"O peso do silêncio"
por Márcio Souza

Na vida real, somos todo dia apresentados a todo tipo de tragédia familiar. Assistimos em qualquer desses programas televisivos que exploram apenas as desgraças, pais matando filhos, maridos matando suas mulheres, mortes por motivos estúpidos e evitáveis.

È claro que não estamos falando da mesma coisa aqui, mas por que esse filme bate tão pesado? E por que ficamos tão apreensivos com o desenrolar? Afinal, não precisaríamos de mais uma história de ‘vida infeliz’ para nos entreter por duas horas. Mas é a experiência de ver pessoas, interpretando com uma realidade que nos joga no meio da tempestade, sentimos que tudo pode acontecer. Sempre tendo a vida real como pano de fundo. Sempre tendo o silêncio como trilha sonora. O silêncio é a arma que o diretor Todd Field usa para nos proporcionar desconforto e, principalmente, tensão.
 
A história gira em torno de uma família, que vive numa cidade pacata no litoral, que perde seu filho em uma tragédia anunciada; nas férias de verão, o filho do casal Matt e Ruth Fowler, Nick se envolve com Natalie, uma mulher separada, mais velha e mãe de duas crianças que ainda tem a ameaça do ex-marido por perto, precionando-a por uma reconciliação. Mesmo sentindo o perigo, Matt não vê o problema, e Ruth não tem a presença na vida do filho para conseguir algo. Tentando levar a situação de uma maneira fria, tudo acaba desmoronando. Vendo a justiça não ser feita. Vendo a vida os provocando a todo o momento. É aí que tudo fica ainda mais real, como um relato, uma recriação.
 
Sim, é verdade quem disse que nada é dito de novo, mas, aqui, a densidade é quase absurda. Até que ponto, pessoas normais, como eu e você, agüentariam a dor e a culpa ao mesmo tempo? Sim, porque somos experts em observar a dor de um personagem num filme, ou no lirismo de uma música pop, mas, assistir aos personagens dos brilhantes Sissy Spacek e Tom Wilkinsom não sentimos distancia, nem pena. Sentimos que poderia ser conosco. Aí que mora o desconforto.
 
Muito se falou do trabalho de Sissy, mas, porém, é no trabalho do inglês Tom Wilkinsom (alguém lembra dele em"Ou tudo ou nada"?) que toda a tensão se descarrega. Numa atuação contida, a dor é mostrada a cada minuto, mesmo quando ele tenta fazer como nada tivesse acontecido, até quando caminhamos para o final certo, ele não desaba, não se corroe. 
 
As situações sempre colocam a vida no meio daquele acontecimento fantasioso para os dois. Como quando Matt tenta conversar com Natalie (Marisa tomei, tentando retribuir a academia pela piada que foi a sua premiação anterior), no trabalho dela e a todo o momento ela é interrompida por pessoas pedindo algo, coisas fúteis que fazem a nossa vida ser normal como ela é, transformando o momento, mais uma vez real, A vida é colocada á diante da maneira mais dolorosa possível. A poesia do caos pessoal do momento em que Ruth e Matt se acusam pelo ocorrido, a cicatriz de Matt se curando no final. 
Será que ela estaria realmente curada? Será que ele conviveria com isso? Será que se olharia no espelho de manhã e não veria mais seu filho pelas ruas? Ele não sabe, nós ficamos sem saber também, mas com o latido dos cães ao final, ele é acordado novamente para a vida. Ele vai trabalhar, comer, andar e viver. A dor nunca vai parar, o perdão que não vêm. Um dos melhores filmes do ano até agora não pelo o que (não) tenta ser, mas sim, pelo trabalho de ‘almas’ que Todd tirou de seus atores. Isso não é rotineiro. Definitivamente.