Sempre as mesmas perguntas
Fernando Neumayer, responsável pelo blog Som Imaginário, me convidou para participar de uma seção do blog que prevê sempre as mesmas perguntas para todos os entrevistados. Consegui conter a curiosidade e não conferir as respostas dos amigos Sérgio Martins, Regis Tadeu, Arthur Dapieve, Ricardo Seelig, entre outros, que já participaram da seção, e fiquei bastante satisfeito com o resultado, que… atualizando em 2022, com o Som Imaginário fora do ar, coloco na integra aqui embaixo:
Marcelo Costa, o Mac, é o editor e a pessoa por trás do Scream & Yell, lugar para quem quer conteúdo de alto nível. Hoje é ele quem pinta aqui no Sempre As Mesmas falando de Purple, Miles, Neil Young, Radiohead, cena brasileira atual e mais. Aliás, a seção tem crescido bem e com gente bacana, o que deixa a casa brindando no ar. A ideia é a mesma de sempre: trazer as referências para uma coisa meio bate-papo, meio conversa de bar, com cutucadas, mitos discutíveis e indiscutíveis, quem é quem na música hoje etc. Para ilustrar escolhi dois disquinhos que aparecem bem cotados pelo Marcelo: Wilco e Clash. Dá pra ver as outras edições ali na tag entrevista, no canto direito.
Bora lá.
Deep Purple do Gillan ou da dupla Coverdale/Hughes?
Do Gillan, sem pestanejar. Por “Child in Time”, “Highway Star”, “Hard Lovin’ Man” e, mamma mia, “Smoke on the Water”. Por “Perfect Strangers” também, mas isso é outra coisa. Coverdale será eternamente um sub-Robert Plant pra mim.
Neil Young: do rock ou do folk?
Os dois. A essência do Neil Young está na genialidade com que ele consegue lidar com os dois extremos e ainda soar… Neil Young. Como que alguém pode escolher entre “Needle And The Damage Done” e “Powderfinger”?
Miles Davis vale em todas as fases?
Todas. Amar a música de Miles é respeitar a sua inquietação, entender que a música para ele estava em eterna transformação, uma busca que gerou uma das discografias mais importantes da história.
Nina Simone, Ella Fitzgerald, Billie Holiday ou Sarah Vaughan?
Difícil, hein. Muito difícil. Tendo a ficar com a Nina, mas a Ella…
Quais são os três discos de rock obrigatórios?
“London Calling”, do Clash, pra pessoa perceber que o rock não é burro; “Doolittle”, do Pixies, que mostra como o rock pode soar pop, mas também perigoso; “White Album”, dos Beatles, porque algum disco dos Beatles precisa constar de qualquer lista de obrigatórios. O álbum branco tem o dom de ir na contramão do “Sargeant Peppers” (o que começa já pela capa), e ainda assim soar absurdamente foda (exagerado, mas foda). É um daqueles discos em que a vida é tátil (talvez porque as vidas por trás dele estivessem em conflito).
Beatles e Stones. O que um tem que o outro não?
Beatles foi praticamente impecável enquanto os Stones cometeram vários deslizes. Por outro lado, os Beatles aguentaram o peso nas costas por uma década, e os Stones viveram cinco. Beatles é mais limpo, Stones é mais sujo. Beatles é amor, Stones é sexo. Essas bobagens. Não consigo escolher entre os dois. Os Beatles são mais importantes, mas o manual do rockstar foi escrito pelos Stones.
Peter Gabriel ficou pelo Genesis ou soube voar também solo?
Comecei ouvindo punk rock na primeira metade dos anos 80, então Genesis era algo meio que proibido no círculo (ainda mais que, naquela época, eles viviam a fase Phil Collins), mas nos anos 90 fui atrás de algumas coisas antigas e, putz, tive que comprar o “The Lamb Lies Down on Broadway” em vinil (e tenho até hoje). No entanto, nunca fui atrás da carreira solo do Peter Gabriel. Quem sabe o show no SWU não seja um acerto de contas…
O que tem essa cena indie lá de fora? É pra tanto barulho? Quem se salva hoje?
Hoje em dia essa coisa de independente anda meio deturpada. Antigamente, o lance todo girava ao redor da liberdade de criação. O cara era independente porque nenhuma gravadora queria lançar o disco dele, então ele fazia do jeito dele e lançava. O capitalismo, altamente adaptável, aproveitou a chance de também vender a liberdade. E os indies chegaram às grandes gravadoras, ao mainstream, ainda que no momento em que as gravadoras levavam uma rasteira do p2p. O que sobra hoje, como em qualquer cenário, é um balaio com gente genial (Arcade Fire, Franz Ferdinand, Decemberists) e um monte de diluidores. Mas sempre foi assim.
Radiohead é isso tudo?
E mais um pouco. No momento em que a internet estava matando o álbum como formato, os caras revalorizaram o conceito com um monte de bugigangas atreladas. Porque não amamos a música apenas pelo que ela é, mas também pelo que ela representa. O Radiohead é uma das últimas bandas a entenderem isso. E isso os distingue do resto.
Quem está fazendo coisa boa e nova no Brasil?
Muita gente. A música brasileira atual é a melhor do mundo. Se Simon Reynolds vivesse aqui ele nunca teria escrito “Retromania”. Mas como não achar o cenário uma merda se o disco mais esperado do seu país no ano é o novo do Coldplay? Aqui temos uma safra genial que aprendeu – via Los Hermanos – que o samba pode ser torto e nos representa. Nós temos ginga, coração e sentimentos. É isso que Romulo Fróes, Wado, Bruno Morais, Junio Barreto, Cidadão Instigado e outros estão mostrando. A melhor música do mundo está aqui, mas o próprio Brasil ainda não a descobriu.
Qual foi o álbum dos anos 2000?
Em conceito, “In Rainbows”, do Radiohead, pois mostrou que não basta ser música. Em efeito, “Is This It”, do Strokes, que influenciou um bocado de gente; em perfeição, “Yankee Hotel Foxtrot”, do Wilco, momento em que o popular encontra a arte. Porém, olhando de onde viemos e para onde vamos, é bem provável que o disco mais importante seja “Funeral”, do Arcade Fire, uma banda que entendeu a intensidade das emoções no novo século.
Qual o lançamento de 2011 até agora?
“Let England Shake”, PJ Harvey. Em um mundo de prêmios merecidos, ela ganharia o de álbum do ano, e ainda bem que a Inglaterra tem o Mercury Prize. Se fosse aqui ela seria engolida por qualquer modismo.
Estou em Dylan & The Band, The Basement Tapes, e você? O que você está ouvindo?
Dois discos novos: “The Whole Love”, do Wilco e “Samba 808”, do Wado. E acho que ainda vou ficar um bom tempo os ouvindo. “All Things Must Pass”, do George, caiu no colo fazendo estrago também. E alguma hora da semana eu coloco “The King is Dead” do Decemberists para acalmar a alma.
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