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Um House of Cards chamado Brasil

Vivemos um momento House of Cards excelente para reflexões, afinal, Francis J. Under… ops, Eduardo Cunha decidiu romper com o governo após a presidente Dilma não intervir na citação de seu nome no escândalo da Petrobras. Dilma vem se segurando como pode, atacada pela oposição e sem apoio de seu partido, uma situação que começou ainda em seu primeiro governo, quando escreveu (ela mesma, sob o olhar de dois conselheiros e um advogado) uma nota que alertava que a compra da refinaria de Pasadena havia se baseado em “documentação falha” e “informações incompletas”.

A história é esmiuçada numa grande reportagem feita por Daniela Pinheiro e publicada na revista Piauí semanas antes da eleição do ano passado (leia aqui), e que também trazia um perfil do candidato de oposição, Aécio Neves. Daniela escreve que a carta de Dilma “caiu como uma bomba de nêutron. Baseada nela, a oposição pediu a abertura de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) a fim de apurar as denúncias”. E, então, algo raro aconteceu no Brasil: a corda arrebentou no lado mais forte, e presidentes de empreiteiras foram presos, além de diversos políticos.

A corrupção e o desvio de verbas acompanha a história brasileira. Em 9 de novembro de 1889, seis dias antes de proclamada a República, aconteceu o Baile da Ilha Fiscal, a última grande festa da monarquia no país. O visconde de Ouro Preto, presidente do conselho de ministros, visando reforçar a posição do Império contra as conspirações republicanas, gastou 250 contos de réis, dinheiro retirado do ministério da Viação e Obras Públicas, e que estaria destinado a socorrer flagelados da seca no Ceará. Este valor correspondia a quase 10% do orçamento previsto para a Província do Rio no ano seguinte.

De lá pra cá, nada mudou. Desvios de verbas e corrupção se transformaram em praxes partidárias, com muitos políticos (de todos os partidos) amparados em alianças visando beneficio próprio. Enganam-se, em parte, aqueles que acreditam que a corrupção seja culpa apenas do PT. Não é bem assim. Ela é culpa do PT, mas também do PSDB, do PMDB, do PP e a lista segue, aparentemente infinita, englobando praticamente todos os partidos. O que Dilma tem a ver com isso? Muita coisa. Ao se negar encobrir atos corruptos de outros políticos, a presidente se isolou tanto da câmara quanto do senado, à espera (parece) do povo.

O povo brasileiro, no entanto, parece viver um estado hipnótico. Veículos de mídia “apontam” Dilma como provável culpada do “caos” (uma meia verdade), e dá-lhe pessoas vestidas de camisa da CBF (um órgão investigado) nas ruas. Enquanto isso, 19 dos 21 deputados investigados na Operação Lava Jato não foram eleitos com votos próprios (17 deles se beneficiaram de votos excedentes vindos de colegas de legenda como Jair Bolsonaro, do PP-RJ). O sistema eleitoral falho, mas ninguém sai às ruas por reforma política, ninguém sai às ruas contra a libertação dos empresários e políticos corruptos que foram presos. Todos seguem o flautista de Hamelim, enfeitiçados.

A corrupção é um mal que atinge a todos os partidos. Se um tem o mensalão, outro tem o trensalão. Se Lula é acusado de tráfico de influência, FHC é acusado de comprar votos para no mensalão da reeleição (e manter durante os oito anos de seu mandato um procurador geral que engavetou mais de 600 processos criminais contra funcionários do governo). Se um tem o Petrolão (que, conforme anda a carruagem, recebe membros de diversos outros partidos), outro tem a Privataria. A sujeira está em todos os cantos, e, nessa hora, a torcida é para que o país sai mais forte de todos esses escândalos.

Sim, porque há duas maneiras de se encarar os atos de Dilma neste momento:

1) admira-la por deixar transparente uma rede de corrupção

2) odiá-la por não ter agido como os antecessores e “jogado o jogo”.

São duas opções bem distintas. A primeira, relembrando a ameaça de um empreiteiro pré-eleição de 2014, pode “parar o país”. Afinal, há tanta gente envolvida na política brasileira que tem as mãos sujas que, o mais correto, era prender todo mundo e começar tudo do zero. Se não corremos o risco de um político envolvido em um escândalo de corrupção ser indicado como um dos relatores de uma CPI (acabou de acontecer na CPI do Futebol).

A segunda opção tem mais a ver com caráter: “rouba, mas faz” é um argumento válido? Se é impossível politicar no Brasil sem se envolver com corrupção, usa-se a máquina estragada para melhorar o país? E como separar quem está “roubando para o bem do povo” daqueles que “roubam para o próprio bem”? Minha conclusão é uma só: a corrupção tem que ser erradicada, os corruptos tem que ser presos e o país tem buscar legitimidade. É possível? Talvez não, o que não nos impede de desejar.

Alguns dizem que este segundo mandato de Dilma é ineficiente, que a inflação está aumentando, que a cotação do dólar está fora de controle, que o número de miseráveis no país voltou a aumentar pela primeira vez em 10 anos, e por ai vai. A questão que fica é: como governar sem apoio da câmara e do senado? Sem apoio de boa parte do próprio partido? Sim, Dilma semeou isso, e fica ao seu critério, caro leitor, decidir se o ato de cultivar inimigos é bom ou não para o futuro do Brasil. A Operação Lava Jato segue. Enquanto isso, incêndios queimam arquivos sobre o trensalão. É preciso ficar de olho.

Na minha humilde opinião, tirando 1499, o ano antes da chegada de Pedro Álvares Cabral e sua turma nesta terra que ainda não tinha nome, 2014 (pelos 7 a 1) e 2015 (pelo avanço na Operação Lava Jato) são, muito provavelmente, os dois melhores anos que esta nação chamada Brasil já presenciou. Se nossos descendentes vão se orgulhar disso daqui a 500 anos é outra história. Nos resta apenas tentar fazer o que achamos certo. E torcer para que ninguém manipule a votação quando estivermos dormindo. É difícil, mas é o que nos resta (ir para a rua é válido, mas precisamos, cada vez mais, mostrar para câmara e senado que estamos de olho neles).

Caso contrário continuarão tirando dinheiro da seca para fazer festas.

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