Blue Monday
Apos um domingo cinza e chuvoso, a segunda-feira amanheceu ensolarada e azulada. Ate o Garfield, que detesta segundas, abriria um sorriso ao olhar pela janela. Aproveitei para bater cartao em dois marcos da cidade: a Abadia de Westminster e a Catedral de St Paul’s. Lembra que achei caro pagar 10 euros para entrar na Lady Chapel e na Corcergieri, em Paris? A entrada para a Abadia é uma facada de 12 pounds (quase 40 reais), e nao adianta tentar jogar um papo de “sou jornalista no Brasil” e tal. Tem que pagar. No entanto, a visita vale a pena, e muito.
Ajuda o fato dos guias de audio serem gratuitos, coisa rara. E, claro, ajuda o fato da Abadia ter muita historia pra ser vista. São Dunstan da Cantuária fundou no local uma comunidade de Monges Beneditinos em 970, mas a Abadia comecou a ser construida entre 1045 e 1050. De la pra ca, varios reis foram coroados no local (a cadeira, com mais de 700 anos, esta aos pedacos, mas é um simbolo da realeza britanica), Elizabeth I esta enterrada no lado direito da belissima Lady Chapel (sua rival, Maria Stuart, que morreu condenada por conspiracao, esta enterrada no lado esquerdo da capela) e ha, ate, um recanto para os poetas, com destaque para Shakespeare.
Depois de uma visita de mais de uma hora, parti em direcao a Catedral de St Paul’s, uma pequena obra-prima do arquiteto Christopher Wren, que apos o grande incendio de Londres em 1666, reconstruiu a catedral destacando a sua enorme cupula decorada (é de cair o queixo). Foi aqui que o principe Charles e Lady Diana Spencer se casaram, abrindo mao da tradicional cerimonia em Westminster para mostrar que eram o principe e a princesa do povo. A catedral fica a 500 metros do Tamisa, e de seu segundo pavimento é possivel ter uma visao extraordinaria da cidade.
Como igreja, St Paul’s é de uma grande simplicidade. O grande programa da visita sao as subidas para as galerias externas, que incluem uma passagem pela Galeria dos Sussuros, no alto da grande cupula. As duas galerias seguintes (Golden e Stone) permitem que o visitante desfrute uma bela visao de Londres. A subida é para os corajosos. Comeca com uma escadinha leve, mas depois se transforma em degraus altos de um caminho estreito, que cansam. Uma menininha, perto da Golden Gallery, implorava ao pai para nao subir mais. Mas a vista vale realmente a pena.
Encarei um capuccino com bolo de chocolate na cripta da catedral (eu devia ter escolhido o muffin), e voltei mais uma vez para a Oxford Street, para resolver umas pendencias de encomendas de amigos. Dali, desci novamente em St Paul’s, atravessei a ponte em direcao ao Tate Modern, e segui caminhando as margens do Tamisa, me encantando com o entardecer londrino, a brisa ao lado do rio e tudo mais. Sentei em um banco e fiquei pensando na vida ate decidir transferir papeis, mochila e anotacoes para uma pizzaria, e lembrar uma das minhas historias preferidas do rock.
Em 1977, o Sex Pistols decidiram “homenagear” o Jubileu de Ouro da rainha Elizabeth II dedicando-lhe seu segundo single: “God Save The Queen”, uma musica que dizia nao existir futuro na Inglaterra. Para promove-lo, o empresario Malcom McLaren – que estava proibido de ter seu grupo tocando nas ilhas britanicas – colocou a banda tocando em um barco, dentro do Rio Tamisa (nao era em terra). O resultado, como voce pode imaginar, foi pancadaria assim que o barco atracou em Londres, com quase todo mundo na cadeia.
O melhor estava por vir: a ironia punk escalou as paradas – mesmo tendo sido banida da BBC e de outras radios – ate bater no numero 1, marcando a unica semana na historia dos charts britanicos em que o numero 1 das paradas apareceu em branco. O Sex Pistols se foi (deixando sua marca na historia do rock), a rainha continua firme e forte (e o partido trabalhador esta caindo pelas tabelas) e o rio Tamisa, que 31 anos atras ouviu “God Save The Queen” ao vivo, continua encantador. Respiro fundo e penso na linha de baixo e no vocal deliciosamente escroto de Johnny Rotten. Deus salve a rainha.
Na verdade, Deus salve o Marcelo. Nesta terca, ou melhor, daqui a 74 minutos (hora de Londres), completo 38 anos de idade (os 40 estao chegando, eu sei). Como o dinheiro ja foi faz uma semana, e o que chegou soh serviu para eu comprar mais algumas duzias de CDs, nada de grandes comemoracoes. Vou visitar a Tate Modern e a National Gallery durante o dia, e deve rolar alguns pints de cerveja em algum pub a noite, e olhe la. Como nao vou estar por ai para receber um abraco ou um telefonema, aceito um brinde de cerveja “in memorian”, ok. Nao esquece. Tin-tin.
Fotos da viagem e dos shows: http://www.flickr.com/photos/maccosta
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