"Colateral" - "O Terminal"
por Jonas Lopes
Fotos - Divulgação
Yer Blues
01/03/2005

Mesmo os cinéfilos mais radicais hão de concordar comigo. Existem momentos em que não há nada mais adequado do que um filme abobrinha. Claro que é sempre maravilhoso assistir a filmes de Bergman, Truffaut e Kurosawa, mas filmes leves fazem bem pra alma e pra cabeça. E os filmes abobrinhas não constituem, necessariamente, um gênero menor - aí estão as deliciosas, sagazes e inteligentes screwball comedies de Billy Wilder, Ernst Lubitsch e Frank Capra para ratificar isso. Pura abobrinha, e de qualidade; há uma enorme distância entre American Pie e Quanto Mais Quente Melhor. O Terminal e Colateral, recém-lançados em dvd, são exemplos de filmes abobrinhas, cada um à sua maneira.

Não dá pra falar de filme abobrinha sem falar de Steven Spielberg. O diretor praticamente inventou o termo blockbuster, os sucessos de verão, as bilheterias que ultrapassam cem milhões de dólares. Ele pode até ser criticado por várias coisas, mas é inegável que Tubarão, a trilogia Indiana Jones, Contatos Imediatos de Terceiro Grau e E.T. sejam filmes-pipoca de qualidade invejável. O problema de Spielberg é que ele dá sinais de estar chafurdando cada vez mais na auto-indulgência. Parece trabalhar no piloto automático às vezes, fazendo um filme atrás do outro, apenas por fazer. Quando relaxa, normalmente acerta.

O Terminal segue a linha despretensiosa do anterior Prenda-me Se For Capaz. Interessante ver que Spielberg ainda funciona em filmes mais espontâneos, sem o tom épico da maioria de seus trabalhos. Na história, Viktor Navorski (Tom Hanks) é um imigrante da Krakozhia que acaba preso no aeroporto de Nova York por problemas burocráticos e uma fresta na lei. E ali ele passa meses, dividindo-se entre aprender a falar inglês, conseguir a próxima refeição e até ajudar um funcionário a conquistar uma guarda.

A trama (baseada em uma história real) é curiosa. O personagem, uma mistura de Forrest Gump com aquele jardineiro interpretado pelo Peter Sellers em Muito Além do Jardim, é cativante até a alma. Mas o filme não é tão bom quanto Prenda-me Se For Capaz. O roteiro é inconsistente, e se esvai durante o filme. A questão prisão/paranóia/personagem-alienado foi explorada com mais perspicácia em Show de Truman. E O Terminal ainda sofre de outro pecado que acomete alguns filmes de Spielberg: os finais pouco inspirados. Não é a primeira vez que isso acontece, visto que Império do Sol, Inteligência Artificial, Minority Report e O Resgate do Soldado Ryan também sofrem desse mal. No afã de dar um final feliz, o diretor compromete os desfechos de seus filmes. Nada contra finais felizes, só que Capra nunca precisou sacrificar um roteiro para conseguir um. Ainda assim, é um filme divertido, que merece ser assistido pela despretensão.

Michael Mann, em seu Colateral, explora outra área, a dos thrillers abobrinha, que consta com filmes recentes como Los Angeles - Cidade Proibida, Seven, Onze Homens e um Segredo, O Pagamento Final e a dupla Identidade e Supremacia Bourne. Histórias policiais grandiosas, maniqueístas e, que se bem trabalhadas (o que nem sempre acontece, infelizmente), resultam em grandes filmes. Michael Mann já provou sua competência nesse gênero com o sensacional Fogo Contra Fogo (o esperado duelo dos astros de uma geração, Al Pacino e Robert De Niro). Depois de Fogo Contra Fogo, Mann fez dois filmes baseados em histórias reais - o bacana O Informante e o mediano Ali -, e volta, ao mesmo tempo, à ficção e ao gênero policial com Colateral.

Antes de qualquer outra coisa, Colateral é um senhor retrato de Los Angeles. A cada brecha, Mann dá um jeito de homenagear a cidade, através da bela fotografia noturna, takes aéreos e do roteiro, uma aula de geografia local. O roteiro, aliás, é simples e bem amarrado, e tem algo de noir moderno. E como convém a um filme do estilo, o ritmo se mantém constante durante as duas horas. Vincent (Tom Cruise, em seu primeiro papel como vilão) é um matador profissional, e acaba de chegar à cidade para matar cinco homens. Pega o táxi do sonhador e workaholic Max (Jamie Foxx), que por um pequeno acidente descobre as nada nobres intenções do cliente, e acaba rendido e obrigado a carregar Vincent pela cidade.

Jamie Foxx rouba a cena o filme todo, ajudado pela burocrática atuação de Tom Cruise. Se nunca atrapalha, Cruise também raramente se sobressai em seus filmes. Sua principal característica parece ser sua esperteza em manter bons contatos com diretores talentosos. Já trabalhou com Stanley Kubrick, Martin Scorsese, Oliver Stone, Paul Thomas Anderson, Brian De Palma, com o próprio Steven Spielberg, e com nenhum deles fugiu de sua habitual indiferença.

Ambos são diversão garantida, mas se tiver que escolher entre os dois filmes abobrinha na locadora, fique com Colateral, primeiro. Só não esqueça de pegar a pipoca.


Site Oficial do filme "Colateral"
Site Oficial do filme "O Terminal"