"O Tigre e o Dragão"
por
Juliano Costa
24/05/2002
Nos últimos anos, o número de americanos freqüentadores de cinemas tem diminuído bastante. Segundo estudiosos do comportamento yankee, isso se deve a fatores que vão desde o crescimento da violência, que faz com que as pessoas prefiram assistir filmes em casa, em vídeo ou DVD, até o surgimento da Internet, uma nova forma de entretenimento.
Em compensação, o número de espectadores em outras partes do
planeta, principalmente nos chamados países em desenvolvimento,
tem aumentado consideravelmente. E, dentre esses países, a "menina
dos olhos" dos americanos de Hollywood é, sem dúvida, a
China, com seu um bilhão de habitantes.
"Mas o que isso tem a ver com O Tigre e o Dragão,
filme produzido em Taiwan e falado em cantonês?", pergunta
o incauto leitor. Ora, eis o óbvio ululante: em busca do novo
mercadão, os americanos injetaram dinheiro no bolso do competente
diretor Ang Lee e encomendaram a filmagem de uma daquelas fábulas
chinesas, recheada de provérbios frívolos, pra ser um "arrasa-quarteirão"
no sudeste asiático e ganhar ainda mais a simpatia dos "olhinhos
puxados" para os filmes de Hollywood. É como se eles, americanos,
estivessem querendo dizer "hei, tigres asiáticos, vejam
como nós somos legais: deixamos vocês fazerem um filme pra vocês,
sobre vocês, e ainda o elegemos como um dos melhores do ano.
Nós somos legais, não? Ok, mas, agora, assistam aos nossos outros
filmes, que também são bem legais, viu!".
Tá, eu sei, este texto tá começando a parecer um daqueles da
ZeroZen (www.zerozen.com.br,
com "a verdade está lá fora"– bem legais, vale a pena
conferir!). E, talvez, eu tenha até ido ao cinema com uma certa
dose de preconceito, achando que ia sentar na poltrona e assistir
a duas horas de gente comendo arroz, dando piruetas marciais
e exalando provérbios com o olhar (você já deve ter percebido
isso. Eles, chineses, japoneses, etc, comunicam-se quase que
unicamente através de provérbios e/ou olhares que parecem resumir,
na verdade, os próprios provérbios. Se não reparou, preste atenção
da próxima vez: um olha pro outro que, sem dizer nada, rebate
com um desses tais olhares, complexos para nós, ocidentais,
baixa a cabeça e sai de cena. Aí o outro também lança um desses
enigmáticos olhares, solta um ligeiríssimo sorriso de canto
de boca e sai com um ar superior. Só pra iniciados mesmo).
E, de certa forma, meu preconceito não estava errado (embora
em apenas uma cena apareça alguém comendo arroz). A trama gira
com três personagens principais: Li Mu Bai (Chow Yun Fat), um
guerreiro da ordem Waden, que está se aposentando e tem sua
espada, a "poderosa" Destino Verde, roubada; Jen (Zhang
Zi Yi), a menina aristocrata, estudante das artes marciais e
que rouba a tal espada; e a também guerreira Yu Shu Lien (Michelle
Yeoh), que nutre um tipo de "amor impossível" (e recíproco)
por Li Mu Bai e, como ele, vê na jovem Jen um grande futuro
"ninja".
E Li Mu Bai e Yu Shu Lien vão tentar trazer pro lado do "bem"
a ninfetinha nervosa durante o filme inteiro (vou poupar o final).
Entretanto, Jen, menina mimada e arredia, esnoba a tutela dos
dois, passa a simpatizar com a criminosa Raposa Jade e, ainda
por cima, se apaixona por uma espécie de "pirata do deserto
chinês" (Lo, interpretado por Chang Chen). Bom, é isso.
Sinceramente, ao ler um filme resumido dessa forma, você não tem aquela sensação de já ter visto isso antes? Bingo! Era isso mesmo que Ang Lee (ou quem estava por trás dele, sei lá) queria. Algo fácil de se entender, engulível (sic), palateável (sic de novo!), até para um americano médio – aquele lance de que, se uma criança de 11 anos entende, todos entendem e faz sucesso.
Quanto às lutas, elas são legais, mas, depois de um tempo, não
dá: enche o saco! Se os efeitos especiais, como o de "voar"
e andar em cima das árvores, aparecessem somente no final pra
colocar aquele "oh!" na boca dos espectadores, estaria
ok. Mas não é esse o caso, e o que vemos é uma sucessão interminável
de lutas, intercalada por aquelas sessões quase mudas de troca
de provérbios acima descritas.
Tá certo que o Oscar, depois de Shakespeare In Love,
aceita tudo. Mas daí à essa "coisa" caricata ganhar
a estatueta de Melhor Filme, já seria demais. Ainda assim, ganhou
quatro: Melhor Filme Estrangeiro, Melhor Trilha Sonora, Melhor
Fotografia e Melhor Direção de Arte. Bom, mas eu já escrevi
mais de 4 mil caracteres e não vou ficar discutindo o Oscar
também.
Juliano Costa, 20, foi assistir a O Tigre e o Dragão
porque tinha que fazer uma resenha pra aula de Jornalismo Cultural.
E, ah, ele tirou nota 7 – mas não foi exatamente com este texto.
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