Descalço na Abbey Road
Bem, acabo de chegar do meu ultimo ato turístico desta viagem de 38 dias pela Europa: atravessei, descalço, a Abbey Road, pisando com calma naquela faixa de pedestres imortalizada na capa do penúltimo disco dos Beatles, de 1969. O Fabio tirou esse print acima, da câmera do site do estúdio, que flagra 24 horas 7 dias por semana, todos os fãs do quarteto de Liverpool que chegam para fazer essa pequena travessia. Brasileiros, mexicanos, ingleses, franceses, chineses e até um grupo de argentinos marcaram presença no local enquanto eu estava lá.
Aliás, cheguei bem mais cedo do que planejava. Cabulei a visita a Candem (James, se eu fosse lá, iria gastar o dinheiro que eu já não mais tenho – risos) e fui direto descobrir onde ficava o tal estúdio, já que perdi meu mapa no fim de semana, e o guia não falava nada do local, só mostrava uma ruazinha no mapa da capa, perto de uma estação de trem, que descobri (na pratica) ser longe pacas. Peguei um ônibus que me deixou na porta do estúdio para seguir o ritual: cravar o nome no muro e atravessar a rua.
A Abbey Road é uma esquina, sem sinal. Existem avisos antes e depois de chegar nela (aproximadamente 200 metros) apontando ser uma área “turística”, mas mesmo assim os carros passam chutados. Ou então, param no exato momento em que você se aproxima da esquina, como dizendo: “Pode atravessar”. Só que ninguém quer atravessar e posar para a fotografia com carros na faixa de pedestre, não é mesmo. Eu nem liguei, fui assim mesmo, e a foto ficou distante pois a menina não entendeu o que tentei explicar sobre o zoom.
No entanto, posso dizer que dá um friozinho na barriga, sabe. Nem é só por causa da banda, mas sim pelo valor que essa banda tem na vida das pessoas. Foram centenas de pessoas que apareceram ali para atravessar a rua num dia qualquer do meio da semana do mês de agosto. É loucura demais imaginar o que os Beatles representam, assim como é legal demais saber que a banda fez por merecer isso. Tirei algumas fotos para casais que queriam atravessar juntos, e pontualmente as 16h fiz a minha travessia oficial. Agora é ir pra galera.
Ainda tem balada de noite antes do voo para Madri, e do voo seguinte para São Paulo, mas essa viagem esta praticamente encerrada. Ainda volto aqui para um balanção (sim, Argentino, há um ranking das cervejas, espera que vamos bebe-las em São Paulo), os devidos agradecimentos (tem muita gente bacana que fez essa viagem mais especial do que ela já seria) e para a sequencia normal do blog, dia a dia, aquelas ladainhas de sempre que vocês já conhecem tão bem. Eu sei, eu também vou ficar com saudades dessa viagem. Mas a vida segue e a gente precisa batalhar para as próximas férias serem tão especiais quanto esta. Dedos cruzados.
agosto 6, 2008 No Comments
Ruby Tuesday
No dia 02 de setembro de 1666, um pequeno incendio iniciado em uma padaria causou uma das maiores calamidades da historia de Londres, devastando mais de 13 mil casas num terreno de aproximadamente dois mil quilometros quadrados. Uma nova Londres surgiu apos o incendio, reconstruida. O Olde Cheshire Cheese, pub em que festejei meu aniversario com pint de cerveja, bolo de chocolate e velinha de isqueiro, foi um dos predios reconstruidos em 1667. Fica numa travessinha da Rua Fleet, aquela mesma do barbeiro…
Vou te dizer, mas voce ja sabe: Londres eh algo incrivel. O Daniel estava contando que o irmao de Beth, mulher dele, viu o Nirvana no Reading de 1992. E a mae dela viu os Beatles, ao vivo. E nao foi uma vez soh nao: seis!!!! Ele ainda estava falando que numa ruazinha de instrumentos musicais que passamos numa madrugada, uma das lojas abrigava o estudio em que os Stones gravaram todos os seus primeiros singles. E existe um passeio, macabro, que leva voce por todos os pontos em que Jack, o Estripador, atuava. Tem muito mais.
Bem, melhor voltar ao dia pois, senao, me perco. A terca-feira de rubi comecou na Tate Modern, uma das mais interessantes galerias londrinas. Voce sai da St Paul’s, atravessa a Ponte do Milenio – de Sir Norman Foster – sobre o Tamisa e ja cai na frente da Tate com suas 88 galerias que oferecem um excelente acervo de arte moderna. Nao sou conhecedor nem pesquisadir do lance todo, mas preciso dizer que a arte moderna, principalmente as instalacoes e muitas esculturas, nao me convencem. Podem atirar pedras.
Lembro que, uma vez, um grande amigo jornalista perguntou para o Lulu Santos o que ele achava dos Los Hermanos. “Eh muito intelectual para mim. Eles passam aqui em cima”, disse ironicamente Lulu, fazendo um gesto de mao sobre a cabeca, simbolizando que ele, Lulu, nao conseguia alcancar a frequencia dos barbudos. E eh mais ou menos isso que sinto em relacao a arte moderna. Tem muita coisa que deve ser realmente genial, mas que passa muito acima da minha cabeca, do meu intelecto.
Sem contar que a arte moderna precisa de respiro, maturacao, e sou muito urgente para o mundo. E eh por isso que nao gosto de filmes escandalosamente lentos, comida demorada e musica progressiva. Porque todos eles precisam de uma atencao que nao consigo lhes dar. Quando percebo, ja estou pensando que a chuva londrina molhou os meus tenis, que minha meia esta ensopada, que essa chuva que vai e volta e vai e volta e vai e volta eh bem melhor do que uma daquelas tempestades que lavam a alma. Nossa, passei por duas salas.
O mais interessante eh que, no Tate Modern, fiz muito mais anotacoes do que em alguns dos museus espanhois. Tem muita coisa ali que gostei tipo as coisas do De Chirico (“The Uncertainty of The Poet”), Rene Magritte (“The Annunciation”), Paul Klee (o belissimo “Walpurgis Night”), Roy Lichtenstein (o otimo “Mustard on White”, imagem acima), Picasso (“Seated Nude”, “Bust of a Woman”), Robert Delaunay (“Study For The City”), Henri Matisse (“Reading Woman With Parasol”) e Dod Procter (“Morning”, um dos meus preferidos da visita).
Tem coisas, no entanto, que eu realmente nao entendo, como “480x10x10”, de Miroslaw Balka (infelizmente nao achei imagem da obra), que junta em um fio do teto ao chao dezenas de sabonetes, ou a “White Curve”, de Ellsworth Kelly, ou varios quadros do Richter Cage. Na teoria, acredito realmente que deve ser genial, mas nem tente me explicar o porque pois eh exatamente esse o ponto: quando voce precisa explicar a piada para alguem, ela perde totalmente a graca. Depois que Marcel Duchamp iluminou o caminho, eh preciso ter cuidado…
A minha ideia, na sequencia, seria seguir do Tate Modern para a Tate Britain de balsa pelo Tamisa, mas a arte moderna mexe muito com os pensamentos. Tres horas dentro do Tate Modern sao uma eternidade. Decidi vagar pelas margens do Tamisa pensando em alguns quadros quando, ao longe, vejo um predio. Casar com uma arquiteta tem dessas coisas: “Amor, voce ja viu a prefeitura de Londres? Eh do Sir Norman Foster, um dos maiores arquitetos do mundo – e da Inglaterra – na atualidade. Eh um predinho bem maluco”, escreveu a Lili.
Eu achei que tivesse visto um predinho maluco antes, mas assim que fui me aproximando, nao consegui conter o riso: como o cara consegue fazer algo tao… divertido com uma prefeitura? O predio eh sensacional. Em um texto da BBC (leia aqui) que falava sobre a inauguracao da obra, uma leitora reclamava que “a construcao roubava a atencao dos predios historicos ao redor” (a saber: a Torre de Londres e a Tower Bridge), e isso na verdade eh absurdamente genial: eh o passado e o presente convivendo lado a lado com suas virtudes e belezas. Adorei.
Segui caminhando pela Tower Bridge (aquela ponte que abre para os barcos passarem), olhei a Torre de Londres – erguida por Guilherme, o Conquistador, em 1078 – e fui ao encontro da Luciana (com mais duas amigas) para festejar o aniversario no Olde Cheshire Cheese. Cheguei na casa do Daniel por volta das 23h para mais uma sessao de cervejas belgas em comemoracao da data, e fui dormir de alma enlevada. Na verdade, chorei… de felicidade e saudade. De Londres, da viagem, das pessoas especiais que conheci nesses 40 dias. A vida segue em frente, mas a gente vai deixando pedacinhos da alma pelo caminho.
Neste ultimo dia – na pratica – de Londres (e de Europa), vou tentar ir an Tate Britain, almocar em Candem e atravessar a Abbey Road exatamente as 16h (12h no Brasil). Pode acompanhar nesse link aqui. Estou de camiseta vermelha, do Real Madrid, e se der na telha, atravesso descalco como o Paul (ok, vai faltar o cigarro, o Ringo, o George e o John, mas tudo bem). A noite, balada no Buffalo. E las pelas cinco da manha acordo para a maratona da volta. Chego em Sao Paulo, apos uma escala em Madri, no comecinho da noite. E ja vou preparando no voo um balancao da viagem. Nos vemos.
Fotos da viagem e dos shows: http://www.flickr.com/photos/maccosta
agosto 6, 2008 No Comments