse problema não tem nada a ver com TV digital. Agora, tem um problema grande quanto à lei da TV digital, que do jeito que ela foi feita pelo ministro Hélio Costa, ela reforçou as concessões, a maioria das concessões de televisão no Brasil, que foram dadas de maneira política. Então ela reforçou currais eleitorais, senadores donos de emissoras. Está aí o nosso querido Renan Calheiros, que tinha um canal, uma rádio, não sei o que, enfim. Os políticos sempre foram os coronéis eletrônicos do Brasil. Por isso que eles se reelegem, por isso que figuras execráveis continuam se elegendo. Porque ele (o político) é dono da emissora, ele faz a cabeça de um estado inteiro e se elege. A TV digital reforçou esse modelo. Ao invés de se pensar num novo modelo de concessão desses oito canais que tem agora dentro de cada canal, ele simplesmente multiplicou por oito o poder desses coronéis eletrônicos. Que é o caso do Sarney no Maranhão, do Jader Barbalho no Pará. Uma série de políticos. Aliás, é quase a maioria deles. São donos de verdadeiros latifúndios... Isso é no Brasil inteiro. Isso é uma deformação criada no governo Sarney, que agora um governo democrático como o atual poderia mudar e dar pelo menos um passinho à frente. Não, o ministro Hélio Costa reforçou uma política retrógrada que todos nós devemos abominar com esta implantação da TV digital sem nenhuma discussão com a sociedade.