"Crimes de Guerra: Culpa e Negação no Século XX",
de Omar Bartov, Atina Grossmann e Mary Nolan
por Danilo Corci
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13/03/2006

Até que ponto as sociedades modernas estão realmente preparadas para assumirem suas culpas? Como as sociedades recordam, ou esquecem, as atrocidades em tempos de guerra? Este é o mote para o oportuno livro Crimes de Guerra: Culpa e Negação no Século XX, de Omar Bartov, Atina Grossmann e Mary Nolan (Bertrand Brasil, 376 págs, R$ 49, em média). Através de uma série de ensaios, focados, em sua maior parte, na Segunda Grande Guerra, o livro expõe as mazelas provenientes da população diante das carnificinas e também a complacência idílica dos vencedores.

Após o término do Terceiro Reich, o célebre Tribunal de Nuremberg partiu para cima dos mais famigerados figurões de alto-escalão de Hitler. Mas e a Werhmacht? E o povo alemão? Nascido de uma polêmica exposição fotográfica na Alemanha, que acabou sendo fechada diante de tanta repercussão negativa, o livro retrata em detalhes escabrosos a participação de soldados comuns nos massacres de judeus, russos, ciganos e tudo mais o que viria pela frente. Seriam estes soldados tão inocentes assim, cumprindo ordens, em um evidenciado anúncio de extermínio completo?

Pontualmente, Crimes de Guerra lança luz sobre este período negro da Alemanha e coloca em xeque o lugar-comum sobre responsabilidades. Um extenso arquivo fotográfico foi recolhido através de correspondências particulares que os soldados no front enviavam às suas famílias e os mesmos deram origem à exposição e mais tarde ao livro, um resumo das conferências realizadas no lugar da mostra.

A espinhosa pergunta sobre responsabilidade fica então complexa, pois há evidências claras que a responsabilidade era extensiva a todos e não somente às custas de um fanatismo cego e ingênuo. O detalhamento da vingança ucraniana contra os judeus, incentivados por soldados alemães, mostra que por debaixo deste tapete há muita sujeira, sujeira esta que os Estados Unidos ajudaram a esconder em seu plano de contensão da expansão comunista na Europa. Mais valia um inimigo derrotado ao seu lado, do que a expiação completa de terrores brutais.

O livro também não poupa as mulheres alemãs, tidas como não participantes efetivas da guerra. Há extensos relatos de sua participação voluntária e orgulhosa no Holocausto e nas sangrentas batalhas no front Leste. Há, também, uma interessante abordagem sobre como a fotografia serviu aos propósitos do Führer e como elas, ainda hoje, servem à idéia de desmistificar culpas.

Crimes de Guerra é um livro inquietante nos dias atuais. Não só porque apresenta um novo olhar sobre responsabilidades em combate, mas justamente por servir como uma cruel ferramenta de atualização. Ou você ainda acha que depois de Abu Ghraib a responsabilidade é somente de George W. Bush? Ao ler a obra, não estranhe ser acometido pela desconfortável sensação déjà-vu ao ver os noticiários. Mais uma vez, a história parece se repetir...


Texto cedido pelo site Speculum