"A Passagem"
por Drex Alvarez
Blog
09/01/2006

A Passagem (Stay) é mais um entre as dezenas de filmes hollywoodianos que trazem uma história mirabolante sobre as questões da vida, da morte e de outros estados, digamos assim, mais etéreos. Onde essa onda começou afinal? É claro que estes são temas que atormentam o ser humano há milênios, mas, é impossível negar, o cinema americano tem estado obcecado demais por eles na última década. Ao assistir A Passagem fica difícil não trazer à mente Sexto Sentido, do indiano M. Night Shyamalan. No entanto, não se deve esperar as mesmas respostas, ou achar que o final do filme está entregue nessa referência. Apesar do gostinho de dejà vu, A Passagem também guarda suas surpresas.

A trama do longa começa bastante normal. Ewan McGregor é um psiquiatra que ganha "de presente" um jovem paciente, suicida e fujão, interpretado por Ryan Gosling. A atual noiva de King Kong, Naomi Watts, de novo perturbadoramente bela, é a esposa de McGregor. Também ela possui um toque maníaco-depressivo em seu passado e, de alguma forma, vai ajudar seu amado esposo-psiquiatra a impedir que seu paciente-problema chegue às vias de fato.

Como era de se esperar, as coisas não se revelam tão simples. No início, surgem alguns lampejos de premonições feitos pelo jovem suicida. Aos poucos, para desespero do psiquiatra, toda a realidade vai literalmente se desconstruindo. O diretor Marc Forester, festejado ano passado por seu singelo Em Busca da Terra do Nunca, demonstra ótima versatilidade e consegue explorar muito bem a angústia de ambos, médico e paciente, criando uma atmosfera de suspense bastante envolvente.

A questão problemática, porém, é que em determinado ponto perde-se completamente a noção do que afinal poderia estar acontecendo dentro da história. Apesar das soluções de edição bastante criativas, a desconstrução chega a tal nível que começa a dar sinais de incoerência e confusão. Há os que vão se refastelar nesses momentos de viagem subjetiva. Aqueles que não tiverem muita paciência, porém, podem se entediar com o excesso de possibilidades.

Surpreendentemente, as peças se encaixam no final numa solução interessante e até coerente. De toda maneira, ao término da sessão, recomenda-se uma ida ao café mais próximo a fim de dedicar uma boa meia-hora de bate-papo para entender tudo que se passou no filme. Essa é, na verdade, a melhor parte de A Passagem - ele transforma-se então em mais um daqueles filmes que se tornam mais interessantes após do que durante a projeção.

Um último comentário. Mais uma vez a tradução do título para o português provoca expectativas que nada tem a ver com filme. Lembro disso ter acontecido também com Corpo Fechado, mais um filme de M. Night Shyamalan. Unbreakable, seu nome original, é uma referência muito mais adequada a uma história de super-heróis do que a solução mística-espiritual arranjada em português. Deixem de lado a tal A Passagem e fiquem com o título original: Stay. Isso pode ajudar na hora de decifrar o final. Fica a dica.


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