"Homem de Ferro"
por
André Azenha Blog
01/05/2008
Graças a um trailer matador, ao som de Iron Man, do Black Sabbath, e respaldo positivo do público na última Comic-Con, Homem de Ferro surgiu com a melhor das expectativas para abrir uma temporada de blockbusters que terá ainda os novos Indiana Jones e As Crônicas de Nármia, Speed Racer e Batman – O Cavaleiro das Trevas. O marketing espontâneo foi tão forte que o público-alvo já parecia convencido de que Robert Downey Jr realmente era Tony Stark, o industrial milionário, fabricante de armas, playboy e alcoólatra, que os leitores de quadrinhos admiram como Homem de Ferro.
Downey, que concorreu ao Oscar ao viver Charles Chaplin numa produção premiada de 1992, foi uma definição polêmica por seu passado tumultuado. O ator foi preso diversas vezes por estar sob efeito de drogas, internado em três clínicas de reabilitação e chegou a passar um ano inteiro na cadeia na virada do milênio. Sóbrio e disposto a dar a volta por cima, ele vem de uma série de filmes aprovados pela crítica (Zodíaco, Santos e Demônios, Beijos e Tiros e A Pele), mas ninguém havia ainda se arriscado a colocá-lo à frente de uma superprodução.
A escolha sabiamente foi bancada pelo diretor John Favreay, ele próprio uma escalação inusitada para esse tipo de filme e igualmente bem sucedido na empreitada. Favreau é mais conhecido como ator. Os fãs de super-heróis podem lembrá-lo como “Foggy” Nelson, o melhor amigo de Matt Murdock em O Demolidor (2003). Como diretor, assinou três filmes, todos comédias e apenas um com ênfase em efeitos especiais – Zathura – Uma Aventura Espacial (2005). Homem de Ferro é uma produção que mudou o destino dos dois envolvidos: Favreau provou ser capaz de se dar bem com um grande orçamento e Downey se mostrou um astro sério, cujo tom irônico casou perfeitamente com a natureza do personagem.
Mas, antes de tudo, HF é o filme que faz a divisão cinematográfica da Marvel Comics se revelar competente ao transpor para a telona um personagem seu – até então, a editora de gibis vendia os direitos de seus heróis para outros estúdios. Desta vez, todos os gastos correram por conta da Marvel, deixando a Paramount Pictures apenas como parceira na distribuição. A aposta da Marvel na visão de Favreau , ecoou ironicamente, o perfil “alternativo” da direção de Christopher Nolan em Batman Begins, franquia de sua maior rival nos quadrinhos, a DC Comics. A idéia do diretor em criar uma superprodução que não perdesse sua essência artística foi assumidamente inspirada no filme de Nolan.
E para sair bem sucedida, convocou um elenco excepcional: além de Downey, tem Gwyneth Paltrow pela primeira vez num filme de ação. A atriz, que costuma se identificar com dramas e comédias, optou por Homem de Ferro “pelos nomes envolvidos”. Vencedora do Oscar de Melhor Atriz por sua atuação em Shakespeare Apaixonado (1998), a esposa de Chris Martin, vocalista da banda Coldplay (com quem teve os filhos Apple e Moses), tinha se afastado do cinema para ser “mãe” e, para surpresa geral, escolheu voltar à ativa numa adaptação dos quadrinhos.
Quem também ficou empolgado com a chance de contracenar com Robert Downey Jr. foi Terrence Howard, outro intérprete de peso, indicado ao Oscar de Melhor Ator por Ritmo de um Sonho (2005). Em Homem de Ferro, ele vive um dos melhores amigos de Tony Stark, o piloto James Rhodes, militar de alta graduação e aviador. Para viver o vilão foi escalado Jeff Bridges, astro de O Grande Lebowski (1998) e O Pescador de Ilusões (1991), entre inúmeros filmes. “The Dude” vive o industrial Obadiah Stane, grande rival de Stark, que no filme está por trás de sua prisão no Oriente Médio.
No início, curiosamente, Favreau admitiu preferir atores desconhecidos do grande público, como aconteceu com Brandon Routh em Superman – O Retorno (2006). Porém, ele acabou se rendendo ao talento de Robert Downey Jr. e, quando se deu conta, estava com um supertime em campo. Fora o elenco, contratado para uma trilogia, Homem de Ferro tem como destaque efeitos convincentes, seqüências de tirar o fôlego, armamento pesado, uma trilha sonora em volume máximo e uma mescla de aventura e drama.
Criado por Stan Lee e os desenhistas Jack Kirby e Don Heck, o Homem de Ferro apareceu pela primeira vez na edição 30 da revista Tales of Suspense, em 1963. No enredo original, Tony Stark desenvolveu o protótipo da armadura após ser capturado por inimigos durante a guerra do Vietnã. Era basicamente um herói anticomunista, que combatia ameaças soviéticas (Viúva Negra, Dínamo Escarlate, Homem de Titânio) e comandava a indústria armamentista, em favor da defesa nacional dos EUA. Mas, com o tempo, o personagem se tornou mais complexo, mostrando um lado vulnerável, principalmente em histórias sobre sua luta contra o alcoolismo e o aparecimento de um complexo de culpa pela destruição causada por seus negócios. Nos quadrinhos, o Homem de Ferro se tornou um dos maiores símbolos da inventividade e dos defeitos da humanidade.
No filme, ele não surge como mais um herói simpático para fazer a alegria da garotada, não é altruísta como o Superman, muito pelo contrário. É um sujeito vaidoso e mulherengo. Sua personalidade controvertida não tem nada a ver com adaptações anteriores de heróis da Marvel, como Homem-Aranha ou Quarteto Fantástico. Muito pelo contrário, é um sujeito linha dura, ainda que salte à tela um pouco de bom humor e ironia.
O roteiro escrito por Art Marcum, Matt Holloway, Mark Fergus e Hawk Otsby aposta acertadamente em dar uma trajetória “real” para a criação do herói. Sim, o filme é uma história de origem e apresenta Tony Stark (Downey Jr.) como um jovem inventor que dirige uma milionária fábrica de armas para as Forças Armadas. Ao visitar o Iraque, ele é preso por inimigos numa emboscada. Durante a captura, fragmentos metálicos de uma explosão atingem seu peito e chegam ao coração. Sua vida é salva por um cientista, também prisioneiro dos iraquianos, que usa uma bateria de carro para criar um aparelho que mantém o coração de Stark funcionando.
No cativeiro, os dois são coagidos a criar uma arma de destruição em massa. Aproveitando-se da chance, criam uma armadura especial para fugir, mas o inventor se sacrifica por Tony, que é resgatado. De volta a Nova York, Stark reencontra com sua secretária e interesse romântico, Virgínia “Pepper” Potts (Paltrow), e precisa enfrentar perguntas de uma repórter (Leslie Bibb) que o considera um mercador da morte. O grande vilão é o executivo Obadiah Stane (Bridges), rival industrial de Stark, que deu coordenadas e informações para que os iraquianos tivessem êxito no seqüestro. Ao ver Tony ter sucesso na criação de uma nova e avançada armadura de ferro (chamada Mark III), Stane decide criar uma armadura para si próprio, uma máquina de matar, conhecida nas HQs como Monge de Ferro.
Os mais atentos ainda poderão perceber figurações do diretor Jon Favreau, que aparece em cena como guarda-costas de Stark e pequenas referências que apenas os fãs de quadrinhos irão perceber: como o possível surgimento do Máquina da Morte em possíveis produções futuras, e a criação da agência SHIELD. E, para manter a tradição, quem também faz uma rápida participação é o criador do personagem, Stan Lee. Também foi bastante comentada a participação de Hillary Swank e Samuel L. Jackson como Nick Fury, o que acabou não acontecendo. No caso do ator, a cena pode ter ficado para o próximo filme da franquia, que também deverá abordar com mais força o alcoolismo do herói.
Homem de Ferro entra para a lista das boas adaptações dos quadrinhos,
que inclui o primeiro Superman de duas décadas atrás, os dois
primeiros Homem-Aranha, a trilogia X-Men e Batman Begins. Não
é uma obra perfeita, pois o roteiro possui pequenos escorregões
como frases óbvias que poderiam ser evitadas. Mas os efeitos
visuais são excelentes, as cenas de ação bem conduzidas e Downey
Jr. é um ator “de verdade”, que dá credibilidade à trama. Os
fãs dos heróis da Marvel com certeza podem comemorar. X-Men
Origins – Wolverine (que não é produzido pela Marvel Studios)
está previsto para estrear em maio de 2009. E a empresa já prepara
filmes do Capitão América, Nick Fury, Doutor Estranho e Homem
Formiga, entre outros. A expectativa é que agora, com a chancela
da própria Marvel, essas produções sejam dignas dos gibis. E
Homem de Ferro foi o primeiro a enfrentar o teste e se saiu
muito bem. Fica a torcida para que a produção vá bem nas bilheterias
e a trilogia realmente aconteça.
|